O financiamento da campanha do PSOL em Porto Alegre pela Gerdau detonou uma crise que só faz crescer. Essa grande empresa, hoje multinacional, doou R$ 100 mil à campanha de Luciana Genro à prefeitura. A direção municipal do PSOL, com maioria da corrente MES (a mesma de Luciana), votou pela aceitação da “doação” e a defende abertamente.

Não estamos diante de um pequeno erro, mas de um fato que pode marcar uma tendência no PSOL, de dependência financeira das grandes empresas.
Felizmente abriu-se uma polêmica pública, que inclui outras correntes do PSOL contrárias (como o candidato à Prefeitura do Rio de Janeiro, Chico Alencar), assim como nós do PSTU.

Mas outro fato de enorme gravidade veio se somar ao primeiro. Como o programa eleitoral de TV do PSTU em Porto Alegre criticou o financiamento da Gerdau, o PSOL recorreu à Justiça e conseguiu em tempo recorde a suspensão do programa no mesmo dia. Até hoje não conhecíamos nenhum tipo de atitude como esta de recorrer à justiça burguesa para evitar uma polêmica entre correntes que se colocam à esquerda do governo Lula.


Defendendo o indefensável

A dependência financeira das grandes empresas é uma forma central de cooptação da democracia burguesa. As empresas financiam as campanhas conscientemente para gerar uma dependência financeira que se tornará também política e programática.
Não se pode falar do processo de domesticação dos partidos operários sem levar em conta sua expressão material, concreta, financeira. Como se poderia explicar a incorporação de partidos de grande importância histórica como a social-democracia européia à ordem burguesa? Como se pode ignorar esse tema na explicação da tragédia petista?

O PT reuniu o melhor da vanguarda das grandes greves da década de 80 (não alcançamos nada semelhante desde então). Esse partido foi completamente integrado à democracia burguesa e hoje é o pilar político mais importante do governo e do regime. Essa mudança seria impossível sem uma explicação material, que inclui o financiamento das campanhas pelas grandes empresas e os altos salários dos parlamentares e assessores.

A direção do MES, no entanto, não pensa assim. Defende explicitamente a doação e a assume como um critério a ser incorporado pelo PSOL. Em texto de resposta a seus críticos, Roberto Robaina e Pedro Fuentes, dirigentes do partido, dizem: “É lógico que seria muito melhor se os trabalhadores tivessem recursos para garantir o financiamento de nossa campanha a partir de suas decisões soberanas. Mas esta não é a realidade hoje. A opção de não aceitar recursos empresariais em nenhuma hipótese, neste quadro, seria a de não realizar a campanha com força de massas e com capacidade de disputa”.

Ou seja, segundo o MES, se o PSOL quiser levar adiante uma luta eleitoral de massas, está obrigado a aceitar doações de grandes empresas como a Gerdau.
Esse suposto “realismo” repete a mesma lógica das respostas da direção do PT na década de 90. Vai disputar eleição para ganhar? Então é necessário fazer alianças com partidos burgueses. Como financiar as campanhas se elas são caras? É preciso aceitar o dinheiro da burguesia ou “é só para marcar posição e não para ganhar”.

A democracia burguesa é um jogo de cartas marcadas, um caminho fechado para qualquer perspectiva revolucionária. Aceitar essa estratégia é deixar de lado todos os princípios socialistas, a começar pela independência de classe. Só se pode “ganhar” se há um abandono da estratégia socialista. O PT, por exemplo, deve ganhar em 2008 mais uma eleição, mas deixou de lado qualquer princípio socialista.
A independência política, segundo a direção do MES, estaria garantida pela qualidade da direção do próprio MES e do PSOL. Respondendo aos críticos, eles dizem: “na verdade, o problema com os companheiros é que eles consideram que nossa estratégia não merece confiança. Estão no direito deles. Mas nós estamos no nosso direito de confiar em nós mesmos.”

É aqui que o suposto “realismo” vai por água abaixo. Em termos marxistas, a existência material determina a consciência. A dependência financeira das grandes empresas inevitavelmente terá conseqüências políticas e programáticas. Ignorar isso é deixar de lado todas as lições da degeneração petista. Quadros mais provados e de capacidade intelectual mais elevada do que a direção do MES – como demonstra a história da social-democracia européia e do próprio PT – já se perderam nesse caminho.

Na verdade, essa influência já está pesando na própria campanha de Luciana Genro. Ela defende, por exemplo, mais polícia (“mais Guarda Municipal”) para resolver os problemas de segurança em Porto Alegre, afirmando que a cidade “não pode ficar igual ao Rio de Janeiro”. Luciana está usando e abusando de imagens e depoimentos de Tarso Genro, seu pai e ministro da Justiça de Lula, em seu programa eleitoral na TV.


O vale-tudo para defender o financiamento da Gerdau

Felizmente a postura da direção do MES gerou uma reação de outras correntes do PSOL. Diversos documentos polêmicos foram apresentados e a discussão veio a público. Chico Alencar disse ao jornal “O Estado de S. Paulo” que “foi um erro” e “é uma contradição” seu partido aceitar uma contribuição da Gerdau para a campanha eleitoral.

No entanto, a direção do MES não está disposta a aceitar o debate sobre sua política. O fato de ter recorrido à justiça burguesa para retirar o programa de TV do PSTU do ar deixa claro o método do vale-tudo para abafar as críticas.
O MES já tinha deixado de lado a independência de classe ao se aliar com o PV, um partido burguês e governista. Foi além aceitando o dinheiro de uma grande empresa. Agora recorre ao Estado burguês para tentar acabar com uma polêmica entre correntes do movimento de massas.


É hora de reverter esse curso

O PT aceitou o financiamento das grandes empresas já na década de 90. Exemplo disso foi uma denúncia apresentada por César Benjamin no congresso de 1994. César rompeu com o PT em seguida.
Voltamos a dizer que o f
inanciamento da Gerdau pode levar a uma mudança no PSOL, num ritmo muito mais rápido que o do PT e em uma situação política muito diferente.

A direção do MES apresenta uma tendência clara: aliança com partidos burgueses e governistas como o PV; financiamento das grandes empresas para ter “capacidade de disputa” eleitoral; recurso à justiça burguesa para abafar as críticas.

Felizmente existe uma reação contrária de muitos militantes e correntes do PSOL. Existem também propostas de uma reunião da direção nacional do PSOL para rever a posição de Porto Alegre. Esperamos que essa seja a resposta da maioria desse partido.

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