Medida não interfere nos lucros dos investimentos especulativosO governo Lula acaba de anunciar a taxação da entrada do capital estrangeiro no país. A medida foi divulgada nesse dia 19 pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. O imposto, concretizado através de decreto publicado no dia 20, vai instituir 2% de IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) sobre o capital externo que for investido na Bolsa ou em títulos da dívida pública.

Segundo o ministro, a medida visa “prevenir que haja um excesso de especulação na Bolsa e no mercado de capital”. Outro objetivo anunciado por Mantega para a taxação seria “proteger a produção nacional, incentivar a volta de investimentos e preservar o emprego dos trabalhadores”, contendo a valorização excessiva do real frente ao dólar.

O que está por trás disso?
Nos últimos meses o Brasil virou rota preferencial do capital financeiro internacional que, ao inundar o país com dólares, valoriza cada vez mais a moeda local. No início de outubro, as reservas internacionais (estoque de dólares do país) batiam o recorde ao atingir US$ 231 bilhões. Só este ano, o real se valorizou 36% em relação ao dólar.

Tal situação permite ao governo reforçar sua campanha de que a crise passou e que o Brasil a atravessou para se fortalecer ainda mais. “Há um grande interesse pelo Brasil que é forte e sólido e muito atrativo, daí o grande fluxo de dinheiro para o país”, chegou a dizer o ministro. Permite, ainda, ao país empreender medidas demagógicas como emprestar dinheiro ao FMI.

A valorização excessiva da moeda local provocada pela entrada de dólares, no entanto, traz efeitos colaterais nada bons para o governo. E não se trata do impacto sobre a indústria nacional e sobre os empregos provocados pelo aumento das importações, que o ministro disse estar preocupado.

Quando o real sobe em relação ao dólar, ou seja, quando o câmbio se valoriza, são necessários mais dólares para comprar determinada quantia em real. A moeda sobrevalorizada encarece as exportações e prejudica os negócios dos setores que mais cresceram durante o governo Lula.

Isso significa menos lucros para o agronegócio de exportação e a venda de matérias-primas para fora, como minério de ferro, por exemplo. São estes setores que o governo tenta proteger com a medida aparentemente progressista.

Paraíso da especulação
A taxação de 2% do capital estrangeiro, além disso, é ínfima perto dos altos lucros que os especuladores têm no Brasil. “O que são 2% para quem visa potencial de valorização de 100%?”, perguntou o professor do Insper Marcelo Guterman, no jornal Brasil Econômico.

O país se converteu, nos últimos tempos, num verdadeiro paraíso para o capital especulativo. A verdadeira razão não são os bons fundamentos da economia ou uma suposta demonstração da pujança do crescimento brasileiro.

A razão disso está na absurda taxa de juros praticada pelo país, de 8,75%, uma das maiores do mundo. Isso num momento de crise internacional e em que os títulos do tesouro norte-americano contam com taxa de juros negativa. São bilhões que são desviados todos os anos do Orçamento para o bolso dos especuladores.

Em nenhum outro lugar do mundo o capital estrangeiro pode se beneficiar de tamanho privilégio. O especulador pode investir em títulos da dívida e ver seu dinheiro crescer quase 9% ao ano sem se mexer, com risco praticamente zero. Além disso, o regime de câmbio livre beneficia ainda mais o especulador, pois ele entra no país, troca seus dólares por reais, que se valorizam e, na volta, pode ser trocado por um número maior da moeda americana. O especulador, assim, ganha na entrada e na saída.

O fenômeno da desvalorização do dólar em relação às demais moedas é mundial, mas foi no Brasil que ele se deu de forma mais profunda. Chega, portanto, a ser cínica a declaração do ministro Mantega de que o novo imposto pretende conter a onda especulativa no Brasil.

A medida pretende ser, tão somente, um regulador cambial a fim de proteger os interesses do setor exportador, mantendo os já absurdos lucros do capital especulativo.