Dilma rifa os homossexuais para salvar Palocci
Ag. Brasil

Na última quarta-feira, 25 de maio, a presidenta Dilma Rousseff mandou suspender o kit “Escola sem Homofobia”, que vinha sendo elaborado pelo Ministério da Educação e serviria para levar para dentro das escolas públicas, em todo o país, o debate sobre a homossexualidade e a homofobia.

Esse material, encomendado pelo MEC há mais de um ano, é uma resposta a uma reivindicação antiga do movimento LGBT e de professores, pais e estudantes: a necessidade de que as diferentes orientações sexuais e a homofobia sejam abordadas nas escolas. Algo mais do que necessário, já que não há nenhum preparo, ou material, nas escolas públicas para lidar com a opressão homofóbica, o preconceito e o bullying sofrido por alunos, professores e funcionários LGBT.

Apesar de que, para nós do PSTU, esse material tenha uma série de limitações – como por exemplo o fato da elaboração não ter sido discutida com os professores e estudantes que vivem o cotidiano da escola pública – ele é mais do que necessário e seria fundamental para abrirmos um debate no interior das escolas.

Crônica de um recuo anunciado
É sempre bom lembrar que o kit iria romper com uma lamentável “tradição” do lulismo: dentre tantas propostas e políticas anunciadas para o combate à homofobia, em mais de 8 anos de governo Lula/Dilma, esta seria a primeira que chegou perto de sair do papel.

Embora Dilma alegue que a suspensão do material é devido ao seu conteúdo, o que já e bastante grave, até mesmo porque ela mesma afirmou que nunca viu o material, já está claro para todo mundo que há um outro motivo, que também é a cara do lulismo: a entrega de direitos e conquistas dos movimentos sociais como forma de barganha em negociações espúrias com os setores da classe dominante.

Quanto ao argumento baseado no conteúdo, além do material ter sido avaliado e recomendado até mesmo pela Unesco (que está longe de ser uma aliada na luta contra a homofobia), o fato concreto é que Dilma já deu claros sinais de que não tem nenhum compromisso com a nossa luta. Basta lembrar da “carta ao povo de deus”, ainda durante a campanha eleitoral.

E foi exatamente esta cumplicidade com a homofobia que Dilma transformou em acordo espúrio ao retirar o “kit” para barrar a chantagem da bancada evangélica e grupos católicos no Congresso Nacional, que ameaçaram convocar Palocci para esclarecer a multiplicação de seu patrimônio, e abrir uma CPI para investigar o Ministério da Educação.

Diretos vitais como moeda de troca
Anthony Garotinho (PR-RJ), porta-voz dos homofóbicos, anunciou que a bancada evangélica não votaria nada até que o kit fosse retirado e isto bastou para que Dilma dissesse que o material é “inadequado”, que “não aceita propaganda de opção sexual” e que o governo “não pode intervir na vida privada das pessoas”.

Da vida privada de quem ela se refere? Certamente ela não está falando das pelo menos 260 “vidas privadas” de homossexuais assassinados só em 2010 no Brasil. Ou da “vida privada” de milhares de crianças e adolescentes que sofrem homofobia todos os dias na escola.

Nós sabemos que a homofobia não faz parte da vida privada, porque ela é cotidiana e está em todo canto. E, acima de tudo, é uma “construção social”, alimentada por séculos de propaganda ideológica (na qual as igrejas cristãs desde sempre cumpriram um lamentável papel de destaque), políticas levadas a cabo pelas elites dominantes e conservadoras que sempre alimentaram as práticas homofóbicas e reproduzida, no dia a dia, pelos meios de comunicação e, também, no interior das escolas.

E, por isso mesmo, o movimento LGBT sempre lutou por um material público para ser utilizado no interior das escolas, um “pequeno”, mas importante passo na luta por reverter a ideologia homofóbica.

Ao nos negar este direito, Dilma faz coro com Jair Bolsonaro (PP-RJ), defensor da violência homofóbica, da tortura e da ditadura militar, quando diz que o kit tem por objetivo propagandear a homossexualidade. Por si só, isso já é um absurdo, como se nos tornássemos LGBT´s a partir de qualquer tipo de “propaganda”. Além de que é sempre bom lembrar que o que acontece de fato é que, diária e permanentemente somos, sim, bombardeados por propaganda da orientação sexual majoritária: a heterossexualidade, sempre vendida com altas doses de machismo e homofobia, nas escolas e na mídia.

É preciso transformar a indignação em ação
Ao invés de apontar como “inadequado” um material que sequer viu, o que Dilma deveria fazer é investigar (e, pra isto, afastar) Palocci, cujo fantástico aumento de patrimônio (de 2000%!!!) pode ser visto por todos. Afinal, o que é mais inadequado? Cumprir o papel de utilizar o dinheiro público para desfazer preconceitos, ou proteger e acobertar um sujeito que enriqueceu com o dinheiro público?

Já nas eleições no ano passado, Dilma, com a famigerada “carta ao povo de deus”, jogou no lixo bandeiras históricas dos movimentos feminista e LGBT, como a descriminalização do aborto e a união civil para casais homossexuais. Com essa carta, sinalizou que os setores mais oprimidos da sociedade seriam os primeiros a serem “rifados” para manter seu compromisso com a bancada evangélica – que, diga-se de passagem, é em sua maioria de partidos da base governista, assim como o deputado Jair Bolsonaro.

Assim, para tentar varrer para baixo do tapete um escândalo de corrupção como o Palocci e manter sua aliança com os setores mais conservadores da sociedade, Dilma joga fora até mesmo o material que estava sendo desenvolvido pelo seu próprio governo.

A suspensão do kit anti-homofobia causou revolta em todos os ativistas e entidades do movimento LGBT, e é preciso que tiremos uma lição disso: para lutar contra a homofobia e conseguir vitórias, como conseguimos a aprovação no STJ da união estável, será preciso nos enfrentar com Dilma. Embora o discurso dos governos de Dilma, e antes dela, de Lula, seja de “compromisso com a plena cidadania da população LGBT”, como aponta a ABGLT em sua nota, nos últimos anos, políticas que não saíram do papel e grandes eventos foram realizados pelo governo federal para jogar ilusões no movimento LGBT, mas medidas concretas como essa suspensão são feitas para agradar os conservadores e religiosos no Congresso.

Em nome da “governabilidade” vale-tudo, e nos últimos anos, o PT tem continuamente abandonado as bandeiras históricas que foram construídas junto aos trabalhadores até a chegada de Lula ao poder. Se a “carta ao povo de deus” deixou dúvidas, esse novo fato não pode deixar: não podemos ter o governo Dilma como aliado, precisamos retomar a independência do movimento pra lutar contra a homofobia que sofremos cotidianamente.

E precisamos nos aliar às lutas dos professores e estudantes por uma escola pública sem homofobia, gratuita, laica e de qualidade.