Honduras vive momentos decisivos. Passaram-se meses desde o golpe, e o imperialismo busca desesperadamente uma saída para impedir o fortalecimento das mobilizações. Para falar sobre isso, o Opinião entrevistou Dirceu Travesso, da Secretaria Executiva da C Você chegou em Honduras logo depois do dia 11 de agosto, quando houve uma grande marcha em Tegucigalpa, que contou com cerca de 30 mil pessoas. Quais foram as primeiras impressões que teve?
Dirceu Travesso –
O país mantém um processo de resistência muito forte. A primeira característica que eu vi é que existe um golpe militar, apoiado evidentemente pelos setores mais à direita e reacionários. No entanto, é um golpe atípico em relação ao que estamos acostumados a ver na América Latina. Exatamente pela situação do imperialismo, que não deu uma sustentação direta ao golpe, os golpistas têm um limite para se impor ao movimento. Isso é parte importante para que a resistência se mantenha de forma permanente. Se não fosse a situação atual de crise do imperialismo, que aposta em saídas dentro do regime democrático burguês, o mais provável é que o golpe já tivesse sido consolidado.

Cheguei lá no dia 12. No dia anterior, havia ocorrido uma manifestação nacional com entre 30 e 40 mil pessoas. Mas, no dia 12, também teve um protesto grande de 15 a 20 mil. Mas eu só encontrei uma parte da manifestação depois de uma brutal repressão. Quando cheguei, a orientação do comando do ato era para que todo mundo se dirigisse à Pedagógica (escola de magistério). Mas ali também teve repressão para tentar desbaratar e desorganizar o movimento.

Fale do movimento “Las Maestras”.
Dirceu –
Já no início do golpe, foi constituída a Frente Nacional Contra o Golpe de Estado. Na verdade, a frente foi uma união de vários movimentos e entidades que já tinham trabalhado juntos contra a política de tratados comerciais, etc. Após o golpe, a frente adicionou setores ligados a Manuel Zelaya.

O sindicato dos professores é um dos mais fortes do país e foi muito importante para a frente. Não havia uma manifestação em que não tivesse as “maestras” [professoras]. No primeiro momento da resistência, foi chamado um “paro” [paralisação], e a principal categoria que aderiu e fez uma longa greve foram os professores. Outras categorias de estatais chegaram a fazer manifestações, mas depois suspenderam. Nos setores privados, quase nenhuma conseguiu sustentar greves mais longas.

Mas as professoras conseguiram manter a paralisação por bastante tempo. Só a suspenderam depois que começou uma campanha do governo tentando jogar a comunidades contra elas. Aí o sindicato orientou a voltar. Mas elas dão aulas às segundas, terças e quartas e fazem paralisações às quintas e sextas. A Frente Contra o Golpe, que era centralizada, no último período foi se proliferando por regionais, estados e cidades. Aí, os professores são sem dúvida a categoria mais importante na resistência e mobilização.

Você participou de várias atividades e reuniões da Frente Contra o Golpe. Como eles estavam vendo as negociações mediadas por Óscar Arias com o governo golpista?
Dirceu –
Há muita desconfiança em relação às negociações, mas o ordenamento político da resistência, infelizmente, está subordinado ao processo de negociação. Todo mundo tem claro que, se de um lado o imperialismo não dá sustentação ao golpe, de outro é evidente que ele também não apoia o movimento de resistência. Isso porque o imperialismo não quer derrotar nem o exército, nem os golpistas, pois são os setores que dão apoio à classe dominante local e podem garantir uma certa estabilidade no próximo período. Então, todos sabem que a saída do imperialismo para o golpe é barrar a luta, que pode avançar para a Assembleia Constituinte e tentar resolver outros problemas do país. Mas essa clareza não consegue se refletir numa política que supere esse limite e consiga dividir o exército, parar o país e efetivamente derrubar os setores golpistas.

Na semana passada, os EUA decidiram não declarar que o que ocorreu em Honduras no dia 28 de junho foi um golpe militar. Como você avalia isso?
Dirceu –
Isso é parte da política do imperialismo desde o primeiro momento. Os EUA não impuseram sanções mais pesadas aos golpistas. A política do imperialismo não é derrotá-los, mas sim buscar uma saída por dentro do regime democrático burguês.

Eles necessitam agora encontrar essa saída. Para isso precisam, por um lado, não se confrontar com Zelaya, mas ao mesmo tempo não enfrentam os golpistas. O que parece é que está se construindo uma saída onde Micheletti renunciaria, mas isso não significaria o retorno de Zelaya ao poder. A situação iria então para um processo eleitoral, de onde sairia um novo governo que pudesse ser reconhecido pela comunidade internacional.

Essa é a política central do imperialismo hoje, não é de golpes, intervenção ou governos bonapartistas. Mas isso não pode ser interpretado como alguma bondade do imperialismo. É expressão de uma crise, da derrota da política intervencionista do governo Bush. Ao ser derrotado no Iraque, na Palestina e no Líbano, e ter se enfraquecido na América Latina, o imperialismo precisou de uma face mais negociadora que veio com a eleição de Obama à Casa Branca.

Fale sobre a importância de a Conlutas ter enviado essa delegação a Honduras.
Dirceu –
O apoio internacional é muito importante, inclusive quanto ao debate sobre a saída da crise e a continuidade da luta. Uma saída que deve ser coletiva, a partir da unidade da classe trabalhadora de toda a América Latina.

Mas é importante também para trazer uma postura internacionalista à Conlutas. Não há possibilidade de construir um organismo dos trabalhadores que defenda um projeto no Brasil de transformação social que não esteja baseado numa política de solidariedade de classe. Isso foi uma vitória da Conlutas.

LEIA OS RELATOS DA VIAGEM DE DIRCEU TRAVESSO

  • Honduras resiste – 4º e 5º dias
  • Honduras resiste – 3º dia

  • Honduras resiste – 2º dia

  • As primeiras impressões em solo hondurenho

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