Convocação burocrática de Dunga frustra torcidaPara a maioria dos amantes do bom futebol, o anúncio da lista de convocados por Dunga para a Copa foi decepcionante. Avesso a ousadias, o técnico ignorou solenemente os apelos da torcida brasileira por Ganso e Neymar.

Em entrevista coletiva, Dunga repetiu inúmeras vezes a palavra “coerência” para explicar a não-convocação dos meninos de ouro da Vila Belmiro. Disse que eram muito novos e que “não houve tempo para testes”.

Por outro lado, a escalação de Kleberson, reserva do Flamengo, e Grafite, que atuou em apenas um jogo da seleção e não mostrou muita coisa, contradizem toda a coerência lógica do treinador. Portanto, diferente do que diz Dunga, não foram convocados apenas aqueles que ralaram.

Coerência seria convocar os dois maiores craques em atuação no país. Dois jogadores que, junto com Robinho, exibem uma fabulosa (e rara) sintonia no ataque do Santos. Futebol é exatamente essa combinação da genialidade do boleiro, seu domínio dos fundamentos, com a mais perfeita sintonia dentro da equipe. Isso é precioso, mas só funciona quando treinadores têm a sensibilidade necessária e bom senso de oportunidade, o que é o oposto da teimosia.

Um jornalista criticou a falta de ousadia do técnico dizendo que Pelé não seria convocado em 1958 se Dunga estivesse no lugar de Vicente Feola. Mas a questão não se resume a falta de ousadia. É bem provável que a genialidade dos dois jovens craques não foi páreo para enfrentar o poderoso lobby empresarial de muitos atletas que atuam no exterior. Vinte dos 23 convocados não jogam no Brasil. Esse perfil estrangeiro dificulta, inclusive, qualquer elo com a torcida.

A convocação também ameaça a seleção de não ter um meio de campo digno. Um problema que tivemos na Copa de 1994, quando a falta de rendimento de Raí deixou a seleção acéfala, sem um meia-armador. Ficamos com o futebol burocrático de Zinho, Mauro Silva, Mazinho… e Dunga.

Dessa vez, o perigo de Kaká se machucar ou não render o futebol esperado pode levar a uma situação semelhante. “Mas ganhamos mesmo assim”, disse Dunga. Infelizmente, a situação hoje é pior do que em 94. Dessa vez, não temos a genialidade dos pés de Romário e Bebeto, na época veteranos que carregaram a seleção nas costas.

O que vai fazer Dunga caso seja necessário substituir Kaká? O mais provável é que o treinador opte por Julio Baptista, reserva do Roma, ou faça um improviso de laterais com volantes, descartando definitivamente um meia-armador de verdade.

Dunga está certo em cobrar raça e compromisso dos jogadores da seleção. Mas só isso não afasta o fiasco de 2006. Esperamos que a seleção apresente na Copa um futebol livre das limitações de uma estratégia burocrática, mecânica, defensiva, tão a gosto das escolas europeias.

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