Waldemar Rossi, 69 anos, casado, pai de 5 filhos, metalúrgico aposentado, é militante ativo da Pastoral Operária e participa do Comitê Municipal contra Alca em São Paulo. Rossi orgulha-se em lembrar que tem 47 anos de militância operária. Entre as principais passagens da sua trajetória militante, estão a de fundador da oposição metalúrgica de São Paulo e a participação da fundação da CUT. Rossi esteve no seminário e, nessa entrevista ao Opinião Socialista, fala sobre a crise do capitalismo, os desafios para os trabalhadores e a política eleitoral da direção do PT.

Opinião Socialista — Nós estamos assistindo um agravamento da crise da economia mundial, particularmente nos Estados Unidos, com reflexos aqui no Brasil. Diante desta situação, quais são na sua opinião os desafios para os trabalhadores brasileiros?

Rossi – Minha visão sobre isso tudo é a seguinte: historicamente o modelo de capitalismo industrial, sobre o trabalhão assalariado, chegou ao fim.Ele não responde mais ao que prometeu há 100 anos atrás. Esse modelo não tem mais condições de garantir a inclusão social, o bem-estar social, emprego e salários, enfim, tudo isso dançou.

Ainda que o capitalismo consiga um novo período de crescimento, ele será excludente porque a tecnologia desenvolveu-se demais, o que traz exclusão, menos emprego, pois esse desenvolvimento da tecnologia sob o capitalismo exclui mão-de-obra.

Na minha avaliação o modelo capitalista não pode mais ser referência do trabalho. O desafio é mudar o conceito de trabalho e de luta, que deve assumir diversas formas.

“A ruptura com o capitalismo tem de ser no mundo”

OS – O que significa esse novo conceito? Em que isso implicaria?

Rossi – Implica, em primeiro lugar, em uma necessária ruptura com o capitalismo, particularmente nos países pobres. A ruptura com o capitalismo tem de ser no mundo, as formas podem ser diferentes, porque há diferenças claras entre o capitalismo nos países ricos e nos países pobres. Por exemplo, nos países subdesenvolvidos é preciso priorizar políticas sociais públicas, ou seja, política agrária, habitacional, saúde, educação, meios de transporte, infra-estrutura. Políticas de bem-estar social em relação à carceragem, aos drogados, à mulher e aos idosos. Ao lado disso, necessitaríamos um projeto para o movimento sindical combativo, uma perspectiva de ruptura com o capitalismo implica em construir um pacto social “às avessas” que beneficie o trabalho e que garanta pelo menos a redução da jornada de trabalho para impedir o crescimento do desemprego.

OS – Essas políticas públicas também gerariam empregos de forma mais abrangente que a redução da jornada de trabalho?

Rossi – Sim, claro, só a redução da jornada de trabalho não resolve. Claro que um plano de políticas públicas, construção de mais hospitais, escolas, infra-estrutura etc também vai gerar trabalho Mas quero voltar ao tema do conceito de trabalho, ele tem que ser outro, ampliado, o trabalho social, que gera vida ou recupera vidas também é trabalho. Recuperar presos e dependentes de drogas para a sociedade é gerar trabalho e vida. E isso pela simples razão de que o capitalismo é gerador de morte, exclusão e fome.

Pode não parecer uma linguagem revolucionária, mas é. Afinal, o que são as idéias socialistas senão o resgate da vida plena?

OS – E como você localizaria esse debate de ruptura com o capitalismo dentro do atual debate eleitoral na esquerda brasileira? Gostaríamos que você abordasse esse senso comum que existe em parte da esquerda, de que Lula, na verdade, estaria enganando os inimigos com declarações que não são o que ele vai fazer quando for presidente, como é o caso do pagamento da dívida externa.

Rossi – Essas declarações de Lula são muito infelizes, porque não dá para se ter dois discursos. A direção do PT deveria ter posições definidas. O discurso ambíguo vai contra a credibilidade em boa parte até da nossa base social.

Ele não tem o direito de fazer isso porque um bom programa social não se viabiliza sem a ruptura com o modelo atual, com o FMI, a dívida externa.

Portanto, Lula não tem o direito de dizer que vai ter um programa social mantendo o pagamento da dívida externa, porque isso vai terminar em uma traição histórica ao povo, como já é essa dívida externa, que é ilegítima.

OS – A aliança com o PL não guarda certa coerência com o atual discurso da direção do PT?

Rossi – É a mesma história sobre para quem você vai ser leal. Se o Lula for levar a sério essa aliança não vai sair um governo que preste para os trabalhadores. Se Lula ganhar as eleições e não colocar em prática a ruptura com esse modelo e governar com o capital ele estará enterrando historicamente o papel do PT como um agente de mudanças.

“Se Lula ganhar e não romper com o modelo, estará enterrando o papel do PT como agente de mudanças“

OS – Esse fim do papel histórico do PT colocaria para a esquerda brasileira o debate de perseguir uma nova alternativa política, um novo partido?

Rossi – Sem dúvida, a busca de um instrumento político alternativo, de luta, vai estar colocado na discussão de todo o movimento social diante dessa renúncia da direção do PT em cumprir um papel de agente transformador. Essa questão estará colocada, pois ninguém engana todo mundo o tempo todo e se o caminho da direção majoritária do PT prevalecer, ficará explícito que vamos precisar de outro instrumento.

OS – Por fim, você esteve presente no seminário de programa organizado para discutir o programa de uma candidatura socialista. Você gostaria de fazer alguma consideração sobre a iniciativa do PSTU de ter uma candidatura própria?

Rossi – Gostaria de reafirmar o que já disse antes, a atitude é coerente e corajosa. Os companheiros que lançaram uma candidatura na esquerda, além do Lula, sabem que ela não é alternativa em termos de peso popular nas eleições. Para mim, ela tem o mérito de ser um sinal de protesto a esse rumo imposto pela direção do PT, de apostar em construir uma política alternativa e de contribuir para o desenvolvimento de uma consciência crítica.


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