Jornal Nacional, noite de 8 de fevereiro. Enquanto um grupo de 350 policiais grevistas eram sitiados na Assembleia Legislativa da Bahia por forças do Exército, o telejornal de maior audiência do país veicula gravações telefônicas ‘autorizadas pela Justiça’ dos líderes da mobilização. Na gravação, dirigentes como Marcos Prisco e o cabo Benevuto Daciolo, liderança da greve dos bombeiros no Rio, aparecem articulando o movimento ou, na linguagem da Globo, ‘combinando atos de vandalismo’.

Instantes depois, o Exército reforça o efetivo que cerca os grevistas. Helicópteros dão rasantes no céu para intimidar. Não há dúvidas: a ordem é fazer a reintegração do prédio ocupado. Poucas horas depois, o cabo Daciolo é preso assim que pisa no aeroporto do Rio retornando da capital baiana. Os fatos mostram claramente. Rede Globo, Polícia e Governo Federal e os da Bahia e Rio, articularam uma ação sem precedentes de repressão para pôr fim à greve da Polícia Militar na Bahia e, principalmente, impedir que o movimento se alastre para outros estados.

A data não foi escolhida por acaso. No dia seguinte, policiais e bombeiros do Rio realizariam uma assembleia em que votariam a greve. Era preciso bater forte naquele momento. Na manhã do dia 9, os policiais baianos deixam a Assembleia após oito dias de ocupaçãopara impedir um banho de sangue e Prisco, principal dirigente da categoria no estado também é preso, junto com outros três lideranças.

Greve continua
No decorrer do dia 9, porém, o movimento dá sinais de força na Bahia. O enorme aparato repressivo deslocado pelo Governo Federal para pôr fim à greve, que incluiu 2 mil homens do Exército, só serviu para atiçar mais ainda a indignação dos policiais. Em Salvador, os policiais vão direto da Assembleia Legislativa para a sede do Sindicato dos Bancários e lá, em assembleia e diante da intransigência do governo Wagner, decidem continuar o movimento de greve.

“Ôôô, a PM parou… a culpa é do governador”, entoam os mil policiais presentes na assembleia. “A desocupação não nos derrotou, a campanha da mídia contra a greve não irá nos vencer; a PM parou e a culpa é do governador”, declarou à reportagem do Opinião Socialista um dos policiais. No final do dia, o governo Wagner anunciava o corte no ponto dos grevistas.

No mesmo momento no Rio de Janeiro, algo como sete mil policiais civis, militares e bombeiros se reuniam e lotavam a praça da Cinelândia para decretarem a greve. Entre as principais reivindicações estava a não punição aos colegas baianos e a libertação imediata do cabo Daciolo. O presidente do PSTU no Rio, Cyro Garcia, levou a solidariedade à mobilização dos policiais e responsabilizou o governo Cabral pela greve. O partido distribuiu 10 mil panfletos de solidariedade à mobilização e outros milhares de adesivos denunciando a postura ditatorial do governo carioca.

Cyro: “Greve é um direito”
“A greve é um direito ou não é?”, perguntou Cyro à multidão. Diante do uníssono “sim”, Cyro questinou: “PM é trabalhador, sim ou não?”. Com a afirmação, emendou: “Se a greve é um direito do trabalhador e os policiais são trabalhadores, então vocês tem todo o direito de fazer greve”, sendo muito aplaudido. Para Cyro, “a mesma burguesia que nega aos policiais o direito de greve, utiliza essa mesma polícia para cometer arbitrariedades como foi o caso da brutal desocupação do Pinheirinho, ou como ocorre quando o governo reprime qualquer greve ou mobilização”.

Para Cyro, é necessário mudar esse caráter da polícia, que hoje defende os direitos e interesses dos ricos, como do especulador Naji Nahas em São José dos Campos. O dirigente terminou sua fala puxando uma palavra de ordem que foi cantada por todos: ‘Sérgio Cabral, seu ditador/liberte Daciolo, que é trabalhador’.

Os policiais aprovaram a greve por unanimidade, com o aquartelamento das tropas a partir desse dia 10. Policiais de estados como Pará, Paraná, Alagoas e Rio Grande do Sul também ameaçam cruzar os braços.

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    Post author da redação, com Raíza Rocha, de Salvador (BA)
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