No sábado, dia 30 de julho, ocorreu a primeira edição do PSTU DEBATES, com a participação de mais de oitenta pessoas. Trata-se de uma iniciativa do PSTU Porto Alegre (RS). O projeto consiste na promoção de um ciclo de debates para propiciar formação vinculada a assuntos estratégicos para a esquerda.

A sua primeira edição, realizada na sede do sindicato de professores estaduais (CPERS), foi sobre “a conjuntura das opressões frente ao governo Dilma”. A atividade foi organizada pelas três secretarias do partido que travam a luta contra opressões: de glbt´s, de negras e negros, e de mulheres. Os painelistas apresentaram dados, abordaram a realidade vivenciada por esses setores, a atuação do governo Dilma, a situação dos movimentos e as alternativas necessárias para superar os problemas de opressão. O evento contou também com uma intervenção especial tratando da realidade dos portadores de deficiência na classe trabalhadora.

Os três painelistas coincidiram com o diagnóstico de que há um aumento nos problemas de opressão, e de que isso se combina com um processo de cooptação dos movimentos pelo governo. A violência e a discriminação no mercado de trabalho são problemas comuns vivenciados pelos setores oprimidos. Todos concordaram com a idéia de que a opressão serve como forma de intensificar a exploração de parte dos trabalhadores.

Lisiane Storniol iniciou o debate abordando a situação dos glbt´s (gays, lesbicas, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros). Militante da Secretaria Regional de GLBT´s do PSTU, ela citou que o aumento da participação nas “paradas gays”, nos últimos oito anos, coincide com o aumento no índice de assassinato de homossexuais. “Não podemos aceitar que o Brasil continue sendo ao mesmo tempo recordista em participação nas paradas LGBT, e ao mesmo tempo recordista de assassinatos de homossexuais impunes” denuncia Storniol. A painelista levantou a preocupação com o caráter comercial que essas passeatas assumiram, abandonando a postura de enfrentamento que havia nas décadas de 60 e 70.

Ela também falou sobre o papel do governo Dilma, que, desde a campanha eleitoral, se mantem refém de setores conservadores religiosos. Prova disso, foi o abandono do projeto de “kit anti-homofobia”. O propósito, na época, era chegar a um acordo com a bancada evangêlica do Congresso Nacional e evitar uma investigação do então Ministro Palocci. Ela aproveitou para destacar a importancia de grupos de glbt´s que surgiram como expressão de uma ruptura com o governo, como o Desobedeça, no RS, e a Secretaria Nacional da CSP – Conlutas (Central Sindical e Popular – Coordenação Nacional de Lutas). Estes movimentos organizam juntos, em Porto Alegre, a “mini parada” e tem uma postura de cobrança frente ao governo. Storniol defendeu a luta pela aprovação imediata do projeto de lei 622, que criminaliza a homofobia, e a necessidade de que haja formação nas escolas para evitar a descriminação. A situação de negras e negros foi abordada por Mateus Gomes, da Secretaria Nacional que trata do assunto no partido. Ele apresentou estudos que mostram uma diferença acentuada entre o IDH (índice de desenvolvimento humano) da população negra e o da população branca. Com a crise, as negras e os negros são as principais vítimas dos cortes nos serviços públicos.

Gomes falou sobre a influência do governo Dilma e da figura de Obama no movimento negro. O discurso da “igualdade racial”, adotado pela presidenta, passou a incidir num movimento que, até a década de 90, tinha consciência da desigualdade. Segundo Gomes, a cooperação do governo fez que o movimento negro perdesse o forte protagonismo social que tinha naquela época. A cooptação dos movimentos levou a um retrocesso. O Estatuto da Igualdade Racial, aprovado pelo Congresso Nacional, não garante a titulação dos quilombos e nem a adoção de quotas nas universidades, principais bandeiras do movimento. Mateus defendeu o Quilombo Raça e Classe, coletivo de luta anti-opressão que está sendo construído dentro da CSP-Conlutas. A política internacional de Dilma também foi abordada. Mateus denunciou o governo brasileiro por ocupar com seu exército o Haití, país de população negra. O objetivo dessa ação é garantir uma maior dominação e exploração a serviço das multinacionais. Ele cita que o Brasil também adota o papel de sub-metrópole na Africa, com investimentos que visam obter lucros do continente negro.

Representando a Secretaria Nacional de Mulheres do partido, Ana Pagamunici começou sua fala citando o alto índice de assassinato de mulheres no Brasil. “Desde que se iniciou esta atividade, há trinta minutos, setenta e cinco mulheres foram agredidas no país” afirmou. Ela também apontou que, segundo as estatísticas, nas duas horas de duração daquele debate, possivelmente uma ou duas mulheres seriam assassinadas no Brasil devido à violência machista. Pagamunici citou dados mostrando que as mulheres, mesmo ocupando a maioria dos empregos de nível superior e a minoria dos sem nível superior, tem salário até 30% menor que o dos homens para a mesma função. Ela também citou o exemplo do trabalho doméstico, que detém 98% de mão de obra feminina e é a única profissão que não tem regulamentação de direitos trabalhistas como jornada de trabalho e hora extra.

O fato de que, pela primeira vez, o país conta com uma presidenta não significou uma mudança política ou uma melhoria na situação das mulheres. Pagamunici aponta que não se pode tratar o problema da mulher dissociado da classe social. “Nosso país é dividido em dois tipos de mulheres, as mulheres da burguesia e as da classe trabalhadora, e é para as mulheres da classe trabalhadora que o nosso partido e os movimentos em que nós estamos atuam”, disse Pagamunici. Ela também falou sobre a cooptação de movimentos feministas como a Marcha Mundial de Mulheres, que provoca um retrocesso na consciência das mulheres. Para Pagamunici, é importante organizar a luta independente das mulheres dentro dos sindicatos, mas também devemos prestar atenção a outros movimentos alternativos que surgem ainda sem uma compreensão mais política: como a “Marcha da Liberdade”, a “Marcha da Maconha” e a “Marcha das Vadias”. Ela chamou a atenção para a importância das secretarias de mulheres do PSTU, e do seu papel para fomentar a formação.

A painelista também criticou os principais programas do governo para a mulher. Para ela, o projeto da rede cegonha vê a mulher apenas como reprodutora. Ele paga o taxi para as gestantes se deslocarem aos hospitais, mas remaneja recursos antes alocados para o atendimento à saúde da mulher de forma integral. A principal dificuldade para as mulheres conseguirem emprego no Brasil, segundo o DIEESE, é a falta de creches. Hoje, só 12% das crianças tem acesso a creches públicas. O projeto do governo nessa área não contempla nem a metade da demanda reprimida. A ampliação da licença maternidade não é um direito para todas as mulheres, mas só existe como benefício previdenciário nas grandes empresas do Programa Empresa Cidadã.

A maior parte das mulheres trabalha nas pequenas empresas, que não tem direito a esse benefício. A atividade também contou com a contribuição de Maíra que expôs, pela primeira vez num debate do partido, a situação dos portadores de deficiência. Maíra, portadora de deficiência visual e militante do partido, disse que a incidência de algum tipo de deficiência é maior no proletariado, devido a acidentes de trabalho e â dificuldade para o tratamento ou para a prevenção nas famílias dessa classe . Chamou a atenção para a dificuldade que é ser deficiente e morar em bairro de periferia, que praticamente impossibilita o livre deslocamento. Ela também aproveitou para criticar a abordagem da mídia e falou da dificuldade de inserção no mercado de trabalho. Maíra defendeu escolas exclusivas para deficientes auditivos. Terminou sua fala falando da importância de ter conseguido aprovar, no último Congresso da ANEL (Assembléia Nacional de Estudantes – Livre), um programa para os deficientes.

No fechamento do debate, Gomes aproveitou para recomendar a leitura da Revista Raça e Classe, da Revista da Juventude do PSTU e das matérias sobre o assunto no site do partido. Storniol ressaltou a importância de estar podendo construir uma alternativa à esquerda do governo de Frente Popular. Pagamunici disse que gritar com uma companheira ou contar piada machista é a mesma coisa que falar pela voz do patrão. No transcorrer do debate, todos enfocaram a questão das opressões como um problema do conjunto da classe trabalhadora. Para os painelistas, a segmentação é social, e a opressão é algo funcional para o sistema capitalista, pois ajuda a burguesia a explorar e dominar mais intensamente a classe trabalhadora. Nesse sentido, a tônica do debate foi encarar a luta contra a opressão como parte indissolúvel da luta contra o capitalismo.

A proposta da regional Porto Alegre é dar seqüência ao Projeto PSTU DEBATE, com um ciclo de palestras abordando temáticas conjunturais e estratégicas diversas. O objetivo é revitalizar a prática do debate e combater o retrocesso na consciência provocado palos governos de Frente Popular, fazendo avançar a postura classista.