Representantes de FMI e Comissão Europeia, antes de reunião com ministro das Finanças grego, dia 30

País está à beira do calote, enquanto Europa e o restante do mundo caminham para o início de nova recessãoRapidamente, os fatos vão minando o discurso até pouco tempo atrás otimista dos governos europeus e dos EUA. Junto com o FMI e o Banco Central Europeu, faziam crer que os sucessivos pacotes de ajustes fiscais impostos ao pequeno país do Mediterrâneo, penalizando sobretudo os trabalhadores e a grande maioria da população, resgatariam a economia e evitariam uma catástrofe.

Os últimos dois anos jogaram o país à beira de um caos social. Pois bem, agora a Grécia anunciou que não cumprirá a meta estabelecida com a União Europeia para 2011 e 2012, em troca do pacote de ajuda. O anúncio ocorreu logo após a reunião do gabinete de governo, nesse dia 2 de outubro, em pleno domingo.

Junto à divulgação das novas previsões para o próximo período, o governo do ‘socialista’ George Panpandreou também anunciou a demissão de 30 mil funcionários públicos em um ano. Eles entram para uma ‘reserva trabalhista’ e passam a receber só parte do salário, até serem finalmente demitidos. Com isso, o governo espera economizar só 300 milhões de euros, dos mais de 6,6 bilhões que vai ter que cortar para garantir as novas metas. O calote chegou primeiro aos trabalhadores.

“Querem transformar esse país em algo mais parecido aos Bálcãs que a Europa Ocidental” protestava uma funcionária pública em um dos recorrentes protestos convocados pela Central Adedy, que congrega os sindicatos dos
trabalhadores públicos. Expressando o que vem ocorrendo com boa parte da população grega, a servidora viu seu salário cair de mil para 700 euros. Já o desemprego no país ultrapassa os 16%, em índice que muitos consideram subfaturado.

Para o Ministério das Finanças do país, 2011 vai fechar com um déficit de 8,5% (cerca de 18,69 bilhões), quando a meta acertada para o recebimento da ajuda financeira era de 7,6% (17,1 bilhões). Para 2012, o país prevê déficit de 6,8%, também superando a meta de 6,5%. A justificativa dada pelo governo para a revisão dos números seria uma recessão ainda mais profunda que a estipulada. Segundo seus próprios cálculos, a economia grega vai diminuir 5,5% em 2011, quando o previsto era de 3,8%, e pelo menos 2% no ano que vem.

Recessão à vista
Uma comissão formada por representantes dos principais países europeus, o FMI e o BCE (a troika) estão na Grécia vasculhando suas contas. A percepção de que o calote é inevitável ao país que tem uma dívida pública equivalente a 145% de seu PIB (soma do valor de todas as riquezas produzidas em um ano) se torna cada vez mais forte. A liberação da parcela de 8 bilhões de euros do empréstimo acertado em 2010 vai apenas prorrogar essa situação. Relatos já dão conta que o objetivo da troika, agora, seria o de um ‘calote controlado’, a fim de que isso não desencadeie uma onda de crise para o resto do continente.

Preocupação inútil na visão dos principais bancos de investimentos. Em reunião com o FMI, para discutirem os cenários mais prováveis para a economia mundial, tanto o Citibank como o Morgan Stanley prevêem um rápido aprofundamento da crise. O Citibank espera uma moratória da Grécia no mais tardar até dezembro e prevê o início de uma recessão européia já nesse trimestre. Tanto ele quanto o Morgan Stanley esperam uma nova recessão mundial.

Mas isso não intimida os dirigentes da troika, que mesmo diante do recrudescimento da crise e da iminência de uma recessão, pedem mais sangue. O ministro de Assuntos Econômicos da UE, Olli Rehn, afirmou nesse dia 3 de outubro que é “imprescindível intensificar a consolidação fiscal e tomar medidas que alentem o crescimento através de reformas estruturais”. Citou como exemplos Itália e Espanha, que aprovaram recentemente reformas constitucionais para “limitarem” o endividamento público.

Um novo capítulo da crise?
Os organismos multilaterais exigem cada dia mais cortes e ajustes fiscais à Grécia e aos países mais endividados, como Portugal, Itália e Irlanda. Os demais países também implementam seus ajustes. O problema é que, o que está ocorrendo no país heleno, agora, pode ser visto como prenúncio do que vai acontecer em todo o continente. Essa política recessiva vai causar ainda mais… recessão. Numa economia em retrocesso, a arrecadação se reduz, o que faz com que os governos se concentrem na outra ponta para equilibrar as contas. Ou seja, aumentam os cortes, como acabou de fazer Papandreou.

Isso vai significar ainda mais desemprego, cortes de salários e direitos, que vai aprofundar ainda mais a crise, numa espiral recessiva. Pode, ainda, inaugurar uma nova onda de cortes e ataques ainda mais profundos e radicalizados no continente. O que vai acontecer com o país de 11 milhões de habitantes é o que menos importa, na verdade, aos banqueiros e dirigentes políticos. O problema é que vai ser difícil separar a Grécia da Europa e a Europa do resto do mundo. A proposta de simplesmente tirar a Grécia da zona do Euro mostra-se inviável, visto que isso prejudicaria países como a França, cujos bancos estão metidos até o pescoço com os títulos gregos.

Não foi à toa que o Secretário do Tesouro dos EUA, Timothy Geithner, visitou a região em setembro. Bancos norte-americanos já começam a sentir os efeitos da crise do outro lado do Atlântico, que também é destino de nada menos que 13% das exportações ianques.

Resposta dos trabalhadores
A crise internacional que explodiu em 2008 foi a mais grave desde o crash de 1929. Os governos responderam a ela despejando trilhões nos mercados financeiros e salvando os bancos e grandes empresas. Se num primeiro momento isso evitou uma depressão como a dos anos 1930, numa segunda etapa causou uma grave crise fiscal, principalmente na Europa.

Agora, a resposta financeira dos Estados vai mostrando seu limite, como nos EUA, ao mesmo tempo em que cobra seu preço na Europa. Os governos, mais uma vez, jogam essa crise nas costas dos trabalhadores, através de cortes e reformas.

Da mesma forma que a crise econômica vai se sincronizando, a luta de classes também acerta seu ritmo. As mobilizações que sacodem a Europa através de greves gerais e manifestações massivas na Grécia e Espanha, ainda que limitadas por uma direção que se recusa a enfrentar os governos, e se expressa em movimentos como o dos ‘indignados’ espanhóis, começam a chegar no coração do império. Enquanto fechávamos essa edição o movimento ‘Ocupar Wall Street’, entrava em sua terceira semana, mesmo sob forte repressão policial, e ganhava apoio de sindicatos.

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