Gilad Atzmon
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Reproduzimos abaixo a entrevista feita por Fernando Ortiz de Urbina, publicada na revista espanhola Cadernos de JazzLondres, Pizza Express (um dos melhores clubes da cidade, apesar do nome). Sexta, 11 de março, primeiro aniversário do massacre de Madrid e véspera do cinqüentenário da morte de Charlie Parker. Uma data propícia para encontrar Gilad Atzmon, ativista, político, polemista, filósofo, escritor, mas, sobretudo, saxofonista de jazz e líder do Orient House Ensemble, um dos grupos mais sólidos do cenário britânico.

Atzmon encontra-se em plena campanha de apresentação de sua segunda novela, My One and Only Love, publicada em inglês e a ponto de ser editada na França e Grécia. Sua música é uma mistura de bebop e música mediterrânea, entremeada com tango, free jazz e cabaré alemão. Já de início ofereceu a costumeira mescla de música e sátira política, como no tango dedicado à “dois tiranos que, por impopulares, decidem trocar de sexo e emigrar para Buenos Aires a fim de exercer a prostituição sob os nomes de Georgina e Antonella, Bush e Blair. Também tocaram Lili Marlene, My One and Only Love e temas apropriados como Liberating the American People.

Uma semana depois conversávamos em sua casa. Atzmon, judeu israelense de ascendência russa, é um homem alto, delicado, apaixonado, amável e de riso fácil. Fala inglês com forte sotaque mediterrâneo, sua linguagem é repleta de aforismos e a conversa deriva indefectívelmente para a política.

Um judeu anti-sionista que toca jazz na Inglaterra. Por que Londres?
Atzmon –
De fato, não vim para tocar, mas para estudar filosofia. E era caro demais, não esperava que fosse tanto. Assim que tive que trabalhar e não tardei muito em dar-me a conhecer, minha música agradava às pessoas. Já havia trabalhado como músico de sessão e produtor, mas não queria tocar mais. Quando vim para cá estava farto de Israel, este lugar me agrada, sobretudo quando faz tempo bom. Em geral me agradam as pessoas, são divertidas como público, são “punheteiramente anárquicos”, e de todo modo, há apenas ingleses em Londres. É um lugar muito interessante, ainda que os serviços públicos sejam uma ruína. É algo profundamente desumano que os próprios ingleses são os primeiros a sofrer. De fato, há mais de um músico neste país que quando adoece pega um vôo barato e vai ao médico na Espanha. Este matiz assassino não é exclusivo da Inglaterra, ocorre em países que nunca foram derrotados, países governados por uma elite enraizada no poder. É muito triste.

O que o levou a abandonar Israel?
Atzmon –
Há quem tenha a impressão de que fui um herói quando servi no exército israelense na guerra do Líbano. Em absoluto. Não fiz mais do que ver aquela gente, os palestinos estavam por todas as partes! , e me dei conta: “Merda, estou vivendo em território palestino”! Foi então quando decidi pegar a estrada; não somente por não querer viver em terra palestina mas porque não podia aceitar o que estava acontecendo ali, a princípio foi um certo sentimento de culpa. Vim a Londres para estudar filosofia germânica e não estava muito interessado na política. Não recordo quando me ocorreu fazer aqui o mestrado de filosofia, logo comecei o doutorado, se supunha que deveria começar a dar aulas e me dei conta de que a Universidade é um lugar horrendo, quase tanto quanto Israel. Decidi escrever um livro, fazer filosofia em um formato diferente e assim saiu Guia de Perplexos. Isso era tudo, estava satisfeito, nunca pensei que se chegasse a publicá-lo. Então fui aumentando minha popularidade, não tinha tempo para a universidade e o doutorado e disse: “que se danem… prefiro tocar jazz por quatro tostões até morrer”, e isso foi tudo.

Quando começou com o jazz?
Atzmon –
Aos 17anos, bastante tarde. Eu cresci em Jerusalém e quando adolescente gostava de Queen, Beatles, já sabe; então assisti Boris Gamer, um músico russo, saxofonista, tocando como um possesso na tv. Neste mesmo momento decidi que tinha que comprar um sax. Antes havia tocado um pouco de clarinete, mas não havia levado muito a sério, e ao cabo de um mês já era um saxofonista. Durante dois ou três anos praticava em torno de 14 horas diárias. Provavelmente toco um tanto melhor agora, mas é muito fácil.
(Atzmon relata em um de seus incontáveis artigos como se criou em um entorno marxista, e se reflete em sua explicação da história do jazz como uma dialética de luta(s))

Na década de 50, o jazz era a voz comum dos negros clamando pela libertação. Eu sustento que o jazz era um movimento genuíno de rebelião antiamericano e foi derrotado. Os estadunidenses negros foram vencidos e nunca alcançaram os objetivos pelos quais lutaram tanto, se mantiveram restritos a uns poucos lemas e tópicos, como o do tamanho de seus pênis, e assim se encerrou o assunto. E isso foi suficiente para convertê-los em carne fresca, bucha de canhão para a ideologia expansionista dos EUA.

Há pouco me pediram que fizesse comentários para um disco. Não costumo fazer este tipo de tarefa, mas há gente que me pede que lhes escreva algo, costumam me pedir porque lhes agrada minha música e crêem que haja algo na sua que vou compreender. É muito confuso porque, no fundo, eu toco bebop. Ponho-me a escutar o disco e é horroroso; o pianista trata de tocar como Brad Mehldau, e Mehldau é fantástico. O saxofonista trata de tocar como Michael Brecker, e Brecker é fantástico, é o único capaz de tocar de verdade como Michael Brecker. Todos tratam de tocar como alguém, não há um só momento sincero nessa música e não sei como me escapar desse encargo, porque não é um trabalho, não cobro por ele. Este jazz não é uma música genuína.

Talvez tenha sido e já deixado de sê-lo.
Atzmon –
John Lewis, do Time Out, fez uma resenha de minha primeira passagem no Pizza Express, uma crítica muito interessante. Não me agradou, mantivemos correspondência por e-mail, me ofendeu a princípio, mas ao final nos entendemos. Segundo ele, “Wagner disse que os judeus não podem gerar música porque copiam a cultura do país em que vivem”, ou seja, que geramos música, mas não é autêntica. “Gilad Atzmon concorda com Wagner, sua música não é autêntica”, e o certo é que até aí estou de acordo, mas logo me atacava por ser anti-sionista, e não tenho problema com isso, mas me comparava com Wagner por causa do anti-semitismo. Enfim, tenho acordo de que falta autenticidade à atividade artística judia, mas acredito que aí reside a fortaleza dos judeus.

Creio que a política da identidade é totalmente insustentável se alguém diz “sou gay, sou gay!”, o que quer dizer é que está se identificando. Nestes termos, nunca poderias dizer quem és porque quando tentas descrever-te estás usando uma terminologia, uma linguagem pré-existente. Nunca se pode ter acesso a si próprio, sempre se trata de um processo de auto-identificação, o idioma, o sotaque, a linguagem corporal… são formas de identificação. Se fores judeu és estrangeiro de qualquer maneira, e enquanto não te leves demasiadamente a sério -e esse é o problema dos sionistas -tudo encaixa por eliminação: este não sou eu, nem esse, esse também não… o caso é que minha música agrada ao crítico de Time Out, premiou meu disco como o melhor de 2004, não é que não lhe agrade. O que acontece é que eu não creio na autenticidade; eu creio na beleza. Eu sou um artista, meu trabalho é buscar a inspiração estética e a isso me dedico.

Na realidade, Atzmon se dedica a muito mais. Ao terminar de falar sobre o problema da identidade, toma algumas notas para a conferência que dará dentro de dois dias na SOAS, a Escola de Estudos Africanos e Orientais da Universidade de Londres, que versará sobre o problema da identidade, que trata em sua segunda novela.

Mesmo aceitando a impossibilidade de ser autêntico, chama a atenção até que ponto não copia a outros saxofonistas de bebop, apesar da influência evidente de Charlie Parker e Cannonball Adderley.
Atzmon –
Demorei muitos anos para conseguir. Costumava copiar os grandes, mas por exemplo, Coltrane costumava deixar de tocar quando se dava conta de que estava copiando alguém. Creio que já tenho meu próprio repertório de frases, de idéias, mas meu ritmo e minha harmonia são fundamentalmente bebop. É a música que compreendo, na realidade é a única música que conheço. Não tenho formação acadêmica.

O bebop é um dos dois sabores principais de sua música. De onde exatamente sai o outro, o do Mediterrâneo oriental? O palestino? Judeu?
Atzmon –
Não gosto da música kletzmer. Posso tocar kletzmer muito bem, mas odeio. Levei anos para dar me conta de que existe uma música judia com alma, que na realidade é européia, e cujo maior virtuoso talvez seja Giora Feidman. E o faz realmente bem, uma música calma e com sentimento. Em troca, quando se trata de música judia moderna, a música da identidade judia, de judeus radicais como John Zorn, não a suporto. Um bom amigo meu gravou com Zorn, e me deu um disco acreditando que seria interessante que eu o resenhasse Mas é música estridente, vulgar, violenta. É mais violenta que os fodidos colonos dos territórios ocupados da Cisjordânia. Em minha opinião, o kletzmer é música cigana tão mal tocada que se converteu em um estilo.

Tenho estudado a música grega durante cinco, talvez sete anos. Para mim esta música é profunda, como a árabe, a influência andaluza, já sabes, … Me inspiro na música grega e turca, e na egípcia, mas não sou especialista. O melhor cumprimento que me fizeram é dizer que a minha é a melhor versão ocidental desta música. É verdade que vivi em Israel e ouvi “muecines” todos dias, mas nunca tocaria assim em Israel…
Sem solução de continuidade, Atzmon salta de um tema a outro.

…não posso regressar à Israel. A única relação com minha terra é comer humous, falafel, e tratar de produzir essa música. Não posso regressar porque sou um oponente político. Assim que, quando tenho saudades, recorro a isso, à comida e à música.

Proibiram sua entrada em Israel?
Atzmon –
Não, mas… faz alguns dias coloquei uma mensagem circulando na internet para anunciar a publicação de meu livro. Poucas horas depois havia uma crítica no “Amazon” massacrando-o. Escreveu uma pessoa de Tel-Aviv, e de fato sei quem é. Tenho meus informantes (risos). Uma vez liguei para o técnico em informática porque tinha um vírus e comentei com ele “não sei, igual é o Mossad”, e me respondeu “não, quanto ao Mossad, posso vê-lo aqui, cuidando do teu computador para que tenham livre acesso e ver o que estás fazendo”, assim que talvez devesse queixar-me ao Mossad… talvez fosse algum judeu estadounidense jovem fazendo das suas.

Basicamente, estou defendendo idéias que podem ser consideradas ilegais, um delito. Mas isso acontece até na Europa. Se disseres que no Holocausto não morreram seis milhões de judeus, mas 5.999.999, cometerias um delito. De fato, posso provar que foram menos de três milhões e na realidade não importa porque ainda que se tratasse de uma só família aniquilada, seu sofrimento seria suficiente para fundamentar um argumento ou provocar empatia.

O que eu sustento é que os sionistas foram os maiores colaboradores dos nazistas, como demonstram fatos mais que provados. Também sustento que Israel não tem direito a existir, que o anti-semitismo é uma invenção judia e respaldo qualquer forma de resistência contra Israel.

No dia em que o vi no Pizza Express fazia um ano do massacre de Madrid. Que te pareceu a comoção política que se seguiu ao atentado?
Atzmon –
Está bastante claro: o terror é imbatível e temos demasiado o que perder. Com certeza, senti por todas as pessoas que morreram e por suas famílias, mas poderia ter acontecido a nós aqui, na Inglaterra. Este país é muito vulnerável! Matar gente é muito fácil, aqui e em qualquer parte. A consideração importante é onde matar e suas implicações táticas.

Voltando à música, é paradoxal que atualmente o setor mais conservador do jazz se constitua de afro americanos como Wynton Marsalis e Stantey Crouch.
Atzmon –
Reconheço que às vezes exponho minhas idéias de forma demasiado simplista (Atzmon pega papel e lápis e desenha). Existem umas poucas correntes no jazz. Temos a principal, revolucionária. Dentro destas correntes está Duke Ellington, que defendeu que o jazz era a música clássica dos EUA. De sua parte, Marsalis esta tratando de desenvolver o jazz segundo um modelo “clássico”, assim que, de alguma maneira, é uma corrente bem legítima.

Agora bem, para mim, como filósofo, minha premissa é “o jazz trata sobre a liberdade”. Segundo a escola alemã, a filosofia é a busca da condição da possibilidade. Assim, a estética seria a condição da possibilidade da beleza. O que é a beleza? O que sentimos na realidade? Alguns filósofos sustentam que a arte moderna é filosofia, porque coloca a pergunta “o que é arte?”. Se aplicarmos ao jazz teremos um vetor social, uma tendência que aponta para a liberdade, e por sua vez celebra a liberdade em si mesmo. Em muitas ocasiões, na política, se tem reclamado pela liberdade de distintas formas. No caso do jazz, queremos liberdade, mostramos que liberdade queremos mas, para conseguí-la, devemos libertar-nos primeiro. Agora bem, os homens não podem ser livres porque, por exemplo, tocas o sax e se tocas segundo os acordes, inclusive quando tocas contra os acordes, não és livre, ainda que seja esse o objetivo. O jazz é uma luta dialética em potencial e aí reside sua beleza…

Já não supõe a luta pela libertação da qual falava a princípio…
Atzmon –
O jazz já não luta pela liberdade como um movimento político porque não é um movimento político, já não se associa com nenhum movimento político e tampouco aponta para a liberdade como atividade musical. Por que? Porque vivemos em uma era muito orquestrada do ponto de vista comercial. Produzimos música cuja apreciação reflete seu mérito comercial, ou seja, que meu disco é fantástico porque vendeu 2.500 cópias em dois meses, estabeleceu-se um nicho que, uma vez alcançado, anula qualquer busca de autenticidade, de motivação social ou política, o que resta é unicamente um movimento temático ou semântico, já sabes, umas poucas frases, algumas cores produzidas pelo timbre dos instrumentos. Algo lamentável. Em um artigo explicava que, uma vez que esta forma de resistência social foi aniquilada, foi quando a burguesia branca ampliou seu interesse pelo jazz e quando o jazz se tornou acadêmico, quando floresceram Berklee, Mannie’s e todas essas escolas. O jazz passou de tratar de dizer o máximo possível a dizê-lo o mais rápido possível isto foi o que aconteceu nos anos 70 e 80, se converteu em um ruído ininteligível. Agora temos um retorno do jazz porque, para começar, temos cartazes de propaganda dele. Se uma cantora como Norah Jones, por exemplo, tivesse que cantar em country estaria perdida, mas se o ritmo for jazz, desperta interesse. Agora estamos jogando com diversas táticas comerciais, somos vítimas das manobras comerciais, e te digo uma coisa: faz a vida muito mais singela.

Em que sentido?
Atzmon –
Porque vou pelo caminho contrário. Não entro no jogo nem tento colocar meu disco na rádio. Não estou nem aí! Quero aproximar as pessoas de mim, tocar uma semana em um clube no centro de Londres é um problema.

Por que?
Atzmon –
Porque há muito pouca gente que se pode permitir. Se quiseres ir acompanhado tens que conseguir uma carona, ou pegar o carro, estacioná-lo, comer algo, beber… Quem se pode permitir? De certa maneira estou tocando para a burguesia, me dei conta outro dia no Pizza Express. Assim que em junho vou fazer um giro por Londres, nos bairros populares, porque aí estão as pessoas que se supõe devem escutar jazz, e que de fato escutam e desfrutam.
(A sátira é componente fundamental nas atuações de Atzmon. Em um de seus números a banda toca paródias de livre improvisação e, dentro de alguns momentos, o saxofonista explica que solicitaram uma subvenção do “Arts Council of England”, e que esta é a música que eles gostam.)

A paródia sobre o ACOE trata de ridicularizar a burguesia branca e como o jazz já se incorporou ao sistema?
Atzmon –
Desde logo. Como podemos resistir se dependemos desse dinheiro? É uma manobra muito inteligente. Antes era a burguesia que patrocinava os músicos, mas o que distinguia estes burgueses é que eram motivados pela estética, como acontecia na corte de Frederico II. Dentro do conceito da democracia liberal, da burguesia são os políticos, gente que busca o poder, e são eles quem decide quem toca e quem não. E, parece-me, seu conhecimento estético é bastante banal e fica a impressão de que tudo o que se produz neste país, pelo menos em tudo que eu participei que foi organizado por estas instituições, era surpreendentemente prejudicial e muito impopular. Daí a reação do público a nossa paródia: sabem que é uma farsa.

Também poderia entender-se como uma crítica ao free…
Atzmon –
É fundamental esclarecer esse ponto, porque sei que há quem pense que é uma crítica ao free. Não tenho nenhum problema com o free. Há o livre alucinante e o livre vagaroso, como há bebop alucinante e bebop vagaroso. Tão somente trato de ridicularizar esses políticos vazios. Quando tocamos na Europa mantenho o argumento mas digo que sou um compositor moderno.

Atzmon – O que pensa então sobre a subvenção do jazz com dinheiro público?
Estou a favor. Neste sentido, no continente se faz de forma mais inteligente do que na Inglaterra, porque no continente se apóia a “MusiK”, como intitulei meu último disco. “Music” representa a manutenção da hegemonia do poder, “MusiK”, com K maiúsculo é a busca da beleza. Diferencio entre o “K”, a busca estética, e o “c”, que é a transformação da estética em um efeito material, em algo comercial, a mesma diferença entre Kultur e cultura.

Uma vez toquei na Espanha, num bom local, o piano estava muito bom. Se toco na Europa do Leste, o mesmo. Faz pouco tocamos em um dos melhores teatros de Exeter, e o estado do piano era lamentável. Se cobras 20 £ [30 €] de ingresso, como é possível que o piano não seja afinado todos os dias.

Seus concertos incluem música, comédia e sátira política. Se poderia afirmar que a parte política pode ocultar a musical? Qual, separado, tem preferência?
Atzmon –
Não me interessa tanto a política, às vezes nem usamos esse tema. De fato estou cansado da política, não me interessa como tal. Não me meteria na política britânica a menos que começassem a matar minha gente. Isso é o que está fazendo Blair, por isso o massacro. Todas as noites ele massacra iraquianos, eu o massacro. Estou comprometido, e isto é tudo. Mas às vezes penso que sou um estúpido metendo-me de graça nestas confusões.

Projetos para o futuro?
Atzmon – Creio que o tamanho da banda é adequado, mas viajar é um problema. Definitivamente somos um grupo de jazz, não ganhamos muito dinheiro. Quando ganhamos mais dinheiro, incluímos mais músicos (risos). No entanto me surpreende que estejamos saindo na frente sem patrocinadores. Meus discos vendem surpreendentemente bem.

No mundo do jazz tendemos a esquecer de que isto também é um negócio.
Atzmon – Desde logo. Em primeiro lugar sou músico, mas também sou um homem de negócios e tenho que vender minha música. Hoje tenho uma boa posição, talvez a mais alta do jazz britânico. Tenho muito o que perder. Poderia virar estrela! Já tentaram transformar-me em estrela.

Os três personagens principais de sua última novela, um músico, seu agente, e uma espiã que usa seu corpo como ferramenta de trabalho, tem a ver com você?
Atzmon – Com efeito, também sou uma prostituta. Daí saem todos os meus personagens, não sou tão inteligente. Sei como funciona esse negócio da música…

Epílogo
Ao final de nossa conversa, Gilad admitiu que está cansado. Quando em visita ao seu website pode-se apreciar a produtividade deste homem em discos, livros, as correspondentes premiações, entrevistas, concertos, artigos, conferências, etc. No momento, continua gerindo diretamente tudo o que faz, mas não vê a hora de escapar para os Pirineus franceses: “é verdade que necessito umas férias, relaxar”, disse em tom de desespero. “Escapar-me com meu sax e meu computador portátil…”…para ensaiar e continuar escrevendo, se supõe.

Atzmon pode parecer petulante por sua aplastante franqueza que o protege de falsas modéstias. Também é certo que, como todo o homem possuído pela necessidade de expor seu pensamento, cai em contradição e paradoxo (como exemplo, o prato comemorativo ao casamento do príncipe Charles e a Lady Dy que tem em sua casa). Mas o que, em qualquer caso, resulta inegável é sua coerência artística e pessoal na hora de defender sua obra. O êxito de crítica e público constitui uma incomum, mas justa recompensa. Para todos os músicos que crêem cegamente em sua própria mensagem, deveria ser um raio de esperança.

Entrevista publicada em Cuadernos de Jazz, nº 88, maio – junho de 2005 (Madrid)
www.cuadernosdejazz.com