Dois dias após a tragédia com o Airbus 320 da TAM, o governo Lula liberou a venda de ações da Infraero. A medida faz parte de um pacote de combate à crise aérea que se limita à superfície dos problemas do setorA ordem veio de Lula, mas a notícia foi anunciada pelo ministro do Planejamento Paulo Bernardo e confirmada pela ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rouseff. “O Conac [Conselho de Aviação Civil] recomenda o estudo, por parte do Planejamento, da Fazenda e dos órgãos competentes do governo, no sentido da abertura de capital para empessas desse setor – vamos supor, a Infraero – e também recomenda a participação privada em novos aeroportos”, declarou Dilma no último dia 20.

Pelo pacote do governo, as empresas privadas que comparem ações da Infraero poderão participar, inclusive, de sua administração. Segundo nota da Agência Brasil, órgão de imprensa oficial do governo, o Conac publicou uma resolução (9/2007) em que define que o Plano Aeroviário Nacional deve “estimular a participação da iniciativa privada na construção, exploração e operação de aeroportos”. “Pode-se fazer a ampliação em parcerias público-privadas ou fazer concessão privada de aeroportos”, disse Dilma.

A intenção de privatizar a Infraero não é novidade e já foi objeto de Projeto de Lei, em 2005, apresentado, na época, por José Alencar e Antônio Palocci, então ministros da Defesa e da Fazenda, respectivamente. O acidente com o Airbus 320 da TAM era a desculpa que faltava para implementar o plano de privatização. Na época, houve uma pressão do movimento para que não fosse encaminhado o PL.

Infraero é cenário ideal para falcatruas
O modelo de PPP (Parceria Público Privada) defendido por Dilma é o mesmo aplicado no Metrô de São Paulo, por exemplo, onde uma tragédia ocorreu em janeiro passado, deixando oito mortos e muitos desabrigados. Não é à toa que uma das principais batalhas dos metroviários paulistas, hoje, seja pelo fim das PPPs. As empresas que entram no “negócio” baseiam-se numa administração que visa tão somente reduzir gastos e aumentar lucros. Foi assim que a segurança foi para o espaço nas obras da Linha 4 do Metrô e fez desabar a futura estação Pinheiros.

A Infraero é outro alvo das PPPs: administra 68 aeroportos no país, atualmente, além de terminais de carga. Esse número representa 97% do transporte aéreo nacional. Mesmo com a crise da Varig, em 2006, que gerou enormes despesas para a estatal, o lucro líquido da empresa fechou o ano em mais de R$ 170 milhões.

Segundo informou Francisco Lemos, diretor do Sindicato Nacional dos Aeronautas, ao jornal Folha de S. Paulo, apenas 11 aeroportos dão lucro. Os outros 57 são mantidos por estes 11. Assim, é fácil imaginar que, com a venda da Infraero ou de parte dela, “o investidor privado não vai querer subsidiar, vai querer só o lucro”, como disse Lemos.

Além disso, a Infraero administra um outro atrativo negócio: o desvio de verbas. A estatal passou a servir de meio para lavagem de dinheiro, caixa 2 e até “mensalão”, segundo a Sílvia Pfeiffer, a empresária que denunciou o esquema. “A chave inicial do esquema é o superfaturamento das obras, que o TCU [Tribunal de Contas da União] mesmo já disse que chega a 375%. (…) essas obras eram todas negociadas” disse Sílvia em entrevista à revista Isto É.

Ela denunciou, ainda, que o dinheiro servia para financiar campanhas políticas, como a do deputado Carlos Wilson (PT-PE), então presidente da Infraero e do próprio Lula. “Ia dinheiro para a campanha do Carlos Wilson e não tenho dúvida que dali também saiu dinheiro para a campanha de reeleição do presidente Lula”, afirmou.

Venda de ações da Infraero para a iniciativa privada tem nome: é privatização. A estatal vai virar fonte de especulação. O descontrole na administração da empresa abrirá mais espaço para as já existentes falcatruas, que devem acabar imediatamente. O caminho para resolver a crise é inverso: os atuais responsáveis pela administração da Infraero devem ser todos afastados e, caso se comprove a responsabilidade da empresa na tragédia, devem ser presos.

Lula e todos os envolvidos na crise já deixaram evidente. Diante do apagão aéreo, dos inúmeros problemas técnicos ignorados, do uso exacerbado de Congonhas visando somente o lucro e mais de 350 mortes, entre outras coisas, só quem tem condições de administrar a Infraero são diretamente os trabalhadores do setor aéreo.