Câmara discute reforma política. Foto Agência Brasil
Zé Maria

Metalúrgico e presidente nacional do PSTU.

A proposta aprovada na Comissão da Reforma Política da Câmara, que estabelece a chamada “cláusula de barreira” no sistema eleitoral brasileiro, é o típico caso onde se vende “gato por lebre”. Ela praticamente anula a possibilidade de os pequenos partidos, especialmente os partidos ideológicos como o PSTU, PCB, e mesmo o PSOL, de disputar as eleições. O argumento que se apresenta à população é o de combater o fisiologismo e a bandalheira que vemos todos os dias no Congresso Nacional. Dizem que diminuindo o número de partido isso diminui ou acaba. Conversa fiada.

Em primeiro lugar, porque esta medida vai concentrar ainda mais a representação política naquela casa nas mãos dos mesmos partidos que hoje controlam o Congresso Nacional – o PMDB, PT, PSDB, e outros, que são precisamente os grandes responsáveis por toda essa degradação política e moral que assistimos todos os dias nos noticiários da TV.

O sistema eleitoral brasileiro já é profundamente desigual e antidemocrático. Partidos como o PSTU, PCB, e mesmo o PSOL, tem poucos segundos na TV para apresentar seus candidatos e suas propostas. Isso porque a lei atual, aprovada por estes grandes partidos, reserva a eles quase todo o tempo de TV destinado à campanha eleitoral.

Isso sem falar que as empresas que são donas das redes de TV privilegiam estes grandes partidos apresentando apenas os candidatos deles nos noticiários. Estas duas coisas somadas constituem um ataque não apenas aos direitos dos partidos ideológicos, dos partidos socialistas, de levarem ao conhecimento da população suas candidaturas e propostas, trata-se de um ataque ao direito democrático dos eleitores de conhecerem todas as candidaturas e propostas existentes para, então, escolher soberanamente a que mais lhe agrada.

Ou seja, o sistema que já era antidemocrático, vai ficar ainda pior com a cláusula de barreira. Os partidos ideológicos vão perder os poucos segundos que ainda tem na TV, além de ficarem sem acesso ao fundo partidário. Serão, de fato, atirados na semiclandestinidade. E os grandes partidos vão continuar fazendo a mesma coisa que fazem hoje, só que com mais garantias de que nada novo poderá surgir para ameaçar seu domínio.

Em segundo lugar, a limitação aos pequenos partidos não vai melhorar essa situação lamentável do sistema política atual. Os principais responsáveis pelo fisiologismo, pelas falcatruas que a gente vê os políticos fazendo todos os dias, são os grandes partidos, e não os pequenos. São do PT, PMDB, PSDB, PP, PSD a grande maioria dos políticos que foram pegos com a “boca na botija” pela operação Lava Jato.

São estes partidos que patrocinam as negociatas vendendo seu tempo de TV para esta ou aquela candidatura. O PMDB, maior partido do Congresso Nacional, é o exemplo mais notório disso. Depois de “vender” seu tempo de TV duas vezes para o PSDB, nas eleições que levaram FHC ao governo, passaram a vender o tempo para o PT, nas eleições que levaram Lula e Dilma ao governo. A forma como era feito o pagamento estamos vendo hoje…

Mas, em terceiro lugar, se tomamos a sério a intenção anunciada de acabar com o comércio de tempo de TV entre os partidos, objetivo com o qual temos absoluto acordo, a solução seria outra. Mais simples e sem tirar o direito de ninguém.

Nós reconhecemos que há sim, também entre os partidos pequenos, aqueles que se prestam a esta prática no Congresso e nas campanhas eleitorais. No entanto, a forma de acabar com isso não pode ser a punição de partidos que não tem, em absoluto, esta prática, como o PSTU, por exemplo. Basta tomar as coisas pela sua razão de ser: o tempo de TV é destinado aos partidos para que os mesmos apresentem suas candidaturas e suas propostas à população. Em nosso país, a forma através da qual os partidos levam sua proposta à população é apresentando candidaturas, e pedindo o voto nelas.

Pois bem, se um partido não apresenta candidaturas próprias para um determinado cargo – seja para presidência da República, seja para governador, seja para senador – então ele não terá direito ao tempo de TV. O tempo de TV, então, seria distribuído entre os partidos que apresentarem candidaturas.

Isso não tira o direito de um partido apoiar a candidatura de outro, se isso lhe parecer o melhor a fazer. Ou seja, se um partido quer apoiar outro, por proximidade política, por uma determinada avaliação da conjuntura, etc., poderá perfeitamente fazê-lo. Apenas isso não somaria tempo nenhum à candidatura a ser apoiada, pois, ao não lançar seu próprio candidato, o partido perde o direito a ter tempo na TV. Assim, os acordos efetivamente políticos seriam permitidos. Comércio, não.

Este princípio acabaria com o comércio de tempo de TV, ao mesmo tempo que se manteria o direito assegurado na Constituição Federal aos partidos, de acesso a tempo na TV para apresentar suas candidaturas e propostas à população.

Isso, sem falar que seria de bom tom corrigir a imensa desigualdade existente hoje na distribuição do tempo de TV. É preciso buscar um critério que assegure mais igualdade entre as diversas candidaturas.

Assim, se tomarmos a sério o argumento que se esgrime para apoiar esta medida na (mal) chamada reforma política, as medidas deveriam caminhar em outro sentido. Acima, está uma alternativa concreta.