Juan Parodi, estudante universitário em Sevilha

Juventude do PSTU entrevista Juan Parodi, estudante da Universidade de Sevilha e membro da Corriente Roja, sobre a greve geral da educação na Espanha.No Brasil, estamos vivendo a Greve Nacional da Educação. Os professores já paralisaram quase 50 Instituições Federais de Ensino Superior (IFES), entre universidades e institutos. Em mais de 30 IFES já existe greve estudantil e os funcionários técnico-administrativos tem indicativo de greve para o dia 11 de junho. Os professores e funcionários lutam não só por melhores salários e um novo plano de carreira, mas também contra as péssimas condições de trabalho impostas pelo Reuni.

Este é um projeto que representa um ataque à educação pública brasileira, que coloca para as nossas universidades a tarefa de fábricas de diploma sem qualidade. Bem ao estilo do que é recomendado pelos organismos do imperialismo para a educação dos países periféricos. O que ocorre é que sem o aumento suficiente de verbas públicas para investimento em estrutura física e contratação de professores, esse processo provocou uma situação, na maioria das IFES, de salas de aula lotadas, falta de professores, cursos sem prédios e uma infinidade de problemas que desqualificam enormemente o ensino no país.

A presidenta Dilma quer que a sociedade brasileira escolha entre uma universidade elitista ou precarizada, tentando vender a desqualificação do ensino superior público do país na forma de expansão de vagas. Por isso, o governo federal continua investimento menos de 5% do PIB em educação e repassando dinheiro público para o ensino privado através da isenção fiscal, enquanto gasta 49% do orçamento federal com o pagamento da dívida pública aos banqueiros. Além disso, Dilma já cortou quase 2 bilhões da educação só neste ano. É contra esse descaso que os estudantes brasileiros se mobilizam ao lado dos professores e funcionários. Depois de cinco anos da aplicação do ReUni, o balanço é greve!

Infelizmente, o descaso com a educação não é uma realidade apenas do Brasil. Na Europa, a maioria dos governos está atacando, através dos famosos planos de austeridade, os direitos sociais da classe trabalhadora e da juventude, a fim de despejar nas costas do povo as consequências da crise econômica mundial. Os serviços públicos estão na mira das burguesias europeias e a educação é o principal alvo, especialmente na Espanha. O governo espanhol de Rajoy cortou 3 bilhões da educação pública no início deste ano. No Estado espanhol, esse ataque também teve a resposta dos estudantes, dos professores e funcionários, com uma grande greve geral da educação, que unificou o movimento desde a educação infantil até o ensino superior.

Com o objetivo de compartilhar a experiência dos lutadores espanhóis com os estudantes em greve do Brasil, a Juventude do PSTU entrevistou Juan Parodi, estudante de Ciências Naturais da Universidade de Sevilha e membro de Corriente Roja, sobre a greve geral da educação na Espanha.

Juventude do PSTU Conte-nos como está a greve geral da educação no Estado Espanhol? Quais são as reivindicações dessa greve e quais setores estão em luta?
Juan Parodi Greve geral teve apenas no último dia 22 de maio. Foram convocados da educação infantil à universidade, todos os trabalhadores da educação praticamente e a totalidade dos sindicatos. A partir desta convocatória, o movimento estudantil se aliou e aumentou ainda mais a mobilização. Em Sevilha, por exemplo, os estudantes aprovaram de forma massiva (com 95% a favor) continuar a greve.

Todo este processo acontece como contestação aos cortes na educação aprovados pelo governo Rajoy. Esses recortes se expressam na demissão de professores, no aumento das taxas, na diminuição das bolsas. Quantificando os cortes, chegam a 62% nas universidades e 21% nos outros níveis da educação. Estas porcentagens dão dimensão à gravidade do ataque. Temos universidades que estão ameaçadas de desaparecimento, o ministro disse que 90% delas deveriam fechar.

A greve foi um êxito. Especialmente nas universidades, onde o movimento estudantil se fortaleceu com a sua participação. Os sindicatos contabilizaram a adesão de em media 80%, chegando a 95% nas universidades. As mobilizações foram muito grandes. Na minha cidade, Sevilha, com 700.000 habitantes, 60.000 pessoas saíram as ruas. A partir desse dia, os estudantes das universidades sevilhanas entraram em greve. Foi ocupada a reitoria da Universidad Hispalense, foi realizada uma assembleia geral com 2000 pessoas para definir um plano de lutas. Durante esse tempo, foram realizados protestos de maneira continua: aulas foram dadas na rua, com a participação de 120 professores, foi realizado outro ato com 8000 estudantes, foram realizadas intervenções artísticas nas principais estátuas da cidade para chamar atenção publica sobre a nossa luta, também fechamos uma rodovia em Sevilha. Outros lugares da Espanha também seguiram o nosso exemplo, com ocupações em outras cidades.

Agora, a greve terminou em uma das universidades e está na última semana em outra. Temos que fazer um balanço com o conjunto dos estudantes sobre o significado da greve. Os reitores se posicionaram contra o ministro da educação como forma de protesto pelos cortes. O governo da Andaluzia apontou para os sindicatos, estivemos na primeira pagina dos jornais durante dias. Acho que é possível, frente à situação de mobilização social que se dá na Espanha e à debilidade do governo, derrubar os cortes e também Mariano Rajoy. O movimento estudantil está consciente da força que temos, nas manifestações cantávamos “Mariano, não chega ao verão!”.

Quais são as formas de organização que os estudantes, os professores e os trabalhadores da educação utilizaram em sua luta?
O movimento estudantil e de professores é bastante diverso. Na universidade, elegemos uma delegação central. Os delegados centrais foram os que convocaram a greve continua e se posicionaram através da luta. Também tiveram sindicatos ou associações estudantis que participaram destas delegações e que atuaram diretamente nos passos da universidade. Os professores se organizam nos sindicatos, estes são de várias tendências, os mais combativos nos acompanharam na greve. Os que defendem o pacto com o governo se mobilizaram apenas no dia 22, na greve geral. Também existem plataformas que agrupam professores em defesa da educação publica sem se importar com a afiliação sindical. Por fim, todos esses setores se sentaram em uma mesa comum em defesa da educação pública na qual se decidiram medidas unitárias de luta. Nesta coordenação puderam participar todos os setores que defendem a educação publica.

No caso específico da nossa greve, o centro se converteu na assembleia geral da ocupação da reitoria. Ali, se traçam as principais linhas de luta e se tomam as principais decisões. Cada pessoa participa dessa assembleia em pé de igualdade, os diversos setores e tendências sindicais ou políticas se expressam e defendem sua postura na assembleia. Essas reuniões se mantiveram com uma grande participação, apesar dos esforços de uma greve de tanta duração, sempre tivemos entre 1000 e 2000 pessoas.

Como os ataques que o governo Rajoy está desferindo contra a educação se ligam aos planos de austeridade aplicados por muitos governos europeus?
Os ataques dos quais estamos falando são simplesmente os reflexos no sistema educativo dos planos de austeridades mais gerais. Estes planos afetam todos os serviços públicos, não só a educação. Por exemplo, o último plano anunciado pelo governo recortava 3 bilhões de euros na educação e 7 bilhões na saúde pública.

Esses planos de austeridade tentam cortar todos os gastos públicos com um duplo objetivo. Por um lado, focar todo o gasto público em pagar a dívida que o Estado tem com os bancos. O problema é o que esta dívida criou quando o Estado resgatou com o dinheiro público os bancos que estavam falindo. Hoje, 3% do PIB se destinam apenas ao pagamento dos juros dessa dívida. O segundo objetivo é privatizar a educação e convertê-la em um negócio para os capitalistas. Ajustam-se perfeitamente aos planos que expliquei anteriormente, de aproximação mais geral de todos os serviços públicos, de privatizações e subidas de preços, aplicados pelo governo, a UE e o FMI.

Essa greve geral da educação pode ser vista como parte do movimento “Indignados” da juventude europeia?
Sim e não. Sim, porque a atual onda de lutas no Estado Espanhol se iniciou com o movimento dos “indignados”, e isso se refletiu na nossa greve. Refletiu-se nos métodos de organização e luta dos estudantes e nas aproximações politicas em geral, que em parte se inspiraram no movimento dos indignados. E não, porque a greve se dá em um âmbito puramente estudantil, com base nas organizações estudantis, com uma greve fora das praças e com o objetivo concreto de barrar os ataques do governo. Nesse sentido, não há relação direta. Dentro disso, há setores que são mais influenciados pelo movimento dos indignados que outros. Entre os estudantes, a influência é maior que entre os professores, que têm organizações e métodos mais assentados.

Eu diria que mais que no movimento indignado concretamente, a greve é influenciada pela situação de ascenso generalizado de lutas que se dá. E dentro deste ascenso, há o movimento dos indignados. Também tiveram greves gerais. Agora há ocupações de terra pelos sem-terra e de imóveis pelos sem-teto. Os mineiros fecham estradas e enfrentam a repressão, as trabalhadoras da saúde permanecem diariamente nas portas dos hospitais. Não há dia que não tenham várias lutas acontecendo. Isso se combina com o descrédito dos políticos oficiais e das instituições do Estado. O exemplo mais claro é o do rei da Espanha que foi apanhado por casualidade quando caçava elefantes na África, gastando milhões e agora na greve estudantil se pede a instauração da República.

Desde o Brasil, estamos acompanhando a situação política na Europa, que é marcada, por um lado, por duros ataques à educação e aos direitos sociais da classe trabalhadora e da juventude e, por outro, por uma grande resistência de todo o povo europeu, com greves gerais, marchas e ocupações de praça. Podemos ver essa realidade no Estado Espanhol, em Portugal e, principalmente, na Grécia. Por parte da juventude europeia, há um grande sentimento de insatisfação e uma enorme esperança de mudança dessa situação. Em sua opinião, qual é a saída para essa realidade? Ou seja, a luta dos indignados europeus precisa assumir qual projeto de transformação?
Começando pela educação, a única saída satisfatória para nós começa por deixa de pagar a dívida aos bancos e manter os serviços públicos, como uma educação pública de qualidade. Isso também permitiria contratar muitos funcionários públicos e combater o desemprego. Essa medida hoje dificilmente seria assumida pelo governo. O capitalismo espanhol está à beira da quebra e assumir medidas como essa seria um golpe mortal para eles. Isso significa duas coisas: a primeira é que as medidas propostas devem ser anticapitalistas, e a segunda é que é necessário que a luta estudantil seja parte integrante da luta do povo trabalhador, para poder questionar o mesmo governo.

Essas medidas que unificam estudantes e trabalhadores se resumem em um plano de resgate do povo trabalhador frente ao plano burguês de resgate dos banqueiros. Além do que disse, este plano deveria incluir a nacionalização dos bancos, com planos, como por exemplo, da adaptação ecológica dos sistemas de transporte, agricultura e produção de energia, abertura dos imóveis fechados pelas construtoras, bancos e imobiliárias, a redução da jornada de trabalho sem redução dos salários para acabar com o desemprego. Além disso, é necessário acabar com a repressão aos que lutam e derrubar a falsa democracia na qual um rei nomeado pelo ditador Franco é chefe do exército.

Esse conjunto de medidas, para mim, se chama socialismo. Um sistema econômico controlado pela classe trabalhadora e pelo povo, de maneira realmente democrática e direta para cobrir as necessidades sociais. É necessário defender esse projeto, já que enquanto os capitalistas se mantiverem no controle só vão se preocupar em nos explorar mais. Não há possibilidade de terceiras vias. Como dizia Rosa Luxemburgo, o nosso dilema é socialismo ou barbárie!