Israel Dutra, Secretário de Relações Internacionais do PSOL

Israel Dutra, Secretário de Relações Internacionais do PSOL

Na primeira quinzena de setembro, cumpre-se um ano da prisão política de Daniel Ruiz, petroleiro argentino. A luta pela liberdade de Daniel ingressa numa nova etapa, com a mudança na situação social e política do nosso país vizinho. Sem data para o julgamento, como preso político, com os recursos da defesa sendo ignorados, Daniel Ruiz iniciou uma greve de fome com a reivindicação de uma reunião entre o tribunal, a defesa e o Ministério Público.

Tal cenário exige nossos redobrados esforços para ampliar e difundir a campanha internacional que vem sendo organizada. Daniel Ruiz não é apenas um preso político, o que já justificaria uma forte luta, mas é um caso simbólico da luta de classes argentina.

Nos anos de democracia burguesa a prisão de ativistas é algo ocasional- existe e deve ser combatida- mas a realidade da ampla maioria dos militantes brasileiros não é uma vida de passagens pelas prisões. Temos ativistas presos hoje em dia: Preta Ferreira do movimento sem teto de São Paulo é um exemplo, além de inúmeros casos no campo e na cidade. É claro que existem muitos processados e processos em curso, alguns ainda dos levantes de 2013; com crise da democracia burguesa e a ofensiva reacionária de Bolsonaro e de seu clã, a hipótese da prisão de opositores e ativistas é real, coisa que o presidente não deixa de falar sempre que pode. Portanto, cabe à vanguarda brasileira discutir como enfrentar a repressão de forma mais direta e séria.

O caso de Daniel Ruiz é emblemático, assim, por uma série de questões. Em primeiro lugar, a natureza de sua prisão diz respeito a um momento decisivo da conjuntura argentina: as jornadas de dezembro de 2017. Naquela ocasião, a luta contra a reforma da previdência de Macri pegou um salto. Foram centenas de milhares de trabalhadores às ruas, nos dias 14 e 18 de dezembro, numa manifestação que recordou o Argentinazo- por sua combatividade e pela data próxima aos festejos de final de ano. Depois de um dia inteiro de batalha contra a polícia próximo à Praça de Maio, panelaços massivos nos bairros à noite, Macri aprovou sua reforma, numa vitória de pirro. A partir daquela data, do gesto heróico da classe trabalhadora argentina, o modelo de reformas “gradualista” caiu por terra, entrando numa espiral errática sobre os caminhos do ajuste que levaram a recorrer ao FMI, a desvalorização do dólar e por fim, a novos picos inflacionários. Se pode dizer que as jornadas de 14 e de 18 de dezembro de 2017 feriram o governo, que seria derrotado eleitoralmente nas eleições primárias, dois anos mais tarde.

Dentre os acusados por “promover desordem” nessa data, estava o petroleiro de Chubut, ligado ao PSTU, Daniel Ruiz, militante desde muito tempo, dirigente e quadro dessa organização. Em meio à viragem de conjuntura, com Macri vendo seu apoio declinar, a linha de apertar a repressão e buscar fechar elementos do regime se colocou sobre a mesa; sem poder fechar o regime de forma mais ampla, por conta da relação de forças mais geral na sociedade, o governo, através da repressão seletiva encarcerou e perseguiu diversos dirigentes: Daniel é o símbolo.

O problema democrático na Argentina é central. Durante os últimos anos, manifestações de massa derrotaram qualquer tentativa de rever as decisões judiciais que buscavam reverter as punições aos genocidas da ditadura. A luta contra a repressão sistemática, a espionagem, a infiltração e pela demolição dos entulhos do regime militar é diária. Afinal de contas, os mais de 30 mil desaparecidos foram vingados com um potente movimento democrático, com direitos humanos e as mães e avós de maio à cabeça, que liquidou a junta militar e de forma profunda, impôs uma relação onde as Forças Armadas tiveram uma derrota objetiva e contundente. No Brasil, a transição para o regime de 88, em que pese avanços, não teve como marca a ruptura, senão a impunidade e o pacto com a cúpula militar.

Inclusive nessa semana, um dos casos mais importantes de repressão à ativistas foi reaberto: o caso que investiga a morte do líder mapuche Santiago Maldonado, que tinha sido dado por encerrado a mais de ano, como afogamento. Novas evidências reabrem a hipótese principal, de assassinato pela mão de agentes do Estado. As batalhas democráticas se completam. São fundamentais no momento que a Argentina passa pela pior crise econômica depois da debacle de 2001.

Daniel Ruiz também expressa a luta dos trabalhadores no presente momento, quando há uma rebelião na sua província natal, Chubut , que serve de exemplo para todo o país, no enfrentamento ao ajuste, à desvalorização salarial e aos planos de uma transição de governo que preserve o FMI.

O PSOL votou na sua Executiva Nacional a adesão à campanha internacional pela liberdade para Daniel Ruiz, liderada pela CSP-Conlutas, pela Rede Sindical de solidariedade e integrada por diversos movimentos sociais e democráticos. O PSOL integrará a caravana que vai a Argentina protestar e encontrar Daniel, bem como se fará presente nos atos que terão lugar no dia 12 no Brasil. Devemos buscar toda unidade de ação, moções de solidariedade para ampliar a campanha e colocar um ponto final nessa prisão política, com Ruiz voltando às ruas, livre para lutar por uma nova Argentina e por um mundo melhor.