A mobilização organizada pelo Sindicato resultou na liberação do trabalho para cerca de 30 mil trabalhadores
Ana Cristina, de São José dos Campos (SP)

Ana Cristina, de São José dos Campos (SP)

Nas últimas semanas, em meio às notícias sobre o agravamento dos efeitos da pandemia causada pelo coronavírus no país, o clima de preocupação e medo tomou conta dos trabalhadores nas fábricas. Não é para menos. Afinal, de um lado, ouviam das autoridades sanitárias de todo o mundo a orientação de isolamento social para prevenir o coronavírus. No dia a dia, porém, suas vidas seguiam como sempre, aglomerados nas fábricas e no transporte público.

De forma muito tímida, apenas as maiores empresas colocaram trabalhadores do grupo de risco em home office ou em licença e tomaram algumas medidas de prevenção como a disponibilização do álcool em gel. Mas a maioria nada fez. Depois de um dia de trabalho, operários e operárias voltavam para suas casas com medo de terem se contaminado e de transmitirem para a família.

É diante desse cenário que o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e Região (SP), filiado à CSP-Conlutas, de forma inédita, deu início a uma mobilização da categoria que resultou na liberação do trabalho para cerca de 30 mil trabalhadores.

Depois de protocolar pedidos de licença-remunerada desde o início do mês passado e não obter retorno por parte das empresas, a entidade publicou um decreto de greve geral no dia 22 de março. “É uma medida em defesa da vida dos trabalhadores”, resumiu o presidente do sindicato numa live em rede social naquele domingo.

Não somos bucha de canhão

As recomendações sanitárias para impedir a disseminação do coronavírus são claras: isolamento social. Mas governos têm defendido essa medida de forma totalmente seletiva. Nas fábricas, onde existe uma grande concentração de trabalhadores, eles não tomam nenhuma medida. Pelo contrário, Doria, por exemplo, ao anunciar a quarentena no estado, destacou que as indústrias teriam de continuar funcionando. Bolsonaro fala que a economia não pode parar. Ou seja, querem deixar os trabalhadores à própria sorte e nos usar como bucha de canhão”, denunciou o presidente do Sindicato Weller Gonçalves.

Já estávamos recebendo muitas mensagens dos trabalhadores, que inclusive diziam que havia disposição para parar”, disse Weller. “Respeitando as medidas preventivas contra o coronavírus, sem aglomerações, fomos para as fábricas, com um ou dois diretores e o carro de som, e a resposta foi a adesão da maioria, que se mobilizou de alguma forma, entrando em greve, paralisando por algumas horas, aumentando a pressão”, relatou.

Comprando a briga

O que vimos foi que a maioria da categoria comprou a briga e foi à luta”, definiu o dirigente. A mobilização atingiu 45 empresas da base e fez com que grandes empresas, como a Embraer, anunciassem licença-remunerada para a maioria dos funcionários ou antecipassem a dispensa, como na GM. Avibras, Hitachi, MWL, Domex e outras dezenas de fábricas também acabaram liberando os funcionários.

Weller também relata que o descaso de Bolsonaro diante da pandemia e as medidas contra os direitos que estão sendo tomadas pelo governo estão caindo como bomba entre os trabalhadores. “Estamos vendo um forte rechaço dos metalúrgicos, mesmo entre aqueles que votaram em Bolsonaro”, relata.

O lucro não pode estar acima da vida

A posição da entidade é que é preciso estabelecer quarentena geral em todas as fábricas que não produzam itens essenciais até que haja o controle da pandemia. “Nem tudo o que se produz hoje no capitalismo é essencial. A economia não vai parar se carros ou itens de luxo deixarem de ser produzidos. O lucro não pode estar acima da vida”, disse.

Neste momento é preciso manter a fabricação de produtos como medicamentos, equipamentos hospitalares, alimentos e serviços essenciais, com todas as condições de segurança e sob controle dos trabalhadores. De resto, tudo deve parar, e as empresas e governos têm o dever de ter responsabilidade social e garantir salários, direitos e empregos”, defendeu.

Cobrando responsabilidade

O sindicato também protocolou uma carta nas prefeituras e todos os municípios de sua base territorial, cobrando medidas para defender a vida dos trabalhadores e assistência à população mais pobre.

Weller afirma que é preciso que todas as centrais sindicais do país organizem suas bases e decretem greve geral para defender a vida da classe trabalhadora.

Despertar nas fábricas

Precisamos nos unir e lutar contra a irresponsabilidade do governo Bolsonaro e suas medidas. Com o agravamento da crise, eles virão para cima dos trabalhadores com demissões e retiradas de direitos. Temos de derrotar esse governo e pôr para fora Bolsonaro, Mourão e Guedes”, defendeu.

Nas fábricas, estamos vendo um despertar. Os trabalhadores estão com muitas dúvidas e por isso temos feito um debate que não é apenas sindical. Começa a cair a máscara do capitalismo e precisamos denunciar este sistema. Mostrar aos trabalhadores que este sistema só nos levará à barbárie. É hora de falar de socialismo”, afirmou o metalúrgico.