Dogville, o mundo cão

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Yara Fernandes Souza, da redação

Mais que uma ousadia na forma cinematográfica, mais que uma crítica à “era Bush”, Dogville, o novo filme do diretor dinamarquense Lars Von Trier, é uma metáfora da sociedade capitalista, de suas instituições e de sua hipocrisia.

Em cartaz em poucos cinemas, mas em breve nas locadoras, é imperdível. As primeiras cenas já produzem um choque na platéia: o filme se passa num palco sem cenários; casas e ruas da fictícia cidade de Dogville são apenas insinuadas por desenhos de fita crepe no chão e poucos objetos são colocados para identificar cômodos. Essa forma estranha, que elimina as paredes, apresenta a vila onde Grace (Nicole Kidman) vai parar, fugindo da polícia e de gângsteres. Ninguém sabe o motivo de sua fuga, nem seu passado.

Nesta vila, vivem figuras humanas simbólicas que a princípio são amáveis com a estrangeira, mas, em poucos dias, transformam essa amabilidade em exploração, exigindo, em troca do favor de escondê-la, que Grace trabalhe mais por menos dinheiro. Da exploração do trabalho da estrangeira, os habitantes partem para sua opressão como mulher em uma impactante cena de estupro. O filme ainda apresenta metáforas de muitos elementos da sociedade, desmascarando-os. O “mocinho” Tom (Paul Bettany) é a melhor representação do Estado. Numa vila sem nenhuma instituição formal, ele controla todos, sutilmente. Os comerciantes da são expostos em sua ganância. Uma família, com mãe, pai e sete filhos descortina as mazelas das relações familiares e da educação. A Igreja possui um sino que conta o ritmo da cidade, mas não tem padre.

A família, a Igreja, a Justiça, o Estado, os bandidos, tudo é alvo de crítica. A principal metáfora é a própria cidade. A falta de paredes demonstra a maior das verdades: toda a sordidez é exposta, mas todo mundo finge que não vê.
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