Programas sociais compensatórios não resolvem os problemas estruturais da miséria e servem apenas para ocultar que o governo Lula mantêm o Brasil como um dos campeões da desigualdadeProgramas sociais compensatórios não resolvem os problemas estruturais da miséria e servem apenas para ocultar que o governo Lula mantém o Brasil como um dos campeões da desigualdade.

O governo Lula, em prestação de contas de 2005 e primeiro semestre de 2006 (www.brasil.gov.br), afirma que vem combatendo a pobreza e promovendo a distribuição de renda. O grande balanço apresentado é a redução da miséria em 8%, segundo dados da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostragem Domiciliar), além de informações genéricas de que a riqueza no Brasil estaria se desconcentrando.
O centro das políticas sociais de Lula é o Fome Zero, que chegou a utilizar R$ 27 bilhões desde o início do governo, com 31 ações articuladas. O carro-chefe é o Bolsa Família, programa de distribuição de bolsas para famílias com renda de até R$ 120 por pessoa.

O Bolsa Família já teria atingido cerca de 9 milhões de famílias com a transferência direta de R$ 11 bilhões, ou aproximadamente R$ 1.222 em três anos por família, com valores que variam de R$ 15 a R$ 95. O mais patético é o governo dizer que está cumprindo as metas da ONU para reduzir a pobreza pela metade em 25 anos.

Problemas estruturais
Todas as políticas sociais articuladas pelo Fome Zero têm o mesmo sentido: conceder bolsas ou auxílios incapazes de gerar uma alternativa estrutural de vida para as pessoas envolvidas. Essas políticas também não questionam o abismo da concentração da riqueza e a propriedade privada nas mãos da burguesia. E, o que é pior, a conseqüência de uma família pobre receber bolsa de R$ 50 por filho é criar uma relação de dependência populista com o governo.

Há casos em que a distribuição de bolsas é responsável por mais de 50% da renda circulante dos pequenos municípios do interior envolvidos no projeto, sem possibilitar a criação de empregos plenos ou realizar a reforma agrária, o que seria a saída estrutural para vários municípios do nordeste, por exemplo.
Outro exemplo é o ProUni (Programa Universidade para Todos), que oferece bolsas para alunos de baixa renda nas faculdades privadas e já recebeu a adesão de 1.142 instituições. Sua finalidade é lucrar com a mercantilização da educação, num mercado bilionário extremamente competitivo que já atingiu 70% das matrículas totais dos alunos no Brasil em 2002 – grana certa para os barões do ensino superior privado. Somente no primeiro ano, o ProUni ofereceu 112 mil bolsas, mas o total de vagas oferecidas pelos vestibulares nas universidades federais foi de apenas 122 mil por ano.

Cartilha imperialista
O governo Lula, seguindo as orientações do Banco Mundial, promove políticas sociais compensatórias que não resolvem nem parcialmente os grandes problemas brasileiros. E mais: corrompem a consciência de parcelas expressivas da população pobre, visando as eleições e a compra de voto.

Para avaliar concretamente se o Brasil está avançando na superação dos seus problemas sociais mais urgentes, é preciso avaliar, no mínimo, quatro grandes temas: desemprego, níveis salariais, distribuição de renda e reforma agrária. São temas estruturais na superação dos problemas sociais do Brasil, pois sem uma política de pleno emprego não é possível falar em inclusão social. Sem questionar a extrema desigualdade no campo, esqueceremos cerca de 5 milhões de famílias sem terras e, sem modificar a atual distribuição de renda, não adianta distribuir bolsas, cestas básicas ou vales.

Com relação ao desemprego, não houve nenhuma mudança nos três anos do governo Lula que não esteja vinculada à conjuntura de curto prazo da chamada estabilidade econômica. Desde 1998, o índice de desempregados oscila entre 10% e 12% da população ativa.

Sobre o poder de compra real dos salários, houve inclusive uma queda. Em São Paulo, por exemplo, os assalariados ganhavam, em 1998, em média R$ 1.540. Em 2005, essa média caiu para R$ 1.146, segundo o Dieese. Outro dado importante é que o próprio aumento do salário mínimo para R$ 350 está bem abaixo do salário mínimo de 1980, atualizado – R$ 546. O salário mínimo necessário para se viver dignamente no Brasil hoje está em R$ 1.503.

A respeito da distribuição de renda, há 14 anos 10% da população mais pobre do país possuía apenas 0,8% de toda a renda nacional, e os 10% mais ricos possuíam 45,1%. Em 2003, os 10% mais pobres detinham 0,7% da renda, enquanto os 10% mais ricos abocanhavam 46,1%. Ou seja, nada mudou. Apenas 5 mil famílias controlam 40% de toda a riqueza do país e, somente na cidade de São Paulo, 350 mil famílias vivem sem qualquer remuneração.

Sobre a reforma agrária, é preciso ressaltar que existem cerca de 5 milhões de famílias sem terras num país de absurda concentração de terra. De um total de 3.573.910 propriedades, as pequenas representam apenas 14,7% da área total e as grandes propriedades, 58,1%, segundo o Dieese.

Diante deste quadro herdado da colonização, o governo Lula continua beneficiando os latifundiários e o agronegócio para exportação. O principal programa do Ministério de Desenvolvimento Agrário é o PRONAF que, segundo o governo, teria beneficiado 1 milhão de famílias na política de crédito para os pequenos produtores agrícolas. Ora, para 1 milhão de famílias o governo dedicou apenas R$ 8,8 bilhões no último ano, enquanto na última semana de maio, numa só canetada, Lula assinou um pacote para o agronegócio destinando R$ 60 bilhões de crédito extra para 2006 e 2007, ou seja, sete vezes mais recursos.

Segundo o ex-ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, esse pacote é apenas um paliativo para as grandes medidas estruturadoras que virão no próximo ano (O Estado de S. Paulo, 23/06/06). Mas o volume de crédito para o mesmo setor já havia dobrado nos últimos três anos, chegando a R$ 44,4 bilhões na safra 2005/2006. E os conflitos e assassinatos de sem-terra vêm aumentando ano a ano.

Ainda segundo o IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), entre 1995 e 2005 foram criados 6.574 projetos de reforma agrária que hoje estariam em execução (média de 657 por ano), com assentamento de apenas 551.243 famílias em dez anos, ou cerca de 10% do número de famílias sem terras existentes no Brasil. O governo Lula foi o que menos criou projetos por média anual (321 em 2003, 446 em 2004 e 163 em 2005). Tudo isso à custa da domesticação do MST e de apenas 237 mil famílias assentadas em três anos.

Enquanto o poder de compra dos salários cai, o desemprego estrutural aumenta e a concentração de renda não diminui, pois a propriedade urbana e rural é intocável.

DesconstruIndo a farsa
A origem do presidente Lula e essas pequenas concessões sustentam a farsa do “pai dos pobres”. Lula foi um operário, mas já renegou o seu passado. Hoje governa para os grandes empresários e banqueiros, cuidado com zelo paternal dos seus negócios.

Post author David Cavalcanti, de Recife (PE)
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