Modelo de concessão deve ser divulgado nos próximos meses pelo governoO governo Dilma acaba de anunciar o início do processo de privatização dos aeroportos brasileiros. A informação veio do ministro da Casa Civil, Antonio Palocci na última semana de abril, em decisão tomada junto com o Planalto, embora a hipótese já estivesse sendo aventada há tempos. Seria a solução para o caos aéreo que piora a cada dia e que tende a se aprofundar com a Copa do Mundo e as Olimpíadas. A ideia é generalizar um modelo que já vem sendo empregado no aeroporto de São Gonçalo Amarante, em Natal.

Aplaudida pela grande imprensa, a medida visa transferir para a iniciativa privada a administração da rede aeroportuária, começando já pelos três dos maiores aeroportos do país: Guarulhos, Brasília e Viracopos, em Campinas. Outros dois já estariam na fila: o aeroporto do Galeão, no Rio, e Confins, de Belo Horizonte. Depois, estendido aos demais 62 aeroportos que existem sob a direção da Infraero.

De olho nos lucros
Definida a privatização, discute-se agora o modelo a ser seguido. Provavelmente, o governo lance mão das parcerias público-privadas (PPP´s), modelo implementado no próprio governo Lula. Assim, os investidores entrariam com parte do capital para a expansão dos aeroportos, teriam a administração dos mesmos cobrando tarifas das empresas aéreas e, principalmente, dos passageiros, e teriam ainda a salvaguarda do Estado para eventuais perdas e prejuízos.

De olho num filão que só cresce no Brasil, grandes grupos estrangeiros, empresas aéreas e mega-empreiteiras já se articulam para tomar o controle do setor. Uma linha especial de financiamento do BNDES para isso já estaria sendo articulada. Segundo o jornal O Globo, Camargo Côrrea, Andrade Gutierrez e Odebrecht já teriam constituído joint-ventures (parcerias) para gerir os aeroportos, antes mesmo de divulgados os detalhes da concessão.

Ainda em 2008 a Camargo Corrêa se uniu a grupos estrangeiros, como a suíça Flughafen Zürich AG e a chilena Gestión Igeniería, criando a empresa A-port. A subsidiária já administra aeroportos em vários países da América Latina, entre eles Chile, Honduras e Colômbia, além da ilha de Curaçao. A alemã Fraport também já demonstrou interesse nos aeroportos brasileiros.

O grande número de interessados em abocanhar a administração dos aeroportos é explicado pelas possibilidades de lucros de um setor que, só em 2010, teve 154 milhões de passageiros, com vias de se expandir ainda mais. O irônico dessa história é que a privatização do setor aéreo vai se dar pelas mãos do partido que, na última campanha eleitoral, acusou o adversário de “privatista”, defendendo um “Estado forte e atuante”.

Modelo petista de privatização
Outra ironia é que, a fim de justificar a entrega dos aeroportos ao capital privado, o governo Dilma utiliza os mesmos argumentos desfilados pelo governo FHC para privatizar as estatais. Ou seja, de que o setor público seria sinônimo de ineficiência e incompetência, ao contrário da iniciativa privada.

Para isso, parte da real situação de superlotação e esgotamento dos aeroportos brasileiros. Quem é obrigado a passar por Guarulhos, por exemplo, a qualquer hora do dia, pode testemunhar as filas quilométricas e atrasos freqüentes do maior aeroporto do país. Estudo recente divulgado pelo Ipea, “Aeroportos no Brasil: investimentos recentes, perspectivas e preocupações”, mesmo elaborado para justificar a privatização, indica a razão disso.

Segundo o Ipea, em 2003 o número de passageiros que voavam no país foi de 71 milhões. Em 2010, foi de 154 milhões, um crescimento de 117%. Ou seja, nos últimos anos o setor experimentou uma expansão exponencial, mas que não foi acompanhado por investimentos em infra-estrutura aeroportuária que acompanhasse essa demanda. Chegamos a uma situação em que, em 2010, dos 20 maiores aeroportos do país, 14 estavam em “situação crítica”, operando acima de sua capacidade.

O documento aponta que, mesmo após os acidentes de 2006 e 2007, não houve aumento do investimento no setor. “Constata-se também que, apesar dos graves acidentes aéreos ocorridos em 2006 (GOL) e 2007 (TAM), que culminaram no chamado “apagão aéreo”, não houve uma reação do poder público em termos de reforço nos investimentos totais aeroportuários, que permaneceram relativamente estáveis no período (2006/2010)”, diz o texto.

Desregulamentação
A saturação do setor aéreo causada pela falta de investimento ameaça agora a própria Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas em 2016. Para as grandes empreiteiras, empresas estrangeiras e investidores, uma oportunidade de ouro para, finalmente, privatizarem os aeroportos. O governo do PT, assim, cumpre o modus operandi traçado por FHC: precariza-se primeiro para se legitimar depois a privatização, escondido sob o eufemismo de “concessão”.

Com a privatização, o governo Dilma abre mão de um setor lucrativo, em franca expansão e estratégico ao país. Abre as portas também para o avanço da desregulamentação do setor. Seguindo nessa esteira, as companhias aéreas, por exemplo, estudam o aumento da jornada de trabalho para a tripulação, de 85 horas/mês para 100 horas/mês, como destacou o jornal Estado de S. Paulo do último dia 1º de maio. Num setor em que carga horária e segurança estão intimamente relacionadas, essa notícia deveria trazer preocupação.

Para os passageiros, esse processo vai significar o aumento nos preços das passagens da ordem de 30% a 100%. Para os trabalhadores dos aeroportos e das companhias aéreas, a flexibilização dos direitos trabalhistas. E para o PT, a confirmação do modelo privatista imposto por FHC e tão criticado por Dilma e Lula na campanha eleitoral.