Definitivamente os trabalhadores e a população pobre não têm nada que festejar do ano que termina. Nos últimos meses viu-se uma forte inflação nos preços dos produtos básicos da cesta básica, levando alguns economistas a assinalar que a inflação de alimentos até o fim do ano pode chegar a 12%.

Piorando a situação, o governo de Evo Morales, ao melhor estilo dos neoliberais, decreta um “gasolinazo”, esperando que os trabalhadores e a população pobre apertem ainda mais o cinto em 2011.

Um duro golpe à economia popular
O Decreto Supremo 748 aumenta o preço das gasolinas em 73% e do diesel em 83%, gerando um duro golpe à economia da família operária, camponesa, indígena e setores populares, já que encarecerá o custo de vida. De imediato repercute nos preços da tarifa do transporte e dos produtos da cesta básica. A EMAPA já aumentou os preços do arroz e açúcar em 15%. Mas o mais grave é que esta medida vai contribuir para gerar uma inflação desenfreada, que o governo vai tentar ocultar, mas será sentida, como na época da UDP, no bolso do povo. Este é sem dúvida o maior ataque do governo à população pobre nos seus cinco anos de gestão.

Cai a máscara e o governo mostra sua face pró-imperialista e neoliberal
Depois do reajuste salarial de 5% em maio passado, medida que gerou a primeira greve operária contra o governo de Evo, esta é, sem dúvida, a medida governamental mais antioperária e antipopular. E a explicação não tem nada a ver com as mentiras de que é para “combater o contrabando” ou para “proteger a economia boliviana”. Esta medida em nada afeta os empresários e contrabandistas. É uma típica medida de ajuste fiscal, como nos governos neoliberais, e como sempre seremos os trabalhadores e a população pobre os que sofreremos os maiores impactos.

Nos últimos anos escutamos por parte do governo e seus ministros uma forte propaganda de que a macroeconomia ia bem, de que os “ajustes neoliberais” eram coisas do passado. O “gasolinazo” é a mais pura comprovação de que a política econômica do governo segue a orientação do neoliberalismo, tão elogiada pelo FMI e pelo Banco Mundial. De fato, vimos que a economia boliviana teve bons índices de crescimento nos últimos anos, mas que em nada se traduziu na melhoria das condições de vida do povo. Não teve uma melhoria nos salários dos operários, não vimos a criação de postos de trabalho, e continua aumentando a miséria e a desigualdade social.

Em 2008, a economia boliviana cresceu em bom ritmo, 6,1%. Em 2009, com a recuperação dos preços das matérias primas, cresceu 3,4%. Já em 2010 teve uma queda no crescimento. A Bolívia está entre as nações sul americanas com menor crescimento econômico. Em um relatório, a CEPAL prevê que o PIB fechará esta gestão de 2010 em 3,8%.

Por outro lado, em 2008 as reservas internacionais equivaliam a 41% do PIB e hoje ascendem a US$ 10 bilhões, beirando 47% do produto nacional.

Mas este “crescimento econômico” conjuntural sustenta-se em uma maior dependência do país do imperialismo e é completamente vulnerável à dinâmica da crise econômica mundial. Embora Evo faça discursos na ONU, UNASUL e nas Cúpulas mundiais, criticando ao capitalismo, e dentro do país fale que “temos sócios e não patrões” e que o governo leva adiante uma revolução cultural para descolonizar o país, isso são somente discursos para que os povos indígenas mantenham seu apoio. Em verdade, há uma maior presença das transnacionais nos setores chave da economia, como a exploração de petróleo e mineração. A política econômica de Evo Morales depende delas. E estas por sua vez fazem o que lhes dá vontade. O governo do MAS vem aprofundando o processo de recolonização da Bolívia por meio das transnacionais estrangeiras. É assim no caso da jazida de Mutún, San Cristóbal, as minas de Sinchi Wayra etc. Por outro lado, o governo mantém o país atado à dívida externa, que vem crescendo de maneira acelerada nos últimos anos. Em 2008 a dívida externa subiu 10,5%, e em 2010 já atinge US$ 2.633 milhões. O bônus Juana Azurduy [1] este ano foi pago com empréstimo do Banco Mundial.

Portanto, é inquestionável o caráter de dependência e vulnerabilidade da economia do nosso país. O “gasolinazo” do governo demonstra esta situação, no momento em que expõe que continuamos na mesma, importando gasolina e diesel. Mas, além disso, põe em evidência que Evo Morales faz o que é do agrado das petrolíferas e recomendado pelo FMI e pelo BM, já que estes organismos pressionam para eliminar as políticas de subsídios do Estado. Tudo isto nos demonstra que Evo não é um governo dos movimentos sociais, não é operário, nem camponês e também não é defensor dos povos indígenas.

Frear o contrabando ou um grande negócio para as petrolíferas?
O governo justifica a medida como uma ação para frear o contrabando de combustíveis, que este ano foram subsidiados pelo Estado com US$ 380 milhões. Mentira, também há contrabando de GLP e outros produtos, e o governo não adota a mesma medida. Ou será que o próximo passo vai ser liberar o preço do gás?

O que Evo e o seu governo capitalista precisam ocultar do povo é que o discurso de recuperação dos Recursos Naturais e que agora pertencem aos bolivianos é uma farsa. Mais ainda, as petrolíferas como Petrobras, Repsol, Total, British Gás, Pluspetrol, Vintage, Pluspetrol, Dong Won e Matpetrol, desde o decreto da nacionalização não investem em trabalhos de prospecção petrolífera, nem sequer cumprem os contratos, e Evo pelo seu carácter pró-imperialista, não foi capaz de expulsá-las do país.

As petrolíferas fizeram o que lhes dava vontade para manter os seus lucros, seguiram investindo em descobertas de campos de gás natural para sua exportação sem fazer a separação dos líquidos. A Petrobras continua levando o gás rico e extraindo os líquidos no Brasil, obtendo assim duplo ganho. Embora a compra das refinarias devesse resultar em maior produção de líquidos (gasolina e diesel) dentro do país, resultou o contrário. A produção de líquidos foi reduzida de 48.556 barris por dia, registrado em 2005, a 40.743 barris por dia em 2009, razão pela qual foi necessário intensificar a importação do diesel e gasolina, e subvencionar o preço no mercado interno para comercializar a custos mais baixos, para que a população não retomasse a luta de 2003 contra as transnacionais e em defesa dos recursos naturais.

O próprio vice-presidente e o Ministro de Economia e Finanças esclareceram a verdade: “A produção de petróleo não tem incentivo e por isso há um declínio dos campos de produção e, portanto, uma diminuição na produção de combustíveis”, assinalou García Linera. Em outras palavras, “a tendência das grandes petrolíferas assentadas na Bolívia é a de descobrir gás natural para exportá-lo, em lugar de explorar petróleo. Até ontem, Bolívia mantinha congelado o preço do barril de petróleo em US$ 27,11 enquanto nos mercados internacionais o seu custo supera os US$ 90”, disse o ministro Arce Catacora. Segundo ele, com a medida aprovada no domingo, as petrolíferas privadas terão um maior incentivo para produzir cru. “O estímulo vai chegar à ordem dos US$ 59 para a produção”, admitiu o ministro do Petróleo, Fernando Vincenti. Ademais, disse que a medida aplicada é para preservar a economia. Em outras palavras, antes o governo pagava US$ 27,11 pelo barril de petróleo às petrolíferas, agora pagará US$ 59. É ou não um grande negócio para as petrolíferas? A quem o governo está protegendo, o povo ou os interesses das petrolíferas?

Mais claro impossível, o “gasolinazo” é um duro golpe contra as condições de vida dos trabalhadores, camponeses, indígenas e setores de classe média, e um presente para as petrolíferas, para que continuem saqueando o nosso país. Se não levassem o nosso gás, nós teríamos condições de processar e ter gasolina e diesel, sem precisar importar. Portanto, não estamos frente a uma medida difícil, mas necessária, como quer fazer achar o governo, é uma mentira a mais para que o povo não reaja.

As bases devem exigir que seus dirigentes rompam com o governo e organizem a luta para derrotar o “gasolinazo”

Em defesa do salário, emprego e a expulsão das transnacionais.

Os “gasolinazos” anteriores de Goni ou Mesa provocaram uma reação imediata dos trabalhadores e dos camponeses. Por isso, Evo se apressa a explicar que a poupança obtida pelo Estado depois de deixar sem efeito o subsídio aos combustíveis servirá para beneficiar a população, mediante os governos estaduais e que o aumento salarial será superior à inflação. O governo tenta conter a reação dos trabalhadores, evitar que as bases ultrapassem os dirigentes controlados pelo governo.

Mobilizar para derrotar o decreto. Deve-se mobilizar de forma coordenada. A direção da COB e da FSTMB devem romper o pacto com o governo e fazer um amplo chamado aos trabalhadores, sindicatos, donas-de-casa, juventude, para uma marcha unificada, exigindo a revogação do Decreto 748 que eleva os combustíveis e os indexa ao preço internacional. Se estes dirigentes continuarem com o governo e derem as costas aos trabalhadores, sem chamar uma luta contundente até derrotar o decreto, teremos que, a partir das Federações, sindicatos e organizações que não se dobraram ao governo, fazer o que fizemos em 2003. Sair a protestar com ou sem a direção da COB. O grau do ataque fez com que importantes batalhões da classe operária boliviana, como os mineiros de Huanuni, saíssem a rejeitar o “gasolinazo”. A pressão das bases fez com que a direção da COB mude o seu discurso. Na sua última reunião ampliada nacional aprovou-se a rejeição do “gasolinazo” e convocar a mobilização, mas não abandonando a sua política de dialogar e negociar com o governo. Por isso, não podemos depositar nenhuma confiança em Pedro Montes e na direção da COB. Somente a pressão das bases pode impor aos dirigentes que rompam com o governo e encabecem a luta.

Dobrar o salário mínimo em janeiro. A Bolívia segue sendo o país mais pobre e desigual da América Latina, após o Haiti. No país, os 20% mais ricos da população concentram 60% dos rendimentos; enquanto os 20% mais pobres mal acumulam 2% dos rendimentos (Último relatório do PNUD). Segundo a FAO, Organização da ONU para a Agricultura e Alimentação, dois milhões de pessoas (24% da população) sofrem de fome extrema em nosso país. A luta pela recuperação dos salários é chave frente às medidas do governo. O governo oculta a inflação e, portanto, qualquer índice de incremento salarial que apresente não vai equilibrar a inflação anterior e também não a disparada de preços pelo “gasolinazo”. O governo quer anunciar um reajuste salarial o 1º de maio. De imediato, é necessário propor dobrar o saláriomínimo nacional (hoje de 679bs, para 1.358bs) e reajustá-lo de acordo à inflação dos preços dos alimentos mensalmente.

Defesa do emprego digno. Os bolivianos pobres são tratados com discriminação fora e dentro de nosso país. Os governos neoliberais criaram postos de trabalho eventuais e precarizados, tirando-nos os direitos trabalhistas. No governo de Evo, 70% da população economicamente ativa mantem-se no mercado informal. Agora, para aliviar as demissões e impactos do “gasolinazo”, o governo anunciou a criação de 20 mil empregos de emergência, empregos precários, o mesmo que faziam os governos anteriores. Não à informalidade! Basta! Queremos empregos dignos, contratos fixos, direitos trabalhistas para poder contribuir para a nossa aposentadoria.

Exigir de Evo que rompa com o imperialismo:

1. Recuperar os nossos RRNN! Expulsão das transnacionais. Basta de saque e recolonização! Uma verdadeira nacionalização e recuperação dos recursos naturais só é possível com a expulsão das transnacionais sem nenhuma indenização. Fora a Petrobras, Repsol, etc. Gás, petróleo, gasolina e diesel para os bolivianos. Fim das concessões mineiras ao capital privado. Os trabalhadores e o povo devem controlar os recursos naturais e não a burocracia “masista” [do MAS] do estado.

2. Não mais endividamento externo! Basta de empréstimos do BM e outros órgãos do imperialismo. Não à macroeconomia neoliberal. Nenhum dinheiro do Estado para o pagamento das dívidas externa e interna. Que o governo utilize o dinheiro das reservas internacionais para investir na industrialização dos nossos recursos naturais gerando um plano de obras públicas e empregos.

Que o governo exproprie os latifúndios do oriente boliviano, os “sojeiros” e criadores de gado! Repartir a terra aos camponeses pobres e sem terra, garantindo investimento para a produção agrícola ao pequeno camponês para ter maior produção e alimentos baratos, sem importar açúcar, trigo, etc., de outros países.

Retomar a luta de 2003. O MAS e Evo Morales usurparam e procuram derrotar o verdadeiro processo de mudança começado pelo povo em outubro de 2003. Este não é o nosso governo. Por um verdadeiro governo operário, camponês, indígena, e popular.

[1] – Auxílio às gestantes, programa similar ao Bolsa Família no Brasil

La Paz, 28 de dezembro
Grupo Lucha Socialista
Seção simpatizante da LIT-QI