Milhões de dólares transportados nas cuecas ou em malas alimentam, dia após dia, a avalanche diária de denúncias de corrupção contra o governo do PT e o conjunto das instituições. Nos últimos episódios desse espetáculo de horrores, uma cueca recheada de dólares derrubou o presidente do PT, José Genoino. Dias depois, o deputado estadual João Batista (PFL-SP), foi detido no aeroporto carregando sete malas com mais de R$ 10 milhões. Os dois episódios são emblemáticos e mostram que tanto o PT como a oposição burguesa se utilizam dos mesmos expedientes de corrupção: mensalão, carregados em malas, cuecas ou onde for possível.

Mesmo assim, a burguesia segue decidida em não iniciar um processo de impeachment do presidente. Isso seria apostar na “desestabilização” da economia, até agora não contaminada pela crise política, e poderia apontar um horizonte de lutas de massas no próximo período ameaçando, dessa maneira, seriamente o calendário eleitoral. “Do ponto de vista da capacidade de governar e da governabilidade, inegavelmente [Lula] está enfraquecido. Mas não podemos querer que o governo acabe agora”, declarou recentemente José Serra, um dos pré-candidatos do PSDB à Presidência da República. Jorge Bornhausen, presidente do PFL, engrossa o coro: “O PFL se manterá na oposição até o fim. (…) O país que o escolheu [Lula] deve mantê-lo até o último dia de governo”.

Elites buscam blindar política econômica
A blindagem política não é exclusividade de Lula. O ministro da economia, Antonio Palocci, também está sendo protegido pelas elites para que a política econômica permaneça intacta ao mar de lama. Razões para isso não faltam. Em 2004, o lucro dos bancos alcançou 18,4%. Só o Itaú apresentou, em 2005, o maior lucro anual de um banco na história (R$ 3,776 bilhões). Algo que nunca foi visto no país desde que D. João VI criou o Banco do Brasil no século 19. Como se não bastasse, de 2003 para cá, o número de milionários no país foi de 92 mil para 98 mil privilegiados, enquanto o Brasil é vice-campeão em distribuição de renda. Outra prova contundente de que a burguesia anda feliz com o seu governo petista, foi a divulgação pela revista Exame de um artigo mostrando que as 500 maiores empresas do país aumentaram seu lucro em 7% em 2004, o maior lucro em 10 anos. A burguesia exportadora também vive sorrindo com o governo do PT. Entre os dias 4 e 10 de julho, a balança comercial (diferença entre exportação e importação) registrou um superávit de US$ 1,3 bilhões, o melhor resultado em apenas uma semana de toda a história.

Delfim prepara plano econômico do governo
O ministro da Fazenda da ditadura militar, o deputado federal Delfim Neto (PP-SP), apresentou um plano econômico ultra-neoliberal para Palocci, que já ganhou amplo apoio no Executivo.

O governo Lula mantém um superávit primário (que é a conta das entradas e despesas do governo sem contar os pagamentos dos juros das dívidas) de cerca de 5 % do PIB ao ano (superior a meta acertada com FMI, de 4,25%) . Mas como paga em torno de 7% do PIB por ano aos grandes bancos, acaba tendo um déficit nominal (conta que inclui as despesas com os juros) de mais ou menos 2%.
Para acabar com isso, Delfim propõe a redução dos impostos das grandes empresas e a redução dos gastos sociais do governo, com mais elevações do superávit primário.
Na avaliação do economista Márcio Pochmann, o arrocho nos investimentos atingiria em cheio as áreas sociais. “Esse corte seria feito em maior escala na Previdência Social (R$ 19,7 bilhões), seguida de corte de benefícios dos funcionários públicos (R$ 8,5 bilhões) e também diz respeito à saúde (R$ 5,7 bilhões), que seria a terceira categoria da área social a ser mais atingida pelos cortes dos recursos”, disse o economista que ainda avalia que 1,2 milhão de pessoas deixariam de ter acesso ao seguro desemprego com o corte estimado de R$ 1,8 bilhão. Em educação, o corte de R$ 2,7 milhões representaria 20% menos do orçamento para o setor.

Por enquanto, existem algumas diferenças entre a burguesia e o governo sobre a forma de como seria aplicado o chamado “déficit zero” (se o projeto seria agregado a Constituição na forma de Emenda Constitucional ou não), no entanto, há um amplo acordo sobre o seu conteúdo.

Como se pode ver, uma radicalização da política econômica atual que reduzisse os juros apenas beneficiariam um punhado de empresários aumentando a miséria da população. De La Rua, o ex-presidente argentino deposto por uma revolução popular em 2001, tentou fazer algo semelhante no seu país quando seu governo estava abalado por sérias denúncias de corrupção. Deu no que deu. Aqui, mirando-se no exemplo argentino, a burguesia pretende exorcizar o fantasma das mobilizações sociais e assegurar que Lula cumpra seu mandato para implementá-lo. Dessa forma, prepara o terreno para que um próximo governo, seja ele petista ou da oposição de direita, prossiga com a atual política econômica.