Cartaz de divulgação

Toni Venturi, diretor de “O Velho”, sobre Prestes e “Cabra Cega”, volta com novo filmeO ambiente caótico de um hospital público em greve. As luzes estrobóticas de uma balada rave. Palavras de ordem de uma ocupação urbana. Essas são cenas de uma cidade que, em si mesma, congrega muitos mundos e realidades. Juntá-los numa mesma narrativa foi o desafio do diretor Toni Venturi em seu mais recente longa, “Estamos Juntos”, em cartaz desde o início de junho.

O filme traz a visão do diretor , conhecido com o documentário “O Velho”, sobre São Paulo, pano de fundo e ao mesmo tempo o fio condutor de várias histórias que se entrelaçam, tendo ao centro a protagonista interpretada por Leandra Leal. Carmem é uma jovem médica residente, vinda do interior do Rio de Janeiro e com uma promissora carreira no horizonte. Tem como único amigo um conterrâneo, o DJ Murilo, um jovem gay e playboy interpretado por Cauã Reymond.

Os dois vão encenar uma insólita disputa amorosa pelo jovem músico Juan (Nazareno Casero), um argentino canastrão erradicado na capital paulista. A trama, porém, se complexifica quando Carmem, num trabalho voluntário de prevenção a doenças, se envolve com um movimento de sem-teto (MSTC), quase ao mesmo tempo em que descobre um sério problema de saúde. E assim, camada sobre camada, Venturi desfia uma história sobre a solidão em meio à multidão da metrópole, sobre o medo, e transformações, tantos pessoais como sociais.

Dois mundos
Muitos viram em “Estamos Juntos” uma espécie de amálgama entre dois filmes antecessores de Toni Venturi: “Cabra Cega”, um longa de 2004 sobre o drama de um guerrilheiro na época da ditadura, tendo que se esconder por um longo período num pequeno apartamento (inspirado na história real de Carlos Eugênio Paz, ex-dirigente da ALN). E “Dia de Festa”, documentário produzido no ano seguinte sobre ocupações urbanas em São Paulo. Nesse documentário, Venturi e equipe acompanham o Movimento Sem Teto do Centro em ocupações de prédios abandonados em São Paulo.

Agora, porém, ao invés da claustrofobia do “aparelho” no regime militar, temos a solidão e o isolamento em meio à opressora megalópole. No lugar dos guerrilheiros, ativistas sem-teto, na maioria mulheres, que lutam ao mesmo tempo em que cuidam dos filhos e da família. Sai as forças de repressão do Exército, entra a Tropa de Choque da Polícia Militar.

E se por um lado as atuações de Leandra Leal e, surpreendentemente, Cauã Reymond são notáveis, por outro os sem-tetos e o movimento por moradia não são retratados de forma estereotipada ou preconceituosa. Venturi informa em seu blog que a equipe de filmagem, junto a um grupo de sem-tetos, chegou a ocupar de verdade um prédio abandonado a fim de conferir veracidade às imagens. A polícia apareceu e reprimiu também de verdade, prendendo dois atores.

Alguns críticos torceram o nariz para o que consideraram excesso de tramas e cenários. Como se a história estivesse bem apenas quando circunscrita ao moderno triângulo amoroso, ou, nas palavras de um crítico da Folha de S. Paulo, “sensível, simpático e envolvente“. Porém, continua o mesmo jornalista, “quando adiciona uma dramática invasão de prédio paulistano, peca pelo excesso“.

O “estranhamento” aqui não é difícil de entender. O cara compra um ingresso para ver um típico drama de classe média e dá de cara, no meio do filme, com militantes sem-teto, como que “invadindo” e ocupando o seu espaço e conforto. A entrada do movimento popular em cena, porém, cumpre um papel na trajetória da personagem que nem o trabalho, os amigos, ou a família foram capazes de cumprir.

Mas claro que isso o sujeito da Folha nunca iria entender.

Ficha Técnica
Brasil , 2011 – 111 minutos
Drama
Direção:
Toni Venturi

Roteiro:
Hilton Lacerda

Elenco:
Leandra Leal, Cauã Reymond, Nazareno Casero, Débora Duboc, Dira Paes, Sidney Santiago, Erika Ribeiro, Luiza Micheletti

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