No último dia 5 de julho, mais um jovem negro da periferia foi morto. Desta vez foi Daniel Pellegrine, 20 anos, conhecido como MC DaLeste, em referência à região da periferia de São Paulo em que ele cresceu. Daleste foi assassinado em Campinas, no interior do estado, enquanto se apresentava durante uma quermesse em um condomínio do CDHU, na periferia da cidade.

Apesar de não nos identificarmos de forma alguma com o estilo musical de Daleste que, na sua enorme maioria, gira entre os chamados “proibidões” (de apologia à criminalidade) e o “funk ostentação” (que prega a ascensão social e o desejo de uma vida luxuosa), não podemos deixar de denunciar mais este crime contra a juventude negra e de nos solidarizarmos com seus familiares e fãs.

Seu estilo artístico, afinal, assim como sua própria vida, são reflexos das inúmeras contradições de um sistema racista e opressor que, ao negar oportunidades e direitos para a juventude negra, a empurra para escolhas muitas vezes equivocadas, colocando nossos jovens na linha de tiro, tanto da criminalidade (alimentada pelas péssimas condições de vida) quanto dos agentes de repressão (fardados ou covardemente escondidos pelas máscaras-ninja dos esquadrões da morte).

Um verdadeiro genocídio
Nos últimos três anos, mais de cinco funkeiros foram assassinados em São Paulo. Isso, considerando apenas os casos que alcançaram a mídia e sem contar dezenas de outros jovens do movimento hip hop e outros grupos da periferia. Essas mortes são o retrato do verdadeiro genocídio que a população negra e pobre sofre todos os dias nas periferias, como, por exemplo, foi revelado por uma pesquisa realizada em 2011 e publicada no portal “Clipping”, pelo sociólogo Júlio Jacobo, que mostra que a cada três negros que morrem, um branco perde a vida no Brasil.

Muitas destas mortes são atribuídas à “guerra do tráfico”, mas, com uma freqüência cada vez maior (devido à pressão do movimento), sabemos que a história é bem diferente. Exemplo lamentável disto foi o assassinato do DJ Lah, do “Conexão do Morro”, em janeiro passado, chacinado juntamente com outros sete jovens (por 14 encapuzados), depois da denúncia, através de um vídeo, do assassinato do servente Paulo Batista do Nascimento pela polícia.

Para nós da Secretaria de Negros e Negras do PSTU – que ajudamos na construção do Quilombo Raça e Classe, filiado à CSP-Conlutas – todas estas mortes se dão pelo fato de que no Brasil há uma política permanente de genocídio da juventude negra e pobre, praticada diretamente pelas forças de repressão do Estado ou alimentada pela miséria que os joga para a criminalidade e, inclusive, instiga disputas e tragédias entre os próprios jovens.

Devemos identificar primeiro quem é o nosso inimigo. Será mesmo que é o nosso irmão? Que é da nossa cor? Que mora na mesma periferia que nós? Que é tão pobre quanto nós? Ou será o governo, que não oferece segurança, nem saúde, nem educação, nem cultura? Que treina sua polícia para “enquadrar” o negro que é mais suspeito a um branco?

A história de Daleste, com certeza, poderia ser bem diferente. Assim como milhões de outros jovens, ele também estava impactado pelas recentes mobilizações que varreram o país e deixou, como uma de suas últimas criações, uma música bastante distinta dos “proibidões” e da”ostentação”, com o título “O gigante acordou”, que entre seus versos dizia:

“Que pais é esse que tem vários interesses
Mesmo me sufocando com impostos
Não vou desistir
Deixei de última hora
Mas minha hora é agora

Desculpe pelo transtorno
Mas estou mudando o meu país
Através da minha voz
Falo por todos nós
Sonhos e sonhos se destroem

(…)

Violência é a tarifa
Eu sou protestante
Coração valente
Na selva de pedra
Eu grito o que só vai depender da gente”

O sonho de Dalestes, como de tanto outros jovens que tiveram suas vidas brutalmente abreviadas, estava apenas começando. Mas continua vivo para milhões de outros que vagam pela periferia. Por isso, é necessário que a juventude das periferias se una e lute contra o verdadeiro inimigo que “assassina” nossos sonhos:  o sistema capitalista, que mata um jovem negro, seja num palco ou numa viela.

A Secretaria de Negros e Negras do PSTU e o Movimento Quilombo Raça e Classe lamentam a morte de MC Daleste e de todos os outros mc’s, assim como também lamenta a morte de todos os jovens que morrem nas periferias todos os dias. Lutamos e lutaremos para que a juventude negra possa sair e possa voltar para casa com vida.

Não aceitaremos que nossos jovens continuem morrendo!

A juventude negra tem direito ao futuro!

Pelo fim do genocídio da juventude negra!

Pelo fim da guerra interna na periferia!