Presidente venezuelano pede que Farc se rendamO governo de Chávez desperta muitas ilusões entre setores da esquerda. Seu palavreado aparentemente anti-imperialista leva muitos a acreditar na sua “revolução” bolivariana, em direção ao “socialismo do século 21”. Mas Chávez vem percorrendo um caminho bem diferente.

Depois de sua derrota no referendo, o presidente iniciou um giro à direita, por meio de uma política de negociação com a oposição burguesa. No terreno internacional, tenta se mostrar como uma figura “mais confiável” para o imperialismo. Tudo isso ajuda o movimento de massas a fazer sua experiência e conhecer de fato o governo. Até mesmo os defensores de Chávez estão perplexos.

Apesar das frases vagamente socialistas, Chávez representa um nacionalismo burguês, mais parecido com os governos de Cárdenas, no México dos anos 1930, e de Nasser, no Egito dos anos 1950. Ou mesmo com Perón, na Argentina, antes de 1955.

Um chamado à rendição
Numa declaração pública, Chávez pediu que as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) libertassem de maneira unilateral todos os reféns do grupo. Quer dizer, em troca de nada. Também chamou a guerrilha a baixar suas armar para iniciar negociações de um acordo de paz com o presidente colombiano, Álvaro Uribe.
“O tempo das guerrilhas acabou. As condições estão dadas para que se inicie um processo de paz. Já basta de tanta guerra, chegou a hora de se sentar e falar de paz”, disse Chávez.

A declaração provocou profunda indignação. O que Chávez propõe é uma rendição sem condições da guerrilha. Se isso acontecer, terá graves conseqüências. Quem pode garantir que esse “processo de paz” não vai acabar como tantos outros na história colombiana, em assassinatos e massacres daqueles que entregaram as armas? Isso ocorreu no extermínio dos 3.500 dos militantes da União Patriótica (UP), partido fundado após as negociações entre as Farc e o governo de Belisario Betancourt, nos anos 80.

Não concordamos com a política e os métodos da guerrilha colombiana, mas defendemos os lutadores, guerrilheiros ou não, de qualquer ataque do Estado capitalista. Isso é ainda mais importante considerando-se o caráter ultradireitista do governo de Uribe, capacho do imperialismo.

Como Chávez pode falar em entregar as armas sabendo que existem milhares de guerrilheiros torturados nas prisões de Uribe? Qual será o destino dessa gente? Quantos serão libertados? São questões que os defensores do chavismo devem responder.

Mas o presidente foi mais longe e disse: “As Farc devem saber uma coisa: vocês se converteram em uma desculpa do império para ameaçar todos nós”. O que Chávez quer dizer? Está acusando as Farc de fazer o jogo do imperialismo?

As declarações ocorrem num momento difícil para as Farc, que sofreram duros golpes com o assassinato de seus dirigentes. Em março, Uribe lançou uma provocação apoiada por Bush, atacando uma base das Farc no Equador. Analistas falavam com exagero de um “conflito militar” entre Colômbia e Venezuela. Chávez chegou a denunciar a provocação, rompeu relações diplomáticas com a Colômbia e deslocou tropas para as fronteiras. Mas, ao final, tudo acabou num acordo e em tapinhas nas costas entre Uribe e Chávez.

O episódio mostrou os limites do “antiimperialismo” chavista. Agora, meses depois, o líder venezuelano defende uma política que fortalecerá Uribe. Este, por sua vez, agradeceu: “Para mim parece, digo isso pela primeira vez, que os comentários do presidente Hugo Chávez são positivos”, disse.

Presente para banqueiros e empresários
No dia 11 de junho, Chávez anunciou seu novo plano na economia, chamado de “Reimpulso productivo”, para um público formado por industriais e banqueiros. O plano acaba com o Imposto a Transações Bancárias. Um grande benefício para empresários e banqueiros, que deixarão de pagar cerca de US$ 3 bilhões.

Naturalmente, a burguesia do país gostou da iniciativa. O novo plano é um presente para os empresários, especuladores e todos aqueles responsáveis pela crise inflacionária e de desabastecimento na Venezuela. Mas as medidas do governo não irão parar a inflação. As estimativas extra-oficiais para este ano são de aproximadamente 40%.

Imagem mais confiável
Chávez está indo à direita porque seu governo está se desgastando. Mantendo o capitalismo e suas conseqüências de inflação e miséria, ele vem perdendo o apoio social no país. Não foi à toa sua derrota no plebiscito em dezembro, em particular nos bairros mais populares. Após a derrota, Chávez procurou fazer as pazes com a direita e até perdoou os golpistas de 2002, acusados de sabotagem e massacres contra a população que saiu às ruas contra o golpe.

Por outro lado, suas declarações chamando as Farc à rendição têm por objetivo apresentar uma imagem “mais confiável” de Chávez aos governos do continente.

Levando em consideração as eleições nos EUA, ele também indica uma possível reconciliação com o próximo presidente norte-americano. Sobre isso, Heinz Dieterich, antigo apoiador de Chávez (agora desencantado), escreveu: “tanto Hugo Chávez como Barack Obama se encontram ante difíceis situações eleitorais e internacionais que os induzem a uma aliança de beneficio mútuo, sacrificando neste pôquer mundial as forças guerrilheiras colombianas”. (Chávez, as Farc e o provável fim do antiimperialismo bolivariano).

Nacionalização da Sidor não foi um presente

Os defensores do venezuelano podem alegar que não é verdade que Chávez está seguindo à direita, pois seu governo recentemente nacionalizou a Sidor (Siderúrgica do Orinoco).

Mas a nacionalização não foi nenhum presente do governo, pelo contrário. Foi uma conquista da heróica luta dos trabalhadores da empresa que ocorreu após um ano e meio de luta incansável pela convenção coletiva, na qual os trabalhadores realizaram dez paralisações e sofreram uma brutal repressão.  Uma delas, no dia 14 de março, resultou em 53 trabalhadores presos e 13 feridos.

Além disso, os trabalhadores enfrentaram uma intervenção direta do Ministério do Trabalho que defendeu a empresa contra os trabalhadores. O governo só nacionalizou a Sidor após ser derrotado em sua tentativa de controlar o movimento e depois que a lutas dos trabalhadores conquistou ampla simpatia na população.

Mas apesar da nacionalização, governo apresenta agora os limites da medida. Ao invés de nacionalizar sem indenizações e colocar a empresa sob o controle dos trabalhadores, Chávez procura fazer acordos com a multinacional Techint, antiga acionista majoritária.  Permitiu que a multinacional conserve 10% das ações e controle da comercialização de seus produtos, e está negociando quanto pagará a Techint, que acumulou dívidas com o estado venezuelano.

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