Governo pavimenta caminho para Alca e prepara a maior abertura econômica desde a era CollorAo contrário do que o governo Lula e o imperialismo norte-americano se esforçam em afirmar, as negociações para a implementação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca) estão longe de um impasse. Prova disso é a realização da 40 Cúpula das Américas entre os dias 4 e 5 de novembro em Mar del Plata, na Argentina. Mais um passo fundamental em direção à Alca será dado quando os chefes de Estado de 34 países do continente se reunirão para definir a posição da região para a Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC), que será realizada em dezembro, em Hong Kong.

Tanto na Argentina quanto em Hong Kong, o Brasil encabeçará os esforços para uma radical liberalização comercial dos países subdesenvolvidos. A posição que o governo Lula levará às negociações revelou-se no começo de setembro, quando um documento elaborado secretamente pelo Ministério da Fazenda para circular entre um grupo restrito de empresários vazou. O documento defende uma brutal diminuição da taxa mínima de importação, que de 35% passaria para 10,5%. Caso essa proposta se viabilize, será a maior abertura econômica desde o desastre neoliberal levado a cabo pelo governo Collor, entre 1991 e 1992.

O curto governo Collor marcou uma nova etapa no processo de recolonização do Brasil, dando a largada no processo de “globalização” da economia, que se aprofundaria durante toda a década de 90. O argumento elaborado pela equipe de Lula é exatamente o mesmo articulado pelo governo collorido há 15 anos: a redução das tarifas de importação forçaria a modernização e uma maior competitividade das indústrias nacionais. No entanto, a abertura comercial imposta por Collor arrasou setores inteiros da indústria nacional, causou a quebradeira de inúmeras empresas e simplesmente extinguiu algo em torno de 2 milhões de empregos.

Burguesia nacional pede salva-vidas
Tão logo foi divulgado, o documento provocou a reação imediata de importantes setores da burguesia nacional. O presidente da Fiesp, Paulo Skaf, chegou a afirmar que, da forma como está, o projeto não seria levado adiante. No entanto, longe de representar uma posição antagônica ao projeto do governo, o empresariado brasileiro vê como certa a liberalização comercial e reivindica tão somente uma compensação para garantir sua sobrevivência.

Como afirmou o empresário Jorge Gerdau, dono do Grupo Gerdau, à revista Istoé Dinheiro de setembro, “exigem eficiência dos empresários, mas não conseguem criar no Brasil as mesmas condições que os empresários têm em outros países”.

As “condições” exigidas pelos empresários brasileiros vão desde investimentos estatais no setor de infra-estrutra, como portos e estradas, a fim de beneficiar a produção para a exportação, desoneração das indústrias, e, principalmente, a flexibilização das leis trabalhistas, medida que Lula se comprometeu a implementar em sua gestão.

Com relação à infra-estrutura, o governo já aprovou as escandalosas PPP’s (Parcerias Público-Privadas), em que as grandes obras serão financiadas por investimentos privados, porém o retorno e o lucro desses investidores serão garantidos através de um fundo público. A redução dos impostos para o empresariado está sendo implementada pelo governo, que recentemente aprovou a Medida Provisória 255, alcunhada ironicamente de “MP do Bem”. A reforma Trabalhista, cujo início se daria com a aprovação da reforma Sindical, foi momentaneamente deixada de lado com a crise política, mas está longe de ser descartada. O governo já atua no sentido de aprovar uma reforma Sindical fatiada, sem precisar aprovar uma emenda constitucional.

Digitais do FMI
Como ocorre em todos os projetos encampados pelo governo Lula, a abertura comercial idealizada pelo Ministério da Fazenda segue à risca o plano do FMI para a América Latina, no qual se inclui a Alca. O documento oficial do fundo, “Contexto Mundial e as Perspectivas Regionais para a América Latina”, elaborado pelo diretor do Departamento do Hemisfério Ocidental do FMI, Anoop Singh, é esclarecedor nesse sentido.

O estudo, em que o FMI identifica uma desaceleração econômica mundial para 2006, “sugere” aos países da América Latina e do Caribe, considerados ainda muito fechados para a economia internacional, “fomentar uma maior abertura comercial e o investimento estrangeiro direto”. Para isso, os governos dos países latino-americanos deveriam aprofundar as reformas iniciadas na década de 90, entre elas medidas para “eliminar distorções custosas, como, por exemplo, a reforma do mercado de trabalho, que ajudaria a melhorar o clima para o investimento e criaria uma base mais firme para a atividade econômica”.

No entanto, todos esses planos do FMI estariam comprometidos pelo que o fundo denomina de “instabilidade política” da região. Na verdade, o organismo se refere aos processos revolucionários que sacudiram diversas regiões do continente, que derrubaram, através da mobilização popular, governos eleitos. Para se contrapor a isso, o FMI considera essencial a consolidação do “Estado de Direito”, que garantiria tranqüilidade aos investidores, e aponta os processos eleitorais do próximo ano como fundamentais nessa consolidação.

“Instabilidades políticas prejudicam a atração de investimentos para a região. Desde 1990, 11 governos eleitos não terminaram seus mandatos e, desses, seis que os substituiriam também não terminaram”, afirmou o secretário-geral da OEA (Organização dos Estados Americanos), José Miguel Insulza, ao jornal Folha de São Paulo do dia 30 de outubro.

Próximo capítulo: Mar del Plata
As negociações na Argentina e a rodada Doha da OMC são os próximos passos para a internacionalização da economia, ou seja, a ofensiva recolonizadora do imperialismo sobre os países subdesenvolvidos. Ainda de acordo com Insulza, “em Mar del Plata, dar um passo com relação à Alca significa ter uma posição conjunta para levar ao encontro de ministros da Rodada Doha”.

A declaração do secretário da OEA contraria a idéia difundida pelo governo brasileiro e pela grande imprensa de que a Alca seria uma medida cada vez mais distante. Temendo mobilizações de massas contra o acordo, os governos costuram a Alca através de acordos multilaterais e abertura econômica, como a que projeta o governo brasileiro. No entanto, a realidade mostra que tanto Lula quanto Bush estão convictos na imposição da Alca o mais rápido possível.

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