Recentemente, começaram a vir à tona terríveis notícias que revelam o caráter das “tropas de ocupação” e o papel que estão cumprindo os “capacetes azuis” da Organização das Nações Unidas (ONU) no Haiti (Minustah). Num ataque ordenado pelo Conselho de Segurança da ONU, na noite de 24 de janeiro e nas seguintes, 400 soldados, protegidos por helicópteros, entraram nos bairros mais pobres da capital, Porto Príncipe, com tanques blindados e fuzis automáticos de alto poder de fogo. Estima-se que este ataque deixou, no mínimo, 70 mortos e dezenas de feridos, muitos deles crianças (Rebelión, 10/2/2007).

Uma das zonas mais castigadas foi Cite Soleil, onde 300 mil haitianos vivem em condições de extrema pobreza. Não satisfeitos em assassinar moradores indefesos, os helicópteros da ONU destruíram todos os tanques de água que abasteciam a região. A Minustah tem caminhões-pipa, mas, segundo denunciou a organização HIP (Haiti Information Project), entrega a água para especuladores privados que a revendem, o que obriga a população a caminhar vários quilômetros para encher um balde.

Este massacre não foi mais do que a continuidade da ação repressora que a Minustah vem realizando no país. Esta repressão chegou a tal ponto que, além das denúncias dos organismos de direitos humanos, o próprio embaixador norte-americano, James Foley, advertiu seu governo sobre “o uso excessivo ds força por parte da ONU”.

Um regime colonial
O Haiti é o país mais pobre da América, com indicadores econômico-sociais semelhantes às regiões mais pobres da África. Naquele continente, a sorte do país e de seu povo, certamente, seria relegada ao esquecimento. O Haiti, porém, está no Caribe, uma região chave para o imperialismo ianque, que a considera seu “quintal”, onde tem o direito de intervir política e militarmente. A última invasão dos marines se deu em 2004 para derrotar o então presidente Jean-Bertrand Arisitide, um sacerdote católico que ganhou prestigio nos subúrbios pobres de Porto Príncipe, em 1986, durante a luta que derrubou a sangrenta ditadura da família Duvalier.

Instalou-se, assim, um regime colonial sob ocupação militar. Pouco depois, para que Bush pudesse concentrar seu esforço militar no Iraque, os marines foram retirados e substituídos pelos “capacetes azuis” da ONU (cerca de dez mil soldados de diversos países, encabeçados pelo Brasil, com a participação de tropas da Argentina, do Chile e do Uruguai, entre outros). Tentou-se, assim, disfarçar a ocupação imperialista com tropas de “países irmãos” do continente.

Em 2006, no marco da ocupação, também para camuflar o caráter colonial da real situação, foram, realizadas eleições presidenciais. René Preval se impôs ao candidato apoiado pelo imperialismo (Leslie Manigat), o que significou, de fato, uma derrota para os planos imperialistas. Além disso, o povo haitiano se mobilizou para garantir que Preval assumisse. Tanto a votação quanto a mobilização mostraram sua grande insatisfação contra a ocupação. Ainda que Preval atue hoje como um fantoche da invasão, o processo de resistência continua.

As verdadeiras razões dos massacres
O pretexto utilizado pela ONU para este ataque é o de “perseguir bandos criminosos” que atuam nestes bairros. Estes bandos, entretanto, operam com o aval dos “capacetes azuis” e, em muitos casos, atuam como “esquadrões da morte” contra os ativistas que se opõem à ocupação, em cumplicidade com a Minustah. Estas são as verdadeiras causas dos massacres perpetrados pelos “capacetes azuis”.

A insatisfação contra a ocupação cresce constantemente e começou a expressar-se em ações de massas contra a Minustah e contra o governo de Preval. Por exemplo, no dia 16 de dezembro passado, como mostra um vídeo da HIP, “mais de dez mil pessoas se mobilizaram em Cité Soleil gritando ‘Abaixo Preval!´, exigindo a volta de Aristide, o fim da ocupação militar e a libertação dos presos políticos”. manifestações parecidas aconteceram em outros bairros da capital e em várias cidades do país. A imprensa estrangeira informa que um crescente fortalecimento do movimento Lavala, ligado ao ex-presidente Aristide. Os massacres são, então, uma tentativa de fortalecer a ocupação e controlar o país frente a uma situação que o jornal Lê Monde (27/12/2006) descreveu assim: “No Haiti, reina o caos”.

Os servos de Bush
Consideramos especialmente indigna que a maioria das tropas da MINUSTAH tenham sido enviadas por governos de Lula, Kirchner, Bachelet e Tabaré Vázquez, dirigidas pelo general brasileiro José Elito Carvalho Siqueira. Os povos latino-americanos têm uma grande dívida histórica de gratidão com o Haiti: a primeira nação independente do continente (como resultado de uma revolução de escravos negros) refugiou e ajudou financeiramente líderes da luta contra a colonização espanhola, como Francisco Miranda e Simón Bolívar.

Agora, esses presidentes, como verdadeiros servos do imperialismo, pagam esta dívida com uma invasão militar e uma criminosa repressão ao povo haitiano. Até o governo de Evo Morales, da Bolívia, é parte deste crime: Andrés Soliz Rada, ex-ministro boliviano de Hidrocarbonetos e Energia, denúncia que Evo “bloqueou todas as tentativas de impedir o envio de tropas bolivianas ao Congo e ao Haiti” (Rebanadas de realidad, 19/1).

Fora Minustah
A LIT-CI expressa seu total apoio e solidariedade com a luta do povo haitiano contra a ocupação da Minustah e por sua luta para recuperar a soberania do país. Denunciamos e repudiamos os massacres como uma nova mostra da crueldade do imperialismo para defender seus interesses. Neste sentido, coincidimos plenamente com a declaração emitida pelo coordenador do Comitê Democrático Haitiano na Argentina, quando exige “o fim das matanças e a retirada imediata da Minustah”.

Chamamos todas as organizações que se reivindicam antiimperialistas e democráticas a realizar uma grande campanha unitária de declarações, atos e manifestações. Chamamos também todos aqueles que repudiam a ocupação do Iraque a repetir essa unidade com relação ao Haiti, uma vez que o fato de fundo (uma ocupação imperialista) é o mesmo, ainda que no Haiti esteja disfarçada de missão de “paz”.

Esta campanha é especialmente necessária nos países latino-americanos, como Brasil, Argentina, Uruguai, Chile e Bolívia, para exigir dos governos que deixem de atuar como servos de Bush e retirem imediatamente seus soldados. Chamamos, em especial as centrais operárias desses países (a CUT brasileira, a COB boliviana, a CTA argentina, o PIT-CNT do Uruguai) que, independentemente de qual seja sua posição a respeito dos seus governos, sejam parte fundamental desta campanha.

Fora Minustah do Haiti!

Que os governos de Lula, Kirchner, Bachelet, Tabaré e Evo retirem imediatamente seus soldados!

Viva a luta do povo haitiano!

São Paulo, 14 de fevereiro de 2007