Para manter a confiança dos investidores estrangeiros, nova presidente começa mandato com política de arrochoNem parece a mesma pessoa. A candidata de Lula, que chegara ao final das eleições provocando certa desconfiança, caiu agora nas graças da grande imprensa. E não é por menos. Em pouco mais de dois meses de governo, Dilma Rousseff já deu mostras mais do que suficientes de quais serão suas prioridades nos próximos anos. Primeiro, anunciou um salário mínimo sem aumento real aos trabalhadores, num período em que a inflação dos alimentos explodiu e encareceu a cesta básica.

Logo depois, seu ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou um corte no Orçamento sem precedentes na história. O governo Dilma começa seu mandato cortando R$ 50 bilhões nos gastos públicos este ano, num ajuste fiscal que nem mesmo o governo FHC foi capaz de fazer. Apesar de anunciar o contrário, a medida vai atingir em cheio áreas sociais e serviços públicos.

Mínimo: a responsabilidade da CUT
Enquanto fechávamos esta edição, o governo se preparava para votar o novo salário mínimo. Tudo caminhava para a aprovação do valor de R$ 545, que apenas repõe a inflação do último ano. A CUT, a Força Sindical e demais entidades pediam em negociação com o governo um salário de R$ 580, indicando depois que poderiam aceitar R$ 560, como adiantamento do reajuste de 2012.

O governo Dilma, porém, se manteve irredutível. Nos últimos dias de negociação, o clima chegou a azedar quando Lula chamou os sindicalistas de “oportunistas” por estarem rompendo o acordo firmado com seu governo em 2007. “Ou você tem uma regra e todo mundo fica tranquilo, ou você fica com o oportunismo”, declarou o ex-presidente. Esse acordo propunha uma política chamada de “valorização do salário mínimo”, mas cujo real objetivo era o de “amarrar” o reajuste, vinculando-o à variação do PIB.

O acordo propunha a seguinte fórmula para os reajustes: a inflação do período mais o aumento do PIB de dois anos antes. Se essa fórmula garantiu um reajuste real, embora irrisório, por dois anos, em 2011 esse cálculo não garante aumento nenhum aos trabalhadores. Isso porque em 2009 o PIB do país recuou 0,6%, fruto da crise econômica internacional que atingiu o Brasil no final de 2008.

Para o governo, então, a fórmula veio a calhar. Para os dirigentes da CUT, Força Sindical e demais centrais, nem tanto. Como explicar para suas bases que não vai haver aumento enquanto a economia cresceu, segundo estimativas, de 7% a 8% no ano passado? A fim de tentar disfarçar essa contradição, as centrais mendigaram um adiantamento de parte do reajuste do ano que vem, mas nem a isso o governo se dispôs.

Fato é que, em 2011, os 30 milhões de trabalhadores que, segundo o IBGE, recebem o mínimo, além de 18 milhões de aposentados, não terão nenhum aumento. Isso significa que, por causa do acordo assinado pela CUT e demais centrais com o governo Lula, 48 milhões de pessoas não terão aumento este ano.

Como se isso não bastasse, o governo e as centrais querem ainda transformar essa “política de valorização” em lei, engessando qualquer possibilidade de mobilização para um salário mínimo digno. Simbolicamente, o governo escolheu o deputado Vicentinho (PT-SP), ex-presidente da CUT, para relatar o projeto de lei dos R$ 545 e da regra para os próximos anos.

O líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), tentou explicar o não-aumento do mínimo relacionando-o às supostas dificuldades fiscais pelas quais o governo estaria passando. “Com um anúncio de cortes da ordem de R$ 50 bilhões, seria irresponsabilidade dar um aumento maior”, chegou a afirmar.
Resta a questão: aumento no salário mínimo é “irresponsabilidade”. E o aumento de R$ 10 mil nos salários dos deputados, que vai gerar um impacto de R$ 860 milhões só no Orçamento Federal, é o quê?

Não em nosso nome
“Não é verdade o que a imprensa e o governo vêm dizendo, que esse acordo foi entre o governo e os trabalhadores”, contesta Atnágoras Lopes, dirigente da CSP-Conlutas. “É sim um acordo entre o governo e as próprias centrais governistas”, explica, lembrando a jornada de lutas que a central impulsiona, exigindo uma verdadeira valorização do salário mínimo.

Um presente para os empresários
Ao mesmo tempo em que anuncia um ajuste fiscal de dar inveja aos tucanos, o governo Dilma trabalha com um projeto de desoneração tributária que, na prática, vai significar o início de futuras outras reformas.

O governo planeja diminuir gradativamente a contribuição das empresas ao INSS, dos atuais 20% para 14%. Uma vez aprovado, esse pacote de bondades aos empresários custaria algo como R$ 50 bilhões em três anos. Coincidência ou não, esse é o mesmo valor do corte orçamentário para 2011.

A medida foi promessa de campanha da então candidata Dilma e parte do princípio de que menos custos de contratação significam mais postos de trabalho. Além de não ser verdadeira, essa lógica abre caminho para uma futura reforma trabalhista, ao defender que menos custos (ou direitos aos trabalhadores) promovem a criação de mais postos de trabalho.

Os primeiros atingidos, no entanto, seriam a Previdência Social e os trabalhadores. Ou quem mais o governo faria cobrir o rombo deixado pela desoneração aos empresários?

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