Ônibus e trens lotados, tarifas altas e trabalhadores mal pagos fazem parte da lógica privada de transporte

Os metroviários de São Paulo travam uma dura batalha contra o governo de Geraldo Alckmin (PSDB) numa forte greve que não se via há anos. Os trabalhadores rodoviários da capital paulista, por sua vez, acabaram de protagonizar uma verdadeira rebelião de bases, exigindo melhores salários e condições de trabalho. No Rio de Janeiro, os rodoviários também se mobilizam à revelia de seu sindicato. Em todo o país, os trabalhadores dos transportes vem fazendo greves e manifestações que se enfrentam com os governos e, muitas vezes, com as direções de seus próprios sindicatos.

O que essa onda de greves nos transportes tem a ver com o cotidiano de milhões de trabalhadores país afora? Tanto as péssimas condições do transporte público, com ônibus e trens cada vez mais lotados, quanto os baixos salários de seus trabalhadores são reflexos da lógica privada com a qual esse setor funciona no país.

Transporte público não é visto como um direito da população, mas tão somente um serviço a ser entregue às concessionárias e grandes empresas. Estas, para maximizarem seus lucros, precarizam o serviço e rebaixam os salários de seus funcionários, expondo-os ainda a jornadas de trabalho extenuantes e péssimas condições. Uma das reivindicações dos rodoviários de São Paulo, por exemplo, era a melhoria da cesta básica que, freqüentemente, vinha com comida estragada. As grandes empresas contam ainda com gordos subsídios dos governos que, junto com as altas tarifas, transformam o transporte num lucrativo negócio.

Essas verdadeiras máfias dos transportes retribuem a generosidade dos governos financiando as campanhas eleitorais dos mesmos políticos de sempre, perpetuando seu monopólio sobre o setor.

Transporte é um direito
As companhias públicas de transporte que existiam foram privatizadas nas últimas décadas, como a CMTC (Companhia Municipal de Transportes Coletivos) em São Paulo, vendida pelo então prefeito Paulo Maluf em 1995. Esse processo seguiu o modus operandi das privatizações: primeiro precariza-se o serviço para então passá-lo à iniciativa privada. O resultado são tarifas mais caras, serviços piores e redução de direitos e salários aos funcionários.

No caso do Metrô de São Paulo (Companhia do Metropolitano de São Paulo), apesar de ser uma empresa de capital misto cujo principal acionista ainda é o governo de São Paulo, seu funcionamento segue já uma lógica completamente privada. A tarifa é alta e o serviço cada vez mais precário, com um avanço da privatização, como na Linha Amarela, controlada pela concessionária ViaQuatro.

A falta de investimentos públicos nos últimos anos fez com que o Metrô de São Paulo se tornasse o metrô mais superlotado do mundo, com uma média de 10 milhões de passageiros por quilômetro de linha. Só para se ter uma ideia, em 2013 passaram pelo metrô da capital paulista 1 bilhão e 297 milhões. Ou seja, a população aumenta e cresce o número de passageiros, mas não os investimentos e o número de funcionários. Resultado: metrôs superlotados, panes cada vez mais freqüentes, trabalhadores sobrecarregados com salários defasados.

A corrupção no metrô paulista é, pela proporção do roubo, um caso à parte. Estima-se que as multinacionais Siemens e Alstom, acusadas de formação de cartel, tenham faturado juntas R$ 12,6 bilhões nos contratos com o Metrô até 2008. O Ministério Público acusa de ter passado pelo chamado tucanoduto nada menos que R$ 425 milhões. O escândalo surpreende pelos números superlativos, mas é o que ocorre de forma generalizada em todo o país.

Estatizar é a única solução
Alguns setores do movimento que lutam pela tarifa zero no transporte, como o MPL, ou a sua redução, como o atual pré-candidato do PSOL à presidência, Randolfe Rodrigues, defendem ou admitem que se faça isso através de subsídios do Estado às empresas privadas. No entanto, isso não soluciona a questão do transporte público. Se o aumento de subsídios estatais às empresas pode, num primeiro momento, reduzir a tarifa, ele não vai reverter a precarização do transporte e tampouco melhorar as condições dos trabalhadores. E não impede que essa tarifa aumente de novo, que é o que ocorre. Essa transferência representaria, além disso, um desvio ainda maior do orçamento público para os lucros das grandes empresas.

Não dá para resolver o problema do transporte público no Brasil, em nenhum de seus aspectos, sem inverter essa lógica regida pelo lucro. Isso significa estatizar, sem qualquer indenização, todo o sistema de transporte, revertendo o que hoje vai de lucro às empresas e acionistas, para a melhoria e expansão do serviço à população e das  condições de seus trabalhadores. Estatizar, contudo, sob o controle dos trabalhadores, que é quem conhece de fato os problemas e necessidades da grande maioria da população.

Para reverter a situação precária do transporte e acabar com o caos cotidiano no qual são submetidos milhões de pessoas, é preciso aumentar investimento do Estado. Segundo estudo do Ilaese (Instituto Latino-Americano de Estudos SocioEconômicos), seria necessário investir o equivalente a 2% do PIB em transporte público de massa, como trens e metrôs, para resolver de fato essa situação.

Por fim, o subsídio que hoje vai para os bolsos das grandes empresas, deveria ser revertido para subsidiar as passagens do transporte. Se é possível de imediato reduzir as tarifas atacando os lucros das grandes empresas, esse subsídio estatal poderia cobrir os custos de operação, zerando a passagem.

Investimento público e a estatização do transporte  é, assim, uma luta que deve ser encampada tanto pelos usuários do serviço quanto pelos trabalhadores, como os rodoviários e os funcionários em greve do Metrô.

LEIA MAIS
Seminário discute um programa de luta e socialista para mudar o Brasil