Por volta das 21 horas os trabalhos foram retomados com um painel sobre a situação política na América-Latina. São quatro os palestrantes: Ahmed Shawki (EUA), Didier Dominique (Haiti), Miguel Sorans (Argentina) e Valério Arcary (Brasil).

Ahmed resgatou a importância das lutas dos trabalhadores norte-americanos nos séculos anteriores e ressaltou o período de retrocesso das lutas nos últimos 30 anos, para dizer que a eleição de Barak Obama está trazendo uma ilusão que, quando dissipada, pode se transformar em lutas.

Didier explicou como a entrada de produtos estrangeiros (açúcar, café, arroz e outros) destruiram a economia agrícola haitiana, provocando desemprego, miséria e migração descontrolada no país.

Valério Arcary (Brasil)
Professor do Cefet de São Paulo, Valério Arcary, iniciou sua palestra dizendo que o I Congresso da Conlutas teve um impacto sobre as trajetórias de cada um dos ativistas. “Essa reorganização pode melhorar qualitativamente a luta de classes no país”, disse.

Ele lembrou das grandes mobilizações dos últimos 30 anos, como as que iniciaram a derrubada da ditadura, depois o Fora Collor e as no final dos anos 1990. “Agora, pela 1ª vez, abriu se a oportunidade de uma dimensão histórica, desde 1968, pois naquele tempo, os núcleos revolucionários eram menores”, afirmou.

Para Valério, os tempos mudaram, pois ativistas estão rompendo com seus dirigentes: “isso não acontece todos os dias, isso permite mudanças políticas”. Arcary diz que as greves e manifestações deixam lembranças nas cabeças dos trabalhadores, e nesse espaço é onde novas direções podem ser forjadas.

Ele lembrou também que há uma crise econômica, no mundo e a lição da história é que nessas crises o sistema fica mais vulnerável, mas a burguesia tentará fazer com que os trabalhadores paguem as contas. “Essa será a hora de se medir forças”, afirmou.

Arcary abordou, por fim, que a construção de uma oposição de esquerda é central para um drama histórico que pode se repetir, pois com o enfrentamento que se avizinha a disputa pelo poder pode estar colocada na ordem do dia. E os militantes revolucionários correm os riscos de dois erros: o sectarismo e o oportunismo. O último, em sua opinião, exerce muito mais pressão sobre todos os ativistas.

Depois de falar sobre a situação na Venezuela, onde, para ele, não há independência em relação ao imperialismo e nem à burguesia, Arcary concluiu dizendo que se construir uma organização de esquerda não é fácil, “mas esse deve ser o nosso objetivo”.

Miguel Sorans (Argentina)
Militante socialista há muitos anos, Miguel Sorans começou dizendo que se vive, na América – Latina, uma série de lutas contra os EUA. Para ele, essa situação começou em dezembro de 2001, na Argentina, nas manifestações que ficaram conhecidas como “Argentinazo”. Contudo, segundo Sorans, em outros países houve processos semelhantes como na Bolívia e Equador.

Ele considera que a tentativa de golpe contra o governo de Hugo Chaves na Venezuela é importante e que, naquela ocasião, o imperialismo foi derrotado pelas massas venezuelanas: “Isso criou um período de re-nacionalização, ainda que elas sejam parciais e sejam feitas por um nacionalismo burguês”, afirmou.

Para o militante, a não implementação da Área de Livre Comércio na América Latina (ALCA) em todo o continente mostra que o imperialismo está na defensiva, no entanto, também houve vitórias como os TLCs e as vitórias na Colômbia.

Além dos ascensos revolucionários, o palestrante considera a revolução antiburocrática um outro fenômeno político importante. Ele comentou que a eleição de governos de frente popular é resultado da mobilização das massas, que foram para a “esquerda”. Isso acontece “pois as massas ainda não têm uma direção revolucionária”, afirmou.

Segundo Sorans, existem diferenças entre Lula e Tabaré Vazques (Uruguai), e também entre Hugo Chavez e Evo Morales. “Não estamos de acordo com Morales, não acreditamos no fascismo da Meia Lua, precisamos apoiar as mobilizações para exigir de Evo que se avance na expropriação”, disse.

Ele afirmou ainda que as expropriações não são novas na história da América Latina, e que a grande maioria delas as empresas foram indenizadas. “Nossa palavra central na Venezuela deve ser a estatização completa, sem indenização e com 100% de controle operário”.

Sorans concluiu afirmando que se deve seguir com o tema que une esse encontro (ELAC). Para ele, as manifestações e as lutas irão fazer surgir uma nova direção: “essa é a chance de mudança do futuro para que não percamos a oportunidade”.

Didier Dominique (Haiti)
Didier Dominique é um dos dirigentes do Batay Ouvriye e iniciou seus 20 minutos de palestra contando um pouco sobre a história da ilha caribenha e o que acontece por lá.

“Precisamos entender que depois da segunda guerra, a indústria têxtil não conseguiu se mecanizar, fabricante de roupas, tênis e de bolas esportivas – de futebol, vôlei e beisebol – conhecida com a indústria da agulha”, disse.

Segundo Didier, a não modernização dessa indústria a manteve em constante deslocamento para que pudesse obter lucros onde a mão-de-obra fosse mais barata. “Primeiro foi para o México, depois para a América Central, Caribe, África e China”.

Esta iniciativa estava presente num documento elaborado em 1970 por uma equipe de Ronald Reagan (então presidente americano). O documento indicava que o Caribe devia se transformar numa plataforma de produção barata. A partir daí, de acordo com Didier, houve uma grande desestrutura do mundo rural: “antes o Haiti exportava açúcar e agora o importa, as indústrias compraram as fábricas para fechá-las, com o arroz foi a mesma coisa”.

Para entender porque aconteceu isso no Haiti, Didier diz que é preciso ver que o colonialismo extremo chegou à ilha 200 anos depois das colônias normais. “Por isso a revolução dos escravos foi a única vitoriosa no mundo. O povo armado expulsou 160 mil homens de Napoleão”, disse.

Os países que pegaram armas, dinheiro e homens do Haiti aceitaram o embargo proposto pelos EUA. Depois disso, a França cobrou uma dívida de mais de 60% de toda a produção da ilha por ano. “Vivemos muitos golpes de estado. Em 1915, por exemplo, os americanos vieram e ficaram por 19 anos”, afirmou.

O dirigente ainda lembrou das dificuldades das táticas sindicais no país, pois elas devem ser clandestinas. “Isso nos deixa numa miséria obrigatória, a miséria é parte dessa lógica, pois parece que a zona franca é uma ajuda”, enfatizou.

Para Didier, a intervenção militar representa os interesses dos capitalistas naquela região: “O filho do vice-presidente brasileiro vai negociar como explorar a mão-de-obra haitiana que é a mais barata da América Latina”.

Apesar de tudo, Didier afirma que diante de tanta miséria as massas se levantam rapidamente e é por isso existe a intervenção militar. “Até as manifestações estão sendo proibidas” , concluiu.

Ahmed Shawki (EUA)
Ahmed Shawki começou a sua palestra falando sobre os turistas preferem que visitar o Brasil no calor e em Betim está um pouco frio, mas que está com muito calor interno desde o I Congresso da Conlutas.

Segundo Ahmed é preciso resgatar a história do movimento operário americano, como o 1º de maio, o 8 de março e as mobilizações de 1968. Mas também lembrou que todas as mudanças no mundo do trabalho começaram nos EUA. “A idéia de que não existe movimento operário nos EUA é uma mentira”, afirmou.

O militante americano, a expansão da economia nos Estados Unidos desde 1990 foi baseada na exploração da classe operária em todo mundo, e foi possível devido ao poder militar do país.

Segundo Ahmed a recessão, que já tem efeitos no mundo todo, vai aumentar nos próximos meses. “Ela está muito ligada com o preço do petróleo, isso está mudando a economia doméstica do EUA, o preço do milho triplicou nos últimos meses, começou nos EUA e se espalhou pelo mundo”, disse.

Ele comenta que essas mudanças têm repercussão importante sobre a luta de classes: “nos EUA as greves estão a acontecendo em todo canto do país, mas querem aumentos salariais de mais de 100%, eles estão entrando e ganhando. É o nascimento de novo mundo”.

Ele abordou as próximas eleições norte-americanas, resgatando o que disse o palestrante suíço Charles Dry, em painel no congresso da Conlutas. “Devia existir uma Conlutas na China, na África e nos EUA”. Segundo Ahmed, as ilusões em Obama produzirão na nossa classe situações interessantes. Uma conjuntura que pode ir da direita para esquerda. “Ou seja, aqueles que confiam em Obama estarão nas lutas até 2011, isto está claro para todos”. Mas Ahmed acredita que não será um processo fácil, mas vale a pena apostar neste processo. Por isso também a importância da solidariedade internacional dos trabalhadores.