Operários do estaleiro Mauá reunidos em assembleia no dia 10 de julho.
Rodrigo Barrenechea

O Estaleiro Mauá, um dos mais antigos do país, encerra suas atividades sob denúncias de desvio de verbas do governo federal. Fechamento de estaleiros mostra que a crise econômica é muito pior do que diz o governo

Ponta d’Areia, quase 7h da manhã do dia 10 de julho. Aos poucos, os operários vão chegando. Deveria ser para entrar no trabalho. No entanto, o estaleiro EISA-Mauá, um dos mais tradicionais do país, está praticamente de portas fechadas. Há apenas pequenos trabalhos de manutenção das encomendas já iniciadas. Dos 4 mil trabalhadores da empresa, a maioria já foi demitida. Grande parte deles ficou sem receber um centavo desde então.

Nos demitiram sem nenhuma satisfação. Já mandaram a gente assinar e mandaram a gente embora. Temos que brigar até o final, isso não pode ficar impune. porque as contas chegam em casa, nossos filhos têm fome, temos que pagar nossas despesas”, disse Davi Pitbull, operário demitido, à reportagem do Opinião.

Os trabalhadores do estaleiro fazem uma assembleia para definir como vão resistir ao fechamento da empresa. Foi a segunda desde o aviso das demissões. Apesar de ainda haver poucos operários trabalhando, a greve ainda não foi decretada, mas o estaleiro foi ocupado pelos operários no dia 14 de julho.

 

Empresários embolsaram grana 

O que levou a isso? O EISA-Mauá, como outros estaleiros, foi um dos beneficiados pelo pacote de ajuda à indústria naval, há cinco anos, após uma grave crise que quase acabou com o setor (leia ao lado). A solução para a crise passava por pesados investimentos na extração e no transporte de petróleo por meio da Petrobras. O governo Lula, segundo informava uma reportagem do jornal Valor Econômico de 2010, buscava preservar a tecnologia da construção naval. Naquele ano, inaugurou o primeiro petroleiro depois de quase 13 anos. Bilhões de reais foram investidos na reativação do setor.

Com a crise da Petrobras, porém, os empresários desviaram os recursos para outros negócios. No caso do EISA-Mauá, os trabalhadores dizem que o grupo Synergy, do empresário German Efromovich, teria desviado os recursos para a Avianca, empresa do setor aéreo que vem tendo prejuízos com a crise econômica. A Synergy já teria anunciado a venda dos estaleiros do grupo EISA-Mauá. 
 

Operários lutam pelos seus direitos  

Na manhã da mesma sexta, o jornal Extra noticiou que o Sindicato dos Metalúrgicos, ligado à CUT, teria aceitado participar do Programa de Proteção ao Emprego (PPE), criado pelo governo Dilma Rousseff (PT) com recente Medida Provisória. O PPE propõe redução de 30% dos salários com redução proporcional da jornada de trabalho, sendo 15% custeados pelo próprio trabalhador e os outros 15% pagos pelo governo, através do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Na assembleia, o sindicato negou tal adesão, mas limitou-se a buscar que os encargos trabalhistas sejam pagos, colocando a luta pelo emprego em segundo plano.

O PSTU pensa diferente. A luta pelo emprego deve vir primeiro. No dia 10, os trabalhadores foram, mais uma vez para a sede da Transpetro protestar por seu direito a escolher o rumo de suas vidas. Da próxima vez, prometem ocupar o estaleiro, nem que seja passando por cima da direção do seu sindicato.

No entanto, o EISA-Mauá não pode fechar. São 4 mil empregos diretos que estão em risco. Já aos trabalhadores, os verdadeiros capitães desse navio, restou a luta por seus direitos e seus empregos. O estaleiro deve ser estatizado sob controle dos trabalhadores, e toda a contabilidade da empresa deve ser revelada. Quem roubou o salário dos operários precisa pagar por isso. A conta é deles, não nossa.

Não vamos deixar os trabalhadores na mão. A Petrobras precisa quitar o que o estaleiro deve. Quem fez a crise foram o governo e o patrão, não foi o trabalhador”, explicou Aldair Pereira, o China, da Oposição Metalúrgica da CSP-Conlutas. 

 

Saiba Mais

Antes vitrines de Lula e Dilma, agora são abandonados pelo governo 

O anúncio do fechamento do Estaleiro Mauá (ou Eisa Petro Um, seu novo nome), em Niterói (RJ), é uma tragédia na vida de milhares de trabalhadores e de suas famílias. É, também, um duro golpe na indústria naval brasileira e nos empregos na área da indústria no Rio. O estaleiro foi a vitrine para o mundo da capacidade nacional da construção de modernos navios petroleiros. O setor foi reativado com o lançamento do Programa de Modernização e Expansão da Frota (Promef) pela Transpetro. Durante os útimos anos, o presidente Lula e, depois, Dilma não passavam mais de seis meses sem aparecer no estaleiro, vestidos com o uniforme de peão, para lançar algum novo navio que acabava de ser construído.

O programa que reativou o setor era parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e prometia investimentos de R$ 11,2 bilhões para a construção de 49 navios e 20 comboios hidroviários. Com a crise, porém, parte do dinheiro foi desviada pelos empresários do setor para investimento em outros negócios. 

Post author Pedro Villa-Bôas e Rodrigo Barrenechea
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