Em greve desde o dia 23 de maio, os estudantes da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) mantêm-se firmes na luta pela educação pública, gratuita e de qualidade. Junto conosco nesta luta, os funcionários da Unicamp também estão em greve.

Diante da indisposição da Reitoria em abrir um canal de negociação com os grevistas realizou-se, no último dia 18, uma assembléia com mais de 300 estudantes de graduação e de pós-graduação, na qual se decidiu pela ocupação da Diretoria Acadêmica da Unicamp (DAC). Esta é a segunda vez, no ano de 2007, que a ocupação é utilizada como forma de luta. A primeira ocorreu em março, na reitoria, quando, então, a pauta de reivindicações solicitava: 1) posicionamento claro e incisivo do reitor contra os decretos (nº 51.460, 51.461, 51.471, 51.636 e 51.660) do governador José Serra; 2) ampliação de vagas e reforma urgente de alguns blocos da Moradia Estudantil (ameaçados de desmoronamento), assim como a destituição da coordenadora da Moradia Estudantil; 3) autonomia dos estudantes na organização das eleições para representação discente (RDs) nos órgãos colegiados da universidade e homologação dos representantes eleitos anteriormente.

Alguns avanços foram conquistados na ocasião, como o posicionamento do reitor José Tadeu Jorge contrário aos decretos, o afastamento da professora Kátia Stankato da coordenadoria da Moradia Estudantil e a aprovação, no Conselho Universitário (Consu), da autonomia dos estudantes para eleger seus representantes (RDs). Contudo, algumas questões referentes à Moradia Estudantil não foram cumpridas.

A partir disso desencadeou-se uma luta estadual – com paralisações regulares, piquetes, ocupações e greve na USP, Unesp e Unicamp – pela revogação dos referidos decretos, enfatizando a necessidade de extinguir a Secretaria do Ensino Superior, e pelo aumento do financiamento público para as universidades públicas estaduais. O aparente recuo de José Serra, com o Decreto Declaratório nº 1, de 30/05/07, não foi suficiente para encerrar as mobilizações. Isso se deve aos seguintes aspectos: a) a autonomia universitária não foi garantida; b) a Secretaria de Ensino Superior continua existindo; c) mantém-se a nociva separação entre ensino, pesquisa e extensão, já que as universidades paulistas (Unicamp, Unesp e USP), as Escolas Técnicas Estaduais (Etecs) e Faculdades de Tecnologia (Fatecs), e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) encontram-se subordinadas a diferentes Secretarias do governo estadual.

Nesse sentido é que os estudantes da Unicamp, reunidos na Assembléia do dia 18, decidiram por ocupar a DAC com as seguintes reivindicações:

  • revogação dos decretos do governador José Serra – posicionamento do Reitor da Unicamp, José Tadeu Jorge, perante o Conselho de Reitores das Universidades Estaduais Paulistas (Cruesp), pela revogação dos Decretos nº 51.460, 51.461, 51.471, 51.636 e 51.660, pela extinção da Secretaria de Ensino Superior e pelo re-agrupamento das Universidades Estaduais Paulistas, Fatecs, Etecs e FAPESP numa única secretaria.
  • não às punições – que o reitor da Unicamp se posicione, no Cruesp, contrário às punições de trabalhadores do Sintusp, estudantes da USP e estudantes da Unesp/Araraquara e da Unesp/Presidente Prudente;
  • não à punição de professores, funcionários e estudantes mobilizados na Unicamp;
  • abertura de negociação com a reitoria, Comissão Central de Graduação (CCG) e Comissão Central de Pós-graduação (CCPG), sobre o calendário de reposição das aulas com a garantia da qualidade das mesmas. A negociação deve ocorrer com a presença de estudantes e da Associação dos Docentes da Unicamp (Adunicamp);
  • reconhecimento da greve dos estudantes, sem atribuição de falta aos grevistas.
  • moradia estudantil – exigência de 1500 vagas, com prazo para o início das obras;
  • comprometimento com a alocação dos moradores de casas em obras, sem a diminuição do número atual de vagas na moradia, inclusive no processo seletivo;
  • aceleração do processo de vistoria e reforma das casas da moradia;
  • comprometimento com a não instalação de catracas na moradia estudantil;
  • exigência de prazo para o início das obras da ampliação da moradia.
  • contratação de funcionários e professores – criação de um Grupo de Trabalho (GT) paritário para avaliar a reposição, via concurso público, do número de professores e funcionários em cada unidade da Unicamp, levando em conta o processo de expansão já feito, sem qualidade e marcado pela precarização do trabalho docente e técnico-administrativo, nos últimos dez anos. Este GT deve apresentar os primeiros resultados em 15 (quinze) dias.

    A legitimidade da ocupação da DAC pelos estudantes foi reforçada com a última assembléia geral dos estudantes, ocorrida no dia 21 de junho, que contou com a participação de mais de 1.300 estudantes (de graduação e pós-graduação). Após longo debate, a assembléia decidiu por ampla maioria pela continuidade da ocupação e unanimemente pela manutenção da greve. Decidiu-se também pela manutenção de nossa pauta de reivindicações até que se iniciem as negociações com a reitoria.

    Na ocasião, pareceu-nos clara a necessidade de ampliar o debate sobre os métodos de luta utilizados e, com isso, esclarecer que as ocupações não visam somente obstruir o andamento normal de nosso cotidiano. Não são meios políticos autoritários e violentos, como afirmam alguns. Entendemos, ao contrário, que estes são instrumentos políticos e legítimos de luta dos variados movimentos sociais, uma vez que não lhes é permitido, nos espaços cotidianos, expressar-se e reivindicar seus interesses. O autoritarismo com que as políticas educacionais são implantadas, assim como a inexistência de espaços democráticos de debate e decisão sobre os rumos da universidade, levaram os estudantes da USP, bem como os da Unicamp no início do ano, a optar pela ocupação das respectivas reitorias. Valendo-se do mesmo método, estudantes da Unesp/Araraquara foram vítimas de dupla violência da diretoria: tanto quando esta escolheu por não dialogar, quanto pela truculência da polícia militar que os expulsou de maneira agressiva do local e levou 92 estudantes para a delegacia, com a ameaça de incriminá-los. Não bastasse isso, na tarde do dia 21/06 o campus de Araraquara foi sitiado pela PM, a pedido do diretor da Faculdade de Ciências e Letras, Cláudio Gomide, impedindo qualquer acesso à universidade. Fato este que, na história do Brasil, só encontra paralelo com a ditadura militar.

    Tudo isso, somado à crescente presença da polícia nas universidades, demonstra a forma pela qual o governo e seus representantes acadêmicos respondem às demandas dos movimentos sociais: criminalizando-os. É inadmissível que o mesmo tipo de tratamento seja repetido aqui na Unicamp.

    Desde as primeiras horas da ocupação, a Reitoria vem demonstrando pouca (ou nenhuma) disposição para o diálogo. Em comunicado de 19/06/07, divulgado no site da Unicamp pela Reitoria, afirmava-se que não haveria nenhum tipo de negociação e que, ademais, já havia sido iniciada uma “apuração para identificação dos responsáveis, instalação de processo disciplinar e aplicação das penalidades previstas no Regimento Geral da Universidade, que podem ir da advertência à expulsão”. Ainda no dia 19 de junho, a reitoria solicitou à justiça o pedido de reintegração de posse, ameaçando os estudantes com a inadmissível invasão/repressão policial dentro do campus da Unicamp.

    As ameaças não cessam aí: 21 diretores (dentre o total de 23) de unidades da Unicamp expediram uma carta na qual conclamam !todos os alunos da Universidade (…) para a imediata retomada da normalidade acadêmica”, numa tentativa de pressionar a reitoria e legitimar a invasão policial, algo inédito na história desta instituição.

    Da mesma forma, a reitoria, por deliberação própria, cortou o fornecimento de energia elétrica do Pavilhão Básico (prédio onde está situada a DAC) e também do Ciclo Básico logo nas primeiras horas da ocupação, inviabilizando as aulas e quaisquer atividades nestes prédios. No mais, durante o período noturno, funcionários da segurança da universidade anotavam as placas dos carros estacionados próximos ao prédio da DAC, sob a alegação de que aqueles carros seriam de estudantes que participam da ocupação e que, assim, os mesmos poderiam ser identificados por meio dos registros dos carros.

    Diante de todas as ameaças que sofrem os estudantes neste momento, da intransigência da reitoria em aceitar negociar com os estudantes e suas pautas de reivindicações, reforçamos a nossa expectativa de iniciar, o mais rápido possível, o processo de negociação com a reitoria da Unicamp, por meio da Comissão de negociação, aprovada na última plenária, que dialogará de acordo com as reivindicações antes apresentadas. Ressaltamos, por fim, a nossa preocupação para que não sejam punidos, de nenhuma forma, os estudantes que realizaram e mantêm a ocupação da DAC.

    Campinas, 24 de junho de 2007

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