Publicamos abaixo a primeira parte de um artigo de polêmica com as teses do MES. Na próxima edição publicaremos a parte finalO aniversário dos 160 anos da publicação do Manifesto Comunista e dos 70 anos da IV Internacional abre espaço a uma discussão muito útil para os ativistas das lutas de todo o país. É necessário assumir o debate estratégico, de longo prazo, e escapar das discussões apenas táticas e conjunturais. Militamos não só pela vitória de uma greve ou de uma eleição sindical, mas pela revolução socialista. Por isso, os debates estratégicos, teóricos e programáticos, são absolutamente essenciais.

Nesse momento, uma das discussões mais importantes na América Latina é a interpretação marxista dos governos Chávez, Evo Morales e Rafael Correa. Mas como eles, ao contrário de Lula, têm alguns atritos com o imperialismo, conseguem a simpatia de muitos ativistas.

O MES, corrente do PSOL, que recentemente rompeu com a Conlutas apóia o governo Chávez. Um dos motivos centrais para essa ruptura foi exatamente o fato de esses setores querem o atrelamento da Conlutas a Chávez.

O MES tenta justificar esse apoio ao presidente venezuelano em nome de Marx, Lenin, Trotsky e Moreno (trotskista argentino, fundador da LIT), como fez recentemente em seu documento “A atualidade do socialismo e as tarefas dos revolucionários”, publicado em sua página na internet.

Isso coloca o MES em uma clara postura revisionista. Como se sabe, o revisionismo é uma forma de assumir posições reformistas sem dizer isso com clareza, encobrindo a realidade com reivindicações de Marx e Lênin.

Segundo o MES, suas elaborações são “atualizações” das posições desses marxistas. Para nós, trata-se de posições opostas, idênticas às velhas posições stalinistas, disfarçadas de maneira bem pouco séria.
 
Revolução permanente ou “etapismo” stalinista?  
A maior contribuição teórica de Trotsky ao entendimento do processo revolucionário foi sua teoria da revolução permanente. Segundo ela, as tarefas democráticas e antiimperialistas não resolvidas pela burguesia são partes da revolução socialista. O outro componente da teoria da revolução permanente é sua compreensão de que a revolução começa no plano nacional. Mas, se não se estender a nível internacional, tenderá a retroceder.

Já o stalinismo ficou conhecido pela teoria da “revolução por etapas”, que defende uma “etapa” antiimperialista ou democrática. Nesta fase, deve-se apoiar um governo burguês progressista, e depois, algum dia, num futuro remoto, virá a revolução socialista.

O MES reivindica formalmente a revolução permanente, mas na prática defende a posição stalinista das etapas.

“Também nos diferenciamos dos que podemos chamar como socialistas dogmáticos ou propagandistas, que sob a caracterização de que a burguesia não pode cumprir as tarefas, dizem que o que está colocado é a luta dos trabalhadores pelas reivindicações socialistas.” “Não acreditamos que o central seja a expropriação da burguesia e a crítica de Chávez pelo que não faz, ainda que seja importante dizê-lo, pois explica, em parte, a burocratização. É um contexto mundial diferente ao que havia quando Cuba, onde a direção não era dos trabalhadores e socialista, avançou rumo à expropriação. Não se repete, entre outras coisas, porque não há hoje o Bloco Soviético. Por isso, a exigência fundamental ao chavismo é – junto à luta contra a burocratização – que tome medidas para resolver os problemas do povo e a defesa do país frente ao imperialismo que segue com sua política reacionária contra Venezuela.”

Ou seja, para o MES não é possível hoje a luta pelo socialismo na Venezuela, como defendem os “sectários”. O que está ao alcance das mãos é a luta antiimperialista, democrática (contra a burocratização), por medidas mínimas (resolver os problemas do povo). Agora, na etapa antiimperialista, não se deve colocar uma estratégia socialista.

A tese do MES segue: “A revolução é permanente no sentido de que, se não avança, retrocede, mas isso pode ocorrer num processo prolongado, às vezes mais prolongado do que se pensava, dependendo dos fatores que intervêm no processo”.

Ou seja, a compreensão teórica da revolução permanente é substituída pela visão rebaixada do senso comum (“o que não avança, retrocede”). E tudo se reduz a luta contra o imperialismo, porque a etapa é “mais prolongada” do que se pensava.

Programa de Transição ou programa mínimo stalinista
Não se trata de uma aplicação somente ao processo venezuelano. Em matéria recente, Roberto Robaina, um dos máximos dirigentes do MES, afirmou sobre o programa para a revolução brasileira: “Mas aos riscos do oportunismo somam-se os desvios do sectarismo e do esquerdismo. Nesse sentido, há dois erros graves que não podem ser cometidos: primeiro, a idéia de que o programa da revolução brasileira é necessariamente diretamente socialista; segundo, a negação de uma política de aliança entre classes, como se a mera afirmação dos interesses da classe operária fosse suficiente em uma estratégia revolucionária”.

Depois, segue: “embora seja impossível, hoje, saber em que momento da revolução as tarefas econômicas e sociais diretamente socialistas, em particular a expropriação do grande capital, estariam postas na ordem do dia”.

Essa é exatamente a postura do stalinismo e da social-democracia: separar o “programa mínimo” (que está na consciência das massas), deixando o “programa máximo” (as reivindicações socialistas) para declarações nos dias de festa, para algum dia indefinido.

O Programa de Transição, a conclusão programática da teoria da revolução permanente, parte da idéia oposta. A mobilização por questões que estão no nível de consciência das massas, pode e deve levar ao enfrentamento com o governo, o regime e o Estado burgueses. Essas reivindicações devem ser associadas, na mobilização, a outras palavras-de-ordem transitórias que se choquem com a dominação capitalista. Por exemplo, numa luta por reajustes salariais, devemos questionar a política econômica do governo, fazer agitação política pela ruptura com o imperialismo e contra a exploração capitalista, apontando para a necessidade de um novo poder.

Post author
Publication Date