Conferência de Bretton Woods, que criou o FMI
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Sessenta anos após o acordo de Bretton Woods, o sistema financeiro-comercial continua a espalhar misériaEm 1944, os países aliados, em uma representação de 44 países, incluindo o Brasil, reuniram-se na cidade estadunidense de Bretton Woods, no Estado de New Hampshire, e formalizaram um acordo que buscava evitar uma nova crise como a da grande depressão que se seguiu à queda da Bolsa de Nova Iorque em 1929. Quando a bolsa quebrou, os diversos países imperialistas tomaram medidas de proteção unilateral de suas moedas e de seu comércio, mas o efeito foi o inverso, a crise se propagou e intensificou-se.

Com a aproximação do fim da guerra, os principais governos mundiais passaram a negociar a constituição de uma nova ordem mundial, que incluía a criação de uma organização política mundial (ONU), uma organização financeira (FMI) e outra comercial. A ONU foi criada em 1945 e o que seria a Organização Internacional do Comércio não foi avante – as disputas comerciais entre os dois principais imperialismos (EUA x Grã-Bretanha), os atritos entre o Congresso e o Executivo estadunidense e a não adesão da URSS foram decisivos para isso. Da proposta de regulamentação e liberalização comercial restou tão somente um Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT), que, após diversas rodadas de negociação e conflitos, baseou a criação da Organização Mundial do Comércio (OMC), em 1995.

FMI e a recolonização dos países subdesenvolvidos
O Acordo de Bretton Woods, ainda no clima da invasão da Normandia (um mês antes), criou o Banco Mundial, objetivando “reconstruir” os países arrasados pela guerra, e o Fundo Monetário Internacional, para regular as finanças mundiais (ambos com sede em Washington). Paulatinamente o Banco Mundial passa a interferir nas políticas sociais dos países subdesenvolvidos, a ponto de ser hoje o principal estimulador da privatização da educação pública de nível superior.

O FMI é controlado pelos cincos países mais ricos do mundo (EUA, Japão, Inglaterra, Alemanha e França), mas, de fato, desde o início foi dirigido principalmente pelo Departamento do Tesouro estadunidense. Os EUA são o maior acionista, dispondo de 17% das ações do Fundo, sendo que as grandes resoluções precisam de 85% de votos, ou seja, este é o único país com poder de veto.

Com o FMI, Bretton Woods também estabelece o dólar como moeda internacional (que deveria ter uma contrapartida em ouro para montante monetário emitido) e um sistema internacional de taxas de câmbio fixas.

Na década de 1960, as despesas com a Guerra do Vietnã, entre outras, tornam as contas nacionais (despesas correntes) dos EUA negativas. Também não se estava conseguindo garantir uma contrapartida em ouro para as emissões de dólares. Diante disso e da crise econômica mais geral, em 1971, o presidente Nixon, para proteger a economia de seu país, desvaloriza o dólar em 10% e abandona o padrão-ouro. Em seguida é o próprio sistema de taxas de câmbio fixo que é descartado. O FMI nada fez contra as medidas unilaterais deste país.

Como forma de se proteger da desvalorização do dólar, os países produtores de petróleo quintuplicam o preço do barril, gerando desequilíbrio financeiro e inflação. Para combater a subida de preços, atrair capitais e proteger o dólar, o Banco Central estadunidense (Federal Reserve) no final dos anos 1970 elevou as taxas de juros, produzindo a explosão da dívida externa dos países subdesenvolvidos que viram os juros subirem de 7% para 21%. O FMIm ao invés de retaliar este país, passa a impor políticas recessivas aos países devedores, objetivando com que estes tivessem como centro de suas economias gerar recursos para pagar a dívida externa. Também legitima o processo através do qual países como o Brasil, por meio de vários mecanismos, assumem a dívida de suas empresas privadas. O resultado destas medidas foi a estagnação econômica e o aumento da miséria, levando a se concluir que a década de 1980 foi uma década perdida. Em 1982, a dívida dos países subdesenvolvidos totalizava US$ 850 bilhões. Pouco mais de uma década depois, em 1993, ela saltou para US$ 1,8 trilhão, sendo que neste período foram pagos US$ 2 trilhões em juros e serviços da dívida.

Nos anos 1990, o fundo impõe um conjunto de medidas neoliberais, receitadas a partir do Consenso de Washington (1989), que incluem liberalização comercial, privatizações, arrocho salarial, redução dos gastos sociais e superávit fiscal (saldo positivo nas contas do governo). O neoliberalismo conduzido pelo FMI gerou profundas crises. Diante delas buscou-se sempre salvar o capital dos países imperialistas. Foi assim na crise do Sudeste Asiático, onde o empréstimo feito aos países em crise (Coréia do Sul, US$ 58 bilhões; Indonésia, US$ 42 bilhões e Tailândia, US$ 17 bilhões) destinou-se a evitar a perda dos capitais estadunidenses lá presentes. Também o empréstimo ao Brasil (US$ 41 bilhões) na crise do final de 1998, além de salvar o governo FHC, tinha este objetivo.

Provavelmente o país que melhor reflete a aplicação do receituário do FMI é a Argentina. Adotou-se todas as propostas ordenadas e recebeu-se sucessivos elogios por isso, mas o resultado foi a maior crise de sua história, com retrocesso de décadas em seu desenvolvimento econômico e social. Não satisfeito, o FMI propõe mais privatização, mais redução de direitos e menos gastos sociais. Tudo para garantir o pagamento em dia da dívida externa. Isso configura que esta é uma instituição cada vez mais a serviço do imperialismo na sua política de recolonização dos povos. Não é à toa que o fundo exige a autonomia dos bancos centrais e, na prática, nomeia os presidentes dos mesmos (no caso do Brasil: Pedro Malan, ex-diretor do Banco Mundial, Armínio Fraga, ex-investidor do mega-especulador George Soros e Henrique Meireles, ex-diretor do BankBoston).

As 225 pessoas mais ricas do mundo acumulam uma riqueza igual à renda de metade da população mundial (3 bilhões de pessoas) e 25% do PIB mundial está nas mãos de 200 multinacionais. Enquanto isso, o FMI repassa a conta das crises para os trabalhadores, levando 1 bilhão de pessoas ao desemprego e igualmente 1 bilhão a morar em favelas. É por isso que crescem as manifestações, Seattle, por exemplo, contra o FMI e a OMC. Infelizmente, governos eleitos pelos trabalhadores, como o de Lula, ao invés de romperem com o FMI e apoiarem a luta de resistência dos trabalhadores, acabam aplicando e aprofundando todo o seu receituário.

Nos últimos 10 anos, o Brasil pagou em juros quase que o equivalente a tudo que o governo deve atualmente. O governo petista mantém o Brasil na condição de país com as maiores taxas de juros no mundo (a Selic está em 19,25% ao ano). Como resultado tem-se o aumento dos lucros dos especuladores e a explosão da dívida pública (dívidas externa e interna do governo). A dívida pública subiu 11% desde setembro último e alcançou R$ 845 bilhões em fevereiro. Também este governo está gastando 15% mais de juros que o governo neoliberal anterior (quando comparados os dois primeiros anos de Lula com os dois últimos de FHC). Assim, em janeiro, o governo teve um saldo positivo em suas contas de R$ 11,3 bilhões, mas os juros ficaram R$ em 12,3 bilhões, levando-o a tomar empréstimos no mercado para pagar o que faltou.

Tanto as grandes manifestações anti-globalização/FMI quanto as lutas de resistência dos povos contra a recolonização e contra a ocupação no Iraque demonstram que é possível derrotar o imperialismo e sua instituição financeira principal, o FMI. Para isso é fundamental a luta contra os governos que lhe são subservientes.