Raquel de Paulo, candidata à Prefeitura de São José dos Campos (SP)
Redação

As eleições funcionam como uma espécie de espelho distorcido da realidade e da luta de classes. São um terreno no qual a força real e coletiva da classe trabalhadora e dos setores populares e oprimidos organizados e mobilizados contra o capital é menor, reduz-se ou se dissolve na ação individual do voto, à mercê do poder econômico, da manipulação da mídia e do controle bilionário dos capitalistas. Isso não significa que os resultados não sejam importantes, porque, mesmo que de forma distorcida, as eleições refletem a realidade, de certa maneira, e incidem sobre ela. Contudo, não têm dez por cento da importância da luta e da ação direta da nossa classe, único caminho que pode levar a mudanças profundas e à esperança de uma nova sociedade.

O que o primeiro turno expressou

O que mais chama a atenção no primeiro turno das eleições municipais é o índice de abstenção, o maior das últimas duas décadas. A média foi de 23,14%, mas foi muito maior em grandes centros como São Paulo e Rio de Janeiro. Na capital paulista, a abstenção  chegou a 2,6 milhões, quase 30%, aproximando-se da soma dos votos em Bruno Covas (PSDB) e Guilherme Boulos (PSOL).  Com os nulos e brancos, chega a 45,27%. Se o efeito da pandemia é parte da realidade que deve ter impactado esse número, a tendência dos últimos anos indica não ser um fenômeno isolado, expressando também um desgaste da democracia burguesa. Em 2016, por exemplo, a abstenção no país foi de 17,6%; em 2012, de 16,9%.

Russomano derreteu na etapa final

Junto com isso, o primeiro turno teve como principal derrotado o presidente Bolsonaro. Dois terços dos seus candidatos tiveram resultados pífios, com destaque para o bolsonarista recém-convertido, Celso Russomano (Republicanos), em São Paulo, que sofreu uma queda surpreendente, indo dos 30% das primeiras pesquisas para apenas 10% dos votos contabilizados. Até mesmo o filho de Bolsonaro, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos), eleito o mais bem votado no Rio de Janeiro em 2016, com 106 mil votos, viu sua votação despencar para 71 mil.

A derrota fragorosa do presidente foi tão desmoralizante que, nas vésperas da votação, Bolsonaro apagou um post nas redes sociais indicando votos em seus candidatos.

Fragmentação eleitoral

Do ponto de vista eleitoral, o centrão e as siglas tradicionais da direita ocupam o espaço deixado pelo refluxo da onda bolsonarista de 2018. O DEM ganhou três capitais. PSDB e PSD contam com duas cada. Já o MDB está na disputa em sete capitais em que vai ocorrer no segundo turno. Confirma-se, assim, o quadro de fragmentação da direita e da ultradireita diante do desgaste do bolsonarismo, com os candidatos tentando desassociar-se do presidente.

Já do ponto de vista da esquerda parlamentar, se o PT observa uma relativa recuperação nas cidades médias, se comparado com 2016, sofreu uma grande derrota política nas capitais. Disputa apenas duas, Recife e Vitória, contra sete nas eleições anteriores. Se por um lado angariou mais votos em termos absolutos, sai das eleições com o signo da derrocada provocada pelos resultados nas principais capitais, sobretudo em São Paulo. O partido perde a hegemonia que tinha em relação à esquerda de conciliação de classes e inclusive perante siglas diretamente burguesas, como PDT, PSB e outras que gravitaram no seu entorno.

O espaço deixado pelo PT vem sendo ocupado eleitoralmente em parte, e principalmente, pelo PSOL, que está na disputa pelo segundo turno em Belém (PA) e São Paulo (SP). Além disso, a votação proporcional em várias cidades avançou. Mais uma vez, a capital paulista é exemplo desse processo, com Guilherme Boulos ocupando o mesmo nicho eleitoral de Haddad em 2018 e, aparentemente, sendo beneficiado pelo alto índice de abstenção concentrado no eleitorado de candidatos como Covas e Russomano.

O PSOL sai fortalecido deste primeiro turno ao ocupar o espaço deixado pelo PT, na mesma medida em que avança em seu processo de adaptação, fazendo acenos ao empresariado e a partidos como PSB e PDT, reproduzindo um programa e um projeto de conciliação de classes.

PSTU defende o socialismo e a revolução

Preta Lu, candidata a vereadora em São Luís (MA)

Embora as eleições sejam terreno da burguesia, os revolucionários, de maneira geral, não podem furtar-se a participar delas ou abster-se de intervir no processo eleitoral para apresentar um projeto socialista, revolucionário e de independência de classe, buscando construir essa alternativa. É preciso intervir para denunciar as candidaturas e os projetos da burguesia e também os projetos de colaboração de classes e reformistas. Estes privilegiam a ação institucional e a defesa da democracia dos ricos e do sistema capitalista contra o avanço da consciência, da luta e da organização independente da classe trabalhadora.

Nesse sentido, a campanha dos revolucionários não deve guiar-se de forma prioritária pela obtenção de votos ou mandatos. Se for assim, sacrificará o principal: o programa e o objetivo de construir uma alternativa e uma organização revolucionária, transformando-se numa esquerda eleitoral nos limites do sistema.

Campanha do PSTU em Belém (PA)

Isso não quer dizer que não seja importante obter votos. Pelo contrário. O PSTU lutou para ter o máximo de votos possível no marco da defesa do seu programa, sem abrir mão das suas ideias, dentro das limitações impostas pelo poder econômico e das restrições democráticas.

Porém, essa não é a medida principal para avaliar a campanha eleitoral dos revolucionários. A medida principal para definir a campanha é a apresentação correta do programa pela a organização revolucionária e o avanço quanto a sua organização, implantação e construção.

Campanha da candidata Julia Eid na Zona Sul de SP

Em 55 cidades do país, o PSTU apresentou candidaturas e realizou uma campanha vitoriosa, defendendo uma alternativa da classe trabalhadora, operária socialista e revolucionária diante da crise do capitalismo. Reunindo operários, trabalhadores e setores marginalizados e oprimidos a nossa classe, o PSTU mobilizou alguns milhares de ativistas pelo país defendendo um programa de classe e socialista.

Com o maior índice entre os partidos, 61% das candidaturas foram encabeçadas por negros e negras. O partido cumpriu o papel fundamental de levantar a bandeira do socialismo num momento em que a oposição parlamentar defende a democracia burguesa como projeto e limite e defende um programa para governar e administrar o capitalismo em crise. Foi uma campanha realizada na periferia, nas fábricas e nas ocupações, bem como junto a trabalhadores da saúde, de transportes e tantos outros.

Esta foi a primeira eleição na qual o PSTU foi totalmente excluído do horário eleitoral na televisão, resultado das regras cada vez mais antidemocráticas, e vetado da grande maioria dos debates. Juntando isso à abissal desigualdade da distribuição do fundo eleitoral e as doações milionárias que irrigaram as demais candidaturas, o partido enfrentou uma situação de quase semilegalidade na prática.

Patrícia Ramos, candidata à Prefeitura de Mariana (MG)

Tal situação não melindrou a militância e os ativistas, que fizeram uma campanha aguerrida, “na unha”, aproximando novos ativistas e divulgando um programa e uma estratégia revolucionária. Milhares de militantes e ativistas se moveram na campanha por essa alternativa. O PSTU, apesar de uma baixa votação, sai da campanha fortalecido, com a militância orgulhosa de fazer parte da luta em defesa do socialismo num momento em que o sistema capitalista oferece apenas a barbárie aos trabalhadores e ao povo pobre.

Campanha eleitoral do PSTU em São José dos Campos (SP)

Organizar a luta e a resistência

Terminadas as eleições, tanto Bolsonaro quanto os demais governos e o Congresso virão para cima da nossa classe com um projeto de guerra social, semiescravidão e entrega do país. Reforma administrativa, privatizações e reforma trabalhista são alguns dos ataques que esperam para ser despejados. O fim do auxílio emergencial, por sua vez, vai aprofundar a pobreza e a miséria. O objetivo é consolidar um novo grau de superexploração e de colonização à custa da já sofrida condição de vida da classe trabalhadora e da maioria do povo.

A necessidade e o projeto de construir uma alternativa revolucionária e socialista continua nas lutas. Esse é o nosso terreno, o terreno da classe trabalhadora, de onde podem vir as mudanças que precisamos e a construção e o fortalecimento da nossa auto-organização para construir um governo socialista dos trabalhadores que governe por conselhos populares.

A tarefa imediata e fundamental colocada para a classe neste momento é aumentar a organização e a resistência aos ataques, assim como uma perspectiva de superação do capitalismo, ou seja, da construção de uma alternativa revolucionária e socialista. Uma alternativa que não repita a velha conciliação de classes e de governo em aliança com a burguesia, mas que coloque a necessidade de que os trabalhadores e o povo pobre, negro e oprimido governem.

Nos próximos dias, o PSTU definirá seu posicionamento no segundo turno de várias cidades, onde defenderá voto crítico e onde chamará voto nulo.

A você que nos acompanhou nesta batalha, deixamos um convite especial para conhecer o partido e caminhar conosco na luta para mudar o Brasil e o mundo, rumo a uma sociedade socialista, sem exploração e sem qualquer tipo de opressão.

Protesto em Brasília no dia 24 de maio. Foto Romerito Pontes