Em dezembro de 2009 houve quase um milhão e meio de demissões; remessa de lucros ao exterior torna o país mais dependentePara o governo Lula e a maioria esmagadora da imprensa, o Brasil já superou a crise econômica internacional que atingiu o país em cheio no final de 2008, saindo dela até mais forte do que entrou. As tradicionais matérias da imprensa sobre o prognóstico para 2010 não escondem o ufanismo ao afirmarem que este seria “o ano do Brasil”.

Os últimos dados divulgados sobre a dinâmica da economia em alguns setores chave, porém, mostram que, se houve uma relativa recuperação, ela ainda está longe de significar o fim da crise.

Desaceleração nos empregos
No último dia 20 de janeiro, o Ministério do Trabalho revelou os números fechados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) para 2009, que registra o total de admissões e demissões. Ou seja, ele mostra a rotatividade no mercado de trabalho formal, mostrando quantas vagas com carteira assinada foram criadas ou extintas em determinado período.

Em dezembro, o Caged mostrou a extinção de nada menos que 415.192 empregos formais. Tal resultado foi causado pelo grande número de demissões, muito superior ao esperado para o mês de dezembro, período já tradicionalmente marcado pelas dispensas. Foram 1.483.673 demissões, enquanto as admissões somaram 1.068.481. Para se ter uma ideia do que significa isso, em dezembro de 2008, quando a crise pegou o país em cheio, 1.542.245 trabalhadores foram mandados para a rua. Apenas 58 mil a mais que dezembro último, quando, segundo o governo, a crise já haveria passado.

Demissões
Na mais recente onda de demissões, o setor de serviços lidera, com 507.343 demitidos, seguido pela indústria, que mandou embora, só em dezembro, 346.334 funcionários. Mesmo o aquecido setor da construção civil dispensou mais de 163 mil trabalhadores. Comparando as admissões com as demissões, a indústria de transformação foi a que mais extinguiu postos de trabalho, com um saldo negativo de 166 mil vagas. Foi seguido pela construção civil, com menos 68 mil vagas.

Em todo o ano de 2009, considerando o total de admissões e demissões, o mercado de trabalho teve a criação de pouco mais de 995 mil vagas. Pode parecer muito, mas foi o pior resultado desde 2003, quando o ano fechou com 645 mil novas vagas de trabalho. Para se ter uma ideia, em 2008 se teve a geração de 1.452.204 empregos, ou 457 mil a mais que 2009. A indústria de transformação, por exemplo, enquanto que, em 2008, gerou 178 mil vagas, em 2009 criou apenas 10.865.

Indústria
Se destrincharmos os setores que compõem a indústria, podemos ter uma ideia de quais vagas foram geradas em 2009. A indústria metalúrgica teve saldo negativo de 27 mil postos de trabalho. A indústria mecânica extinguiu no ano 13.885 empregos, enquanto que a de materiais elétricos e de comunicação fechou mais de 11 mil vagas. A indústria como um todo só não teve um resultado pior devido aos setores de bens de consumo semi e não-duráveis, como a indústria têxtil e de vestuário, calçados e de produtos alimentícios e bebidas.

Mesmo se pegarmos essa pequena geração de vagas na indústria como um todo, porém, há desigualdades. No estado de São Paulo, por exemplo, a indústria cortou mais de 98 mil vagas, o que representa uma queda de 4,32% no acumulado do ano.

Remessas de lucros
Apesar do resultado do mercado de trabalho em 2009, o ministro Carlos Lupi afirmou que, em 2010, serão criadas 2 milhões de novos empregos. Isso faz parte da propaganda oficial do governo para manter o otimismo, necessidade ainda maior num ano eleitoral. As evidências, porém, apontam em sentido contrário.

Em dezembro de 2009, o Brasil também registrou o pior déficit em transações correntes da história. Essa conta, que registra o valor do total de bens e serviços negociados com o exterior, teve um rombo de quase 6 bilhões de dólares só no último mês de 2009. Tal resultado foi impulsionado principalmente pelo aumento das remessas de lucros das multinacionais às matrizes que, só nesse mês de dezembro, remeteram 5,3 bilhões de dólares. O setor que mais enviou recursos ao exterior foi justamente a indústria automobilística, a maior beneficiada com isenções e subsídios pelo governo.

Em todo o ano, o déficit foi de 24,3 bilhões de dólares. Para 2010, o próprio governo estima um saldo negativo de 40 bilhões de dólares, o dobro do ano passado, numa estimativa otimista. O que isso significa? Com a balança comercial capenga, o Brasil vai depender cada vez mais da conta de capital, ou seja, dos investimentos estrangeiros para fechar suas contas. Isso significa que o país vai ser tornar ainda mais dependente do mercado financeiro internacional, cada vez mais instável.

Perspectivas
Apesar de muitos reconhecerem a existência de uma nova bolha no mercado financeiro internacional, insuflado com a injeção de trilhões pelos governos, não se pode afirmar que teremos, ainda em 2010, um novo período de crise aguda, como se teve em 2008. O que se pode dizer de fato é que a tão propalada recuperação já vem perdendo fôlego e que, no caso do Brasil, estamos ainda mais vulneráveis.