Dois estudantes são presos, em meio aos protestos pela manutenção do reajuste do salário mínimo para 200 gourdes diários, equivalente a R$ 193 por mês. Policiais e soldados das tropas da ONU, comandadas pelo Brasil, dispararam novamente contra manifestantOs trabalhadores haitianos do setor da indústria de sub-contratação estão se mobilizando novamente, e marcaram mais uma semana de luta, como parte da campanha por reajuste salarial. Estas empresas são terceirizadas que fabricam partes de produtos e envia para empresas fora do país. Na segunda, 3 de agosto, os trabalhadores destas empresas se manifestaram dentro das usinas do Parque Industrial da Região Metropolitana de Porto-Príncipe, capital do país. Eles receberam o apoio dos estudantes da Universidade Estadual do Haiti e das organizações Modep, Batay Ouvriye, Sèk Gramsci e Associação dos Universitários e das Universitárias Dessalinianas (ASID, em crioulo).

No dia seguinte, os operários pararam todas as suas atividades para sair em uma passeata do Parque Industrial até a sede do Parlamento, onde aconteceria uma nova votação em relação ao reajuste do salário mínimo. Apesar de em suas reivindicações os operários expressarem claramente que o reajuste salarial não pode ficar abaixo dos 200 gourdes diários (4,76 dólares), os deputados aprovaram um redução no reajuste, diminuindo o salário mínimo de 200 gourdes para 150 gourdes (3,57 dólares). Eles se submeteram ao veto dado pelo presidente do país e negaram o voto que eles mesmos haviam dado em maio, quando haviam reajustado o salário para 200 gourdes por dia.

Diante de um ataque desses, é claro que a luta só vem crescendo. Nesta segunda, dia 10 de agosto, bem cedo, os operários se mobilizaram no Parque Industrial da capital. Mas, não tiveram tempo para sair pelas ruas. Foram logo atacados pela Polícia Nacional do Haiti (PNH) e pela Minustah. E dois estudantes que estavam apoiando a mobilização foram retirados de dentro da multidão e presos.

A intervenção brutal das tropas deu novo impulso ao movimento dos operários. Uma multidão saiu pelas ruas manifestando e reclamando a imediata liberação dos dois estudantes presos. Ao chegarem à base da Polícia Nacional, os manifestantes foram recebidos por balas da polícia e da Minustah.

No momento em que estamos redigindo essas linhas, não sabemos quantos ficaram feridos. Sabemos apenas que os dois estudantes foram levados à cadeia, na penitenciária nacional. Sabemos também que a Minustah está rondando a cidade universitária – principalmente em torno da Faculdade de Ciências Humanas – reprimindo qualquer estudante encontrado.

Entenda a decisão sobre o reajuste do mínimo
Após dois anos de mobilização, o parlamento votou em maio deste ano o reajuste salarial. O salário mínimo de 70 gourdes (1,66 dólar) passaria a 200 gourdes (4,76 dólares). Esse voto radicalizou ainda mais a luta de classes. Os trabalhadores e seus aliados estão nas ruas exigindo a publicação desta lei no Diário Oficial e seu cumprimento.

Do lado de lá, a burguesia mobilizou suas instituições, principalmente o governo. No dia 17 de junho, os grandons-bourgeois (burgueses-latifundiários, como são chamados no Haiti) conseguiram que o presidente vetasse o salário de 200 gourdes. Todo o mês de julho passou sem nenhuma reação do parlamento, que teria então de decidir se manteria o seu próprio voto ou se curvaria ao veto do presidente. Sem nenhuma vergonha, os deputados recuaram. Na terça-feira, dia 4, exatamente no momento em que os trabalhadores estavam na frente do palácio legislativo, os deputados desistiram e negaram o reajuste de 200 gourdes que eles mesmos votaram em maio. E reduziram esse reajuste para 150 gourdes.

Os trabalhadores estão agora na expectativa da decisão dos senadores, na Câmara Alta. Os senadores ainda têm a possibilidade de votar e manter o reajuste para 200 gourdes. Com certeza, a classe trabalhadora e seus aliados não poderiam ficar apenas na expectativa. A palavra de ordem é mobilização. É neste cenário de mobilizações que a Polícia Nacional e a Minustah interferiram, prendendo dois estudantes na Penitenciária Nacional.

O interessante para a nossa luta é que os trabalhadores estão aprendendo na prática os limites inerentes à democracia burguesa e às suas instituições. Estão descobrindo que nunca poderão contar com as instituições burguesas para atender as suas reivindicações de trabalhadores. E chegará o dia em que saberão que têm a perder apenas os seus grilhões.

NOTA DA REDAÇÃO
* Cada dólar equivale a 42 gourdes, a moeda haitiana. O salário atual é de 70 gourdes, equivalentes a 1,66 dólar por dia. O reajuste para 200 gourdes elevaria o salário para 4,76 dólares diários, ou 8,78 reais.
Mas, com o veto do presidente e o apoio do parlamento, o salário mínimo passaria para 150 gourdes, ou 3,57 dólares, ou 6,58 reais por dia. Isso daria um salário mensal de 145 reais, pela cotação de 11 de agosto. Os manifestantes exigem o salário de 193 reais, que havia sido aprovado.