Dois dos mais influentes homens do governo norte-americano já estão no Brasil. O vice-secretário norte-americano para assuntos políticos, Nicholas Burns (terceiro na hierarquia do Departamento de Estado daquele país) e o secretário-adjunto responsável pela América Latina, Thomas Shannon, desembarcaram por aqui nesta segunda-feira, dia 6 de fevereiro, e devem permanecer até a quinta, dia 8. Nesta quarta, encontram-se com Celso Amorim, ministro de Relações Exteriores.

O objetivo oficial da visita é discutir parcerias no uso de etanol e de biocombustíveis, que poderiam ajudar a reduzir as mudanças climáticas. No entanto, conforme o jornal Valor Econômico de 5 de fevereiro, o governo Bush não tem interesse em reduzir o protecionismo relativo à indústria de álcool em seu país. Um desses mecanismos, por exemplo, é uma tarifa que encarece a importação e foi prorrogada até 2008. Além disso, Bush declarou que o etanol deve ser produzido a partir do milho, como nos EUA, e não a partir da cana, como ocorre no Brasil. Essa postura torna evidente que “negociação” e “parceria” são apenas retóricas na agenda dos representantes de Bush.

De fato, os motivos da viagem são mais amplos do que o debate sobre o etanol. Na verdade, preocupados com a onda de esquerdização na América Latina e pressionados pela oposição democrata e pela opinião pública, os Estados Unidos pretendem traçar uma agenda comum com o Brasil para, a partir daí, recuperar a influência na região. Para isso, um momento decisivo será a reunião entre Lula e Bush, ainda no primeiro semestre de 2007, em Washington, e que deve estar na pauta das conversas dos dois emissários com o governo petista.

O governo Bush necessita restaurar a influência no continente para poder sair da crise em que se afunda. Assim, não é por acaso que a subsecretária para diplomacia pública e assuntos externos, Karen Hughes, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, defendeu uma maior comunicação dos EUA com os países da América Latina.

Os representantes destacaram que 2007 será o “ano do compromisso” dos EUA com a América Latina. Do Brasil, seguem para a Argentina, dando continuidade à busca de apoio no continente sul-americano, que iniciou na Colômbia.

O que se passa na América Latina?
Muito longe do etanol, a principal causa da visita dos EUA ao Brasil está do outro lado do mundo, mais precisamente no Iraque. A ofensiva após o 11 de Setembro levou os EUA a um atoleiro. O país mais poderoso do mundo está em um beco sem saída, cercado pela resistência iraquiana e pelo repúdio da população de seu próprio país com as mortes dos soldados.

Como nada acontece sozinho, a ofensiva de Bush despertou a reação anti-americana no mundo inteiro. Os reflexos na América Latina foram uma série de processos revolucionários – Argentina, Bolívia, Equador, etc. – e a eleição de governos com verniz de esquerda, em especial o de Hugo Chávez, na Venezuela.

Com fortes pronunciamentos contra Bush, Chávez tem ocupado esse espaço à esquerda, sem romper de fato com as bases do capitalismo e sem ter, mesmo que no mais distante horizonte, um projeto de fato socialista, como vem apregoando.

Entretanto, ainda que o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, não represente nem de longe uma ruptura com o imperialismo, é certo que sua popularidade reflete uma expectativa de mudança social do povo latino-americano e uma repulsa ao neoliberalismo. Seu discurso cria expectativas e atrai o apoio de ativistas e de movimentos sociais de todos os países do continente, que não aceitam mais a política de recolonização e de guerra estadunidenses.

Lula, o “procurador” do imperialismo
Os norte-americanos parecem confiantes em conquistar o apoio de Lula em sua empreitada. Burns afirmou, em entrevista coletiva, não temer “que o Brasil siga uma linha venezuelana”. “Não é o que o Brasil e a Argentina têm feito”, disse o vice-secretário, “estes dois países têm seus próprios interesses, vêm comandando discussões no continente e seguem sua própria estrela”.

Burns não está errado quando afirma que não teme uma virada à esquerda do Brasil. Desde o início de seu primeiro mandato, Lula tem se rasgado em elogios a Bush, a quem chegou a chamar de companheiro. A política adotada pelo governo brasileiro é de cooperação ao imperialismo. Lula, por ser o presidente do maior país do continente, pode servir como um extintor de incêndio diante das mobilizações que sacodem a América Latina.

É o que vem fazendo, por exemplo, no Haiti, outro tema que deverá estar na pauta do encontro. De acordo com notícia da Agência Brasil, órgão de imprensa do governo brasileiro, o país poderá permanecer no país caribenho depois de 2008. Em reunião com o embaixador brasileiro, Lula se manifestou favorável a esta idéia.

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