Redação

O protesto de neonazistas na cidade de Charlottesville, estado da Virgínia nos EUA, no último dia 12, mostrou uma ultradireita que começa a colocar a cabeça para fora, assim como a necessidade do enfrentamento às mobilizações desses setores supremacistas.

O primeiro protesto da jornada reacionária intitulada “unite the right” (unir a direita) ocorreu na sexta-feira, 11, de surpresa para evitar uma contraofensiva, e foi uma tentativa de reeditar as marchas da famigerada organização racista Ku Klux Klan, com suas simbólicas tochas acesas que eram utilizadas para aterrorizar e incendiar negros e suas casas. Reunia várias organizações de ultradireita, muitas delas declaradamente nazistas e vários grupos fortemente armado com fuzis e pistolas.

O mote para a marcha foi um protesto contra a retirada da estátua do general sulista Robert E. Lee do parque municipal de Charlottesville. Lee lutou pelo sul escravista durante a guerra civil (1861-1865) e hoje é referência, assim como a bandeira confederada, para os racistas e neonazistas norte-americanos.

Vigília neonazista no dia 11

Aos gritos de “vocês não vão nos substituir”, “vidas brancas importam”, “morte aos antifas” e “Heil Trump” a marcha demonstrou seu caráter racista, anti-imigrante, antissemita e LGBTfóbico. Estudantes da universidade da Virgínia tentaram fazer frente à marcha, mas não conseguiram desarticulá-la.

No sábado, 12, porém, quando o protesto principal estava marcado, ativistas de organizações de esquerda e antirracistas como o Black Lives Matter conseguiram se organizar para se contrapor à mobilização neonazista. Durante os confrontos, um ativista da ultradireita jogou seu carro contra os manifestantes e matou a militante pelos direitos civis Heather Hayer, de 32 anos, deixando ainda mais de 30 feridos.

Apesar disso, os contramanifestantes antifascistas estavam em número bem maior que os neonazistas. Poucas horas após a marcha racista e o assassinato, dezenas de atos se espalharam por diversas regiões dos EUA. Na própria noite de sábado, dezenas saíram às ruas no estado da California contra a mobilização da ultradireita na Virgínia. Ocorreram manifestações em cidades como Oakland, San Francisco, San Diego e Los Angeles.

Manifestantes antifascistas bloqueiam rodovia em Oakland, California

O presidente norte-americano Donald Trump, após ter se silenciado por horas, divulgou um comunicado em que condenou a “flagrante manifestação de ódio, intolerância e violência de muitos lados“, não citando a extrema-direita para não se desgastar com os setores que o apoiaram abertamente durante as eleições, e continuam apoiando agora. A pressão foi tão grande, porém, que nesta segunda, 14, Trump foi obrigado a condenar diretamente os supremacistas e o racismo, numa rápida declaração à imprensa.

O estrago, porém, já havia sido feito. Pesquisa realizada entre sexta-feira e domingo mostra que a popularidade de Trump despencou para 34%, índice extremamente baixo para um presidente no início do mandato.

Polarização social
O protesto da ultradireita norte-americana e a forte reação são resultados da enorme polarização fruto da crise econômica, social e política no coração do imperialismo.

A crise econômica mundial que teve os EUA como epicentro foi enfrentada pela administração Obama, internamente, com uma política que jogou seus efeitos nas costas dos trabalhadores com demissões, desemprego e aumento da pobreza e miséria. Para os bancos e grandes empresas, foram bilhões em ajuda como nunca antes se viu na história do país. Externamente, os EUA aprofundavam a rapina e exploração dos trabalhadores dos países coloniais e semi-coloniais, como o Brasil.

Fato é que, com uma cara humanitária, o governo Obama deu uma saída para os grandes capitalistas às custas dos trabalhadores e da grande maioria da população. Nisso, os setores oprimidos como os negros foram os mais prejudicados. A violência racista durante seu governo, inclusive, não só não diminuiu como explodiu em casos como o de Ferguson, no Missouri, em que o assassinato do adolescente negro Michael Brown pela polícia desatou uma onda de protestos por todo o país.

A improvável eleição de Trump se dá sob essa crise, que pôs em cheque o bipartidarismo ao eleger o populista de ultradireita à revelia da própria direção do Partido Republicano. Tanto o Partido Republicano quanto o Democrata, os tradicionais partidos da burguesia norte-americana, enfrentam um profundo descrédito popular, o que abriu o caminho para Trump e sua retórica reacionária. É a volta da “cara feia” do imperialismo.

O que muitas organizações de esquerda viram como um avassalador avanço da ultradireita e do fascismo é, no entanto, expressão dessa crise e da polarização, como ocorre em tempos de profunda instabilidade. Prova disso é que, antes mesmo de tomar posse, Trump já enfrentava mobilizações de massa só comparáveis aos protestos contra a guerra no Iraque.

O setor da ultradireita que apoiou Trump agora se sente mais à vontade para colocar a cabeça para fora e tentar canalizar o desgaste dos políticos tradicionais e do establishment. A resposta massiva que vem recebendo e o profundo desgaste do governo Trump, no entanto, mostram que a crise avança no centro do imperialismo e que a classe trabalhadora e a maioria da população, longe de refletirem uma onda reacionária, estão contra Trump e os fascistas.

Enfrentar a ultradireita

É urgente uma saída da classe operária e do povo pobre à crise e aos ataques do governo Trump contra os trabalhadores, os negros, imigrantes, mulheres e LGBT’s, e também aos grupos de ultradireita e fascistas. Os setores da ultradireita devem ser enfrentados, com ação direta e autodefesa pelos trabalhadores e suas organizações. O fato de não haver uma onda reacionária no país não exime as organizações de esquerda, de luta pelos direitos civis e democráticas, de derrotarem e esmagarem qualquer ato, protesto ou tentativa de organização dos neonazistas. Para isso, não podem contar com a hipócrita justiça norte-americana e sua polícia que mata negros, mas com suas próprias forças.

O assassinato de Heather Hayer coloca na ordem do dia a necessidade da autodefesa armada frente a esses grupos.