Foto Agência Brasil
Dyrlei Santos, do Rio de Janeiro (RJ)

Dyrlei Santos, do Rio de Janeiro 

Bastaram algumas poucas horas para o município entrar em “estágio de crise”, medida adotada quando “há previsão de chuva forte, ocasionalmente muito forte nas próximas horas, podendo, inclusive, causar múltiplos alagamentos e deslizamentos, além de transtornos generalizados em uma ou mais regiões da cidade”, de acordo com critérios da própria prefeitura.

Pelo menos 6 mortos e vários feridos; centenas de desabrigados; milhares de pessoas atingidas por alagamentos; desabamentos, enchentes e deslizamentos de terra, quedas de árvores, falta de luz e até vias importantes interditadas.

Infelizmente, a população da cidade do Rio de Janeiro sofreu mais uma vez depois de um temporal. Ao contrário das promessas do então candidato a prefeito Marcelo Crivella (PRB), as autoridades públicas municipais e estaduais não se encontram preparadas para atender as vitimas das tragédias ocasionadas pelas chuvas.

Das seis vítimas fatais, pelo menos duas eram passageiras que estavam dentro de um ônibus que trafegava pela Avenida Niemeyer, em São Conrado (próximo ao Morro do Vidigal), e que foi esmagado pela queda de uma árvore e pelo deslizamento de terra. Ainda no Vidigal, uma terceira pessoa morreu por causa da queda de um muro. Outras duas, mãe e filho, morreram em Barra de Guaratiba, na zona oeste, quando a casa deles desabou. E na comunidade da Rocinha, na zona sul, um deslizamento de terra matou outra mulher.

As autoridades alegam que choveu na Rocinha 165 mm nas últimas 24h, o equivalente a quase o total de chuvas esperado para o mês de fevereiro, que seria de 199 mm. A questão é que temporais como este não são uma novidade para o carioca, desde o período colonial os moradores da cidade sofrem, inclusive contabilizando centenas de mortes em várias ocasiões.

E a razão destas tragédias quase corriqueiras permanece a mesma, a falta de políticas de saneamento e esgotamento públicos que levem em conta o acelerado e intenso processo de urbanização e que atingem duramente e sempre prejudicam mais os trabalhadores e a população mais pobre.

Trabalhadores sofrem com o descaso e o desrespeito dos governos
Para piorar os estragos provocados pela chuva, a população trabalhadora ainda tem de sofrer com o descaso e o desrespeito daqueles que deveriam zelar por suas vidas e melhores condições de vida, como moradia, segurança, saneamento e transporte público.

Enquanto a grande mídia dava destaque aos estragos causados na zona sul e na região da Barra da Tijuca, e aos infortúnios que atingiram condomínios e hotéis de luxo, academias e lojas de emergentes, as autoridades tentavam se eximir de suas responsabilidades perante a opinião pública, dando vergonhosas declarações à imprensa.

O prefeito Marcelo Crivella teve a coragem de afirmar que a cidade havia “passado no teste” e se aproveitou da tragédia para alfinetar a administração anterior, denunciando que nada havia sido feito. Mas o que ele não disse é que desde que assumiu em 2017, também nada fez para que situações como essas fossem evitadas.

Não bastassem ouvir isso do poder municipal, os trabalhadores e trabalhadoras cariocas ainda tiveram de ver o governo estadual recém-empossado jogar a culpa sobre a população e os governos antecessores, como se ele nada tivesse a ver com isso, sendo agora aliado da família Garotinho.

O novo governador, Wilson Witzel (PSC), culpou prefeitos, governadores passados e moradores pelo abandono e pelas ocupações desordenadas. Já o secretário estadual de Defesa Civil, coronel Roberto Robadey, foi além, declarando que os moradores precisavam aprender a conviver com áreas de risco como os japoneses “convivem com tsunami e terremoto”! Um absurdo!

Rápidos em atender a imprensa, nenhum deles nada teve a declarar sobre os graves e permanentes problemas nas coletas de lixo nestas regiões, saneamento e esgotamento públicos e na crise da habitação urbana, que fazem com que a população mais pobre tenha que recorrer a moradias precárias e a viver em áreas de risco.

A culpa é sim dos governantes
Segundo a Defesa Civil, existem cerca de 80 mil famílias em situação de risco no Rio de Janeiro. Dados oficiais apontam 180 comunidades onde há risco de acidentes espalhadas pelo estado. E por conta do temporal de ontem (6), ainda há probabilidade “muito alta” de deslizamentos de terra na zona sul da cidade e “alta” na região da Barra/Jacarepaguá (zona oeste).

O próprio prefeito Crivella e o governador Witzel, dizem reconhecer a gravidade da situação e os perigos enfrentados pela população. Porém nenhum deles, de fato, atua para solucionar os problemas.

Na prática, muitas sirenes de alerta já estão desligadas por falta de recursos ou problemas burocráticos que impedem a renovação de contratos. E as verbas destinadas às ações de prevenção de deslizamentos de terras e enchentes são permanentemente reduzidas.  O simples recolhimento do lixo nos bairros pobres não é feito. As dragagens dos rios e a construção de estrutura de escoamento para as águas pluviais passam longe de ser prioridade.

Só na capital, os investimentos previstos caíram de R$ 850,7 milhões para R$ 475 milhões em 2016 (ainda no governo de Eduardo Paes) e somente R$ 253,3 foram milhões efetivamente aplicados pela prefeitura de Crivella.

Em 2017, dos R$ 662 milhões somente R$ 253,3 milhões (38,26%) foram efetivamente aplicados segundo a própria Secretaria Municipal de Conservação.

E em 2018, Crivella reduziu quase à metade do que seu antecessor já tinha reduzido no ano anterior, com os valores ficando em torno de R$ 135,3 milhões. Uma perda de mais dois terços do orçamento previsto para estas situações em apenas 3 anos.

Não às remoções e a criminalização da pobreza, pelo direito à moradia digna! Exigir um planejamento urbano que atenda nossas necessidades.
Dá para vir com este descaso e com essas desculpas esfarrapadas. Os governos seguem governando para os ricos a serviço da especulação imobiliária e abandonando os trabalhadores e a população mais pobre.

Sabemos que há verbas e projetos populares de infraestrutura para preparar as cidades para a possibilidade de grandes chuvas e, também, tecnologias e medidas, desde as mais simples às mais complexas, para prevenção de desastres naturais; que já deveriam estar em pleno funcionamento e não estão.

Infelizmente, quem paga o preço é o trabalhador, que não pode morar num terreno que ofereça segurança e é empurrado para os piores lugares para se viver nas cidades: encostas e despenhadeiros sem o mínimo de condições de serem habitados, sempre vivendo com a ameaça de serem removidos.

Enquanto isso, mansões e condomínios fechados são construídos invadindo áreas de proteção ambiental e desrespeitando legislações e regras de planejamento ambiental no que diz respeito a saneamento e esgotamento. Para estes, as autoridades fecham os olhos!

Não às obras de fachada para encher os cofres de empreiteiras. É preciso um Plano de obras públicas para evitar novas enchentes e tragédias. É preciso construir e disponibilizar moradias populares em áreas seguras e apropriadas, sem o risco de desabamentos de encostas e residências.

Para isso o PSTU propõe um programa emergencial:

– Executar um plano de obras públicas para prevenir novos deslizamentos, limpeza e canalização de rios e córregos e obras de escoamentos das chuvas.

– Construir de moradias populares com investimento maciço em saneamento básico em quantidade suficiente para combater o déficit habitacional e a especulação imobiliária, garantindo moradias dignas, seguras e gratuitas para os trabalhadores.

– Abrir os hotéis das regiões em que haja desabrigados para acolhê-los enquanto não tiverem uma moradia segura.

– Repudiar a criminalização da pobreza. Os moradores das áreas de risco não são os responsáveis pelos deslizamentos e nem moram em despenhadeiros porque gostam. Com um salário mínimo de fome, é impossível morar em local digno e seguro.

– Que os políticos responsáveis pela aplicação das verbas na prevenção de acidentes naturais, coletas de lixo e saneamento básico que não o fizeram devem ser responsabilizados pela tragédia e presos.