Empresários apoiadores da ditadura e Delfim Neto
Redação

Por Antonio Fernandes Neto, de Santos (SP)

O golpe de 1964 foi uma articulação sinistra entre empresários e militares. Os maiores afetados foram os trabalhadores, os indígenas, camponeses que lutavam pelo acesso à terra e a população pobre. Os grandes empresários aumentaram seus lucros com a ditadura que impedia os trabalhadores de reivindicar seus direitos. Leia a seguir a entrevista de Elaine Bortone, doutora em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e do Grupo de Trabalho Empresariado e Ditadura no Brasil, que nos contará um pouco mais sobre essa associação sinistra entre empresários e militares.

O Golpe sempre é associado aos militares. Mas sabemos que ele também foi tramado por empresários. Qual foi a participação do setor na preparação do golpe?

Sempre se pensou que o golpe foi construído e dado apenas por militares. Estudos mais ou menos recentes do pesquisador uruguaio René Armand Dreifuss mostram a relação concreta entre militares e empresários, sobretudo o multinacional associado. Desta relação surgiu o Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais (IPES), em 1961, financiado por empresários e empresas, que trabalhou, inicialmente, na desestabilização do governo de João Goulart (1961-1964) e, posteriormente, na construção do golpe de Estado de 1964.

O IPES então foi a oficina do golpe e para tanto recebia contribuição de empresários. Quais empresários contribuíram?

Sim. O IPES com o golpe objetivava implantar o seu projeto de governo, que exaltava a iniciativa privada, menor participação do Estado e livre mercado. Para este projeto, o IPES foi financiado por cerca de 400 empresas nacionais e estrangeiras, por empresários e recebia fundos do governo norte-americano.

Existem provas dessas contribuições?

No Arquivo Nacional e no CEPDOC da Fundação Getúlio Vargas, ambas as instituições no Rio de Janeiro, encontram-se muitos documentos do IPES, tais como atas, boletins, folders, artigos, balancetes contábeis e recibos que provam as contribuições financeiras das empresas e empresários associados.

Os recibos são as provas de contribuição de empresários e empresas para o IPES. Não só os recibos, mas nas atas e balancetes do IPES mostram as contribuições.

Os recibos são as provas de contribuição de empresários e empresas para o IPES. Acima a contribuição da Cia das Docas de Santos (SP).

Você vê indícios de que os empresários tiraram proveito do Golpe de Estado?

Os empresários financiaram o IPES pensando em um novo Estado, como já falei. Um Estado que atendesse aos seus interesses políticos e econômicos, afinal eles financiaram e legitimaram a ditadura. Com a conquista do Estado, em 1964, os ipesianos ocuparam os cargos mais importantes da administração pública no governo Castello Branco determinando, assim, o rumo do Estado. Os empresários, banqueiros e executivos, que defendiam os interesses do empresariado, nos seus cargos públicos criaram uma série de políticas públicas que atendiam diretamente aos seus negócios particulares.

Podemos dizer que houve crimes na ditadura? Se houve, qual os empresários podem ser responsabilizados?

Aconteceram vários crimes. Além de obras faraônicas superfaturadas, empresários financiaram órgãos de repressão destinados aos trabalhadores contrários ao regime, como a Organização Bandeirantes (OBAN), em 1969, o Grupo Permanente de Mobilização Industrial (GPMI), criado em 1964 dentro da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), cujo objetivo oficial seria o de adaptar o parque industrial brasileiro à produção de equipamentos bélicos e empresas que haviam financiado o golpe criaram dentro das suas fábricas espaços de tortura física e psicológica, como hoje temos devidamente provado as torturas cometidas aos trabalhadores pela Volkswagen, Docas de Santos, Fiat, etc.

Seria o caso de reparações? Há processos de reparações?

Com certeza! Vários trabalhadores tiveram suas vidas ceifadas, suas famílias perseguidas, viveram em condições subumanas e precisam ser reparadas pelas empresas e pelo Estado, que tinha a violência como política.