Cem mil pessoas estão em Porto Alegre. No fórum oficial, ONGs, intelectuais e representantes da social-democracia discutem a “humanização” do capitalismo. Mas há outro fórum, que se manifestará nas marchas contra a Alca e a guerra de Bush e que promoverá seminários e oficinas socialistas, como os da revista Marxismo vivo

A estrela do Fórum neste ano é o presidente do Brasil, Lula. Grande parte dos presentes certamente acredita que isto confirmará as teses da humanização do capitalismo. Para Ignácio Ramonet, do Le Monde Diplo-matique, a eleição de Lula é o sinal de um novo ciclo histórico para a América Latina, que deixará no passado o neoliberalismo.
No entanto, Lula vai dar uma passada em Porto Alegre, e seguirá para Davos, na Suíça. Lula vai a Davos porque já se comprometeu com o FMI em aderir à ALCA e a dar seguimento às reformas neoliberais de FHC.
Esta é a lógica da direção do Fórum Social Mundial: debater interminavelmente propostas de humanização do capitalismo mas, quando um dos seus representantes chega ao poder, implementa os mesmos planos neoliberais que criticava.

Cidadania ou luta de classes?

Uma das ideologias do Fórum oficial é a “cidadania”. Dezenas de intelectuais se esforçam em demonstrar que a conquista da cidadania é o horizonte do possível. Esta idéia foi progressiva nas revoluções burguesas européias ocorridas entre os séculos XVII e XIX.
No atual período de decadência do capitalismo, esta ideologia tem um conteúdo reacionário, ao igualar os “cidadãos” proprietários dos meios de produção com os “cidadãos” proletários, ou seja, donos apenas da sua força de trabalho.
Por isso, não acreditamos que existirá um Brasil para todos os “cidadãos”. O país continuará sendo com Lula propriedade dos cidadãos banqueiros, industriais e latifundiários, até que os “cidadãos” operários tomem o poder e iniciem a reconstrução socialista da sociedade.

Economia capitalista solidária?

Outra proposta difundida no Fórum oficial é a de uma “economia solidária”. Segundo esta proposta, a alternativa à globalização seria a generalização de associações autogestionárias, cooperativas, organizações de consumo ético, bancos do povo, grupos de compras solidárias, movimentos de boicote, cozinhas comunitárias, etc.
Uma economia apoiada em pequenas empresas não passa de uma utopia reacionária, que ignora a tendência do capitalismo à concentração da produção nas mãos das mega-corporações privadas. Não por acaso, nada se fala sobre os grandes bancos, as grandes empresas automobilísticas, químicas, petroleiras, agropecuárias, etc.
Ou se enfrenta o monopólio das multinacionais, expropriando estas empresas, ou não será possível nenhuma medida séria em favor dos trabalhadores e da maioria.

Estado burguês contra o capital?

Outra das teorias mais divulgadas é apoiada por intelectuais como Susan George, Ignacio Ramonet e Tony Negri. Trata-se da autonomia das multinacionais e da perda de poder dos Estados.
Segundo o informe oficial do 2º Fórum : “Os conferencistas destacaram, ainda, que o capitalismo financeiro não precisa mais do Estado Nacional e nem de suas instituições democráticas.” E concluíram que: “A democracia exercida com eficácia desarma o capital. A autoridade do povo e que dele emana, é o único instrumento eficaz na luta contra a globalização.”
Antes, estes intelectuais diziam que o Estado burguês poderia ser transformado a serviço da maioria, sem necessidade de uma revolução. Agora afirmam que, por si só, o Estado “desde que com um regime democrático” seria uma contraposição ao capital.
No entanto, a “democracia” imperialista norte-americana está impondo a Alca, prepara a guerra contra o Iraque e ataca as liberdades de seu povo utilizando-se da desculpa do combate ao terrorismo.
Por outro lado, o Orçamento Participativo de Porto Alegre só opina sobre 10% das verbas, e está subordinado à Câmara de vereadores e à prefeitura. Mas nem isso resiste ao teste da verdade no governo Lula, que não cogita estender o “Orçamento Participativo” de Porto Alegre para o governo federal.

Paz com a ONU ou luta contra a guerra de Bush?

Numa época de guerras, como a nova agressão militar de Bush contra o Iraque, é natural que os trabalhadores e o povo desejem e defendam a paz. O eixo oficial do Fórum neste ano é a defesa da paz mundial.
A direção do Fórum entende a paz como a defesa dos planos da ONU, que nada mais é do que um ponto de apoio para a política de guerra dos EUA. Ao forjarem mais “provas”, os inspetores da ONU cumpriram um papel decisivo para justificar a invasão do Iraque.
Por outro lado, a paz no Oriente Médio não se conseguirá sem a derrota de Israel. A defesa da Intifada palestina é a única saída contra a paz dos cemitérios israelenses.
Para nós, a verdadeira defesa da paz é a luta contra a guerra de Bush, que contará com o apoio da ONU. Também devemos exigir uma posição clara de Lula, que, pela imprensa, se comprometeu a apoiar a invasão de Iraque, “desde que a ONU a autorizasse”.

Outro Fórum é possível

Mas existe também outro Fórum em Porto Alegre. O avanço da luta anti-imperialista na América Latina e no mundo abre espaço e está se impondo sem pedir licença.
A campanha contra a ALCA, por exemplo, foi lançada no Fórum passado. Agora, haverá uma nova marcha no dia 27, assim como seminários e oficinas sobre o tema.
Mas as expectativas no governo Lula, especialmente do MST, podem limitar a campanha. Não é hora de qualquer vacilação: a campanha do abaixo-assinado deve ser lançada no Fórum, com todo o peso.
Seminários e oficinas que buscarão refletir o ponto de vista do marxismo revolucionário, no ciclo “Um mundo socialista é possível”, organizado pela revista Marxismo Vivo e apoiado pelo PSTU e a Liga Internacional dos Trabalhadores – Quarta Internacional.
Post author Eduardo Almeida Neto,
pela direção nacional do PSTU
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