Quando a divulgação do plebiscito pela anulação do leilão da Vale do Rio Doce acabava de ir às ruas, a direção da CUT resolveu golpear duramente a unidade da campanha a fim de proteger o governo Lula, que já enfrenta desgaste com os escândalos de corrupção e a crise aérea. Mas a tentativa foi frustrada e acabou sendo um tiro pela culatra, aprofundando o desgaste da central.

A preparação do plebiscito contra a privatização da Vale foi definida durante a plenária nacional da Assembléia Popular, nos dias 16 e 17 de junho em Brasília. Em determinado momento, a plenária da assembléia, que congrega diversos setores como MST, Conlutas e Grito dos Excluídos, foi interrompida para que se instaurasse a reunião do Comitê pela Anulação do Leilão da Vale. Isso porque o comitê agrega ainda mais forças.

Após horas de exaustivas discussões, os mais de 30 entidades e movimentos presentes em Brasília definiram as quatro perguntas do plebiscito de setembro. Definidas as questões, os estados e as entidades de base já começavam a divulgar seus materiais quando foram surpreendidos por um anúncio da CUT.
A direção da central afirmou que a entidade não participaria do plebiscito se este contivesse mais questões além da pergunta sobre a Vale, desconsiderando todo o processo de preparação da campanha até então. A partir daí, a direção da CUT pressionou pela realização de uma reunião extraordinária do comitê, que ocorreu no dia 28 de julho em São Paulo.

Show de autoritarismo
Na reunião, longe de querer rediscutir as questões do plebiscito com as demais entidades, o que por si só já seria um absurdo, a CUT se limitou a informar que, caso não houvesse apenas uma questão, a “unidade” estaria comprometida.

Através de seu dirigente nacional Antônio Carlos Spis, a central propôs que o comitê indicasse apenas uma questão, sobre a privatização da Vale. A partir daí, os setores e os comitês que desejassem poderiam incluir suas lutas específicas no plebiscito.

Para a CUT, a questão sobre a reforma da Previdência e os demais problemas levantados pelo plebiscito não passavam de “questões específicas”. A atitude da central é uma estratégia deliberada de barrar uma luta contra a reforma que se choque com o governo Lula. Para isso, contaram com o apoio da UNE, que defendeu a mesma posição, mostrando a real política do PCdoB.

Conlutas defende democracia e unidade
Em nome da Conlutas, Luiz Carlos Prates, o Mancha, do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, lembrou o esforço da coordenação na construção da unidade, que se expressou no encontro de 25 de março e nas mobilizações de 23 de maio, apesar das diferenças.

“Seguindo esse esforço, o encontro realizado em Brasília em junho definiu as quatro perguntas como uma necessidade de construir a unidade entre um amplo conjunto de forças”, disse Mancha. Ele disse ainda que a Conlutas levará as quatro questões. “Reivindicamos as quatro perguntas e todo o processo que levou a esse acordo. Por uma questão política e democrática, não aceitaremos a chantagem da CUT”.

O MST vinha defendendo o plebiscito com as quatro perguntas. Mas, infelizmente, João Pedro Stédile, representando a direção do movimento, fez uma proposta equivocada de que o plebiscito tivesse apenas uma questão e que fosse autorizado às entidades acrescentar mais perguntas.

A atitude sectária da CUT provocou repulsa entre a grande maioria das entidades presentes. “Por que está sendo chamada essa reunião se os espaços da campanha já estavam abertos?”, questionou Isabel, do comitê do Paraná. No estado, a campanha com as quatro perguntas já está nas ruas, contando com a participação, inclusive, de inúmeros sindicatos cutistas. Situação parecida ocorre no Rio e em São Paulo. Representantes de Campinas e da Baixada Santista também informaram que a campanha nessas regiões aborda os quatro temas.

A Intersindical também informou que trabalhará com as quatro questões. “A CUT defende uma só pergunta porque a privatização da Vale se deu no governo FHC, enquanto as outras três questões estão sendo encaminhadas por este governo”, afirmou Mané Melato, representante da entidade.

Paulo Pedrini, da Pastoral Operária de São Paulo, se revoltou com a atitude da CUT. “Não se pode dizer que não havia conhecimento da reunião em Brasília. A formulação dessas questões foi fruto de um debate tenso”, afirmou. O dirigente denunciou ainda o papel da CUT. “O que está sendo proposto aqui é uma ruptura”.

Preparar o plebiscito combatendo a manobra
A decisão final da reunião foi a de manter o plebiscito e autorizar a confecção de duas cédulas: uma com as quatro perguntas e outra com uma questão apenas (exigência da CUT e do PCdoB). A maioria das organizações presentes se comprometeu a trabalhar com as quatro perguntas que serão utilizadas por Conlutas, pastorais sociais, Grito dos Excluídos, MST, Intersindical, MAB e demais setores que participam da Assembléia Popular.

A cédula com apenas uma pergunta será utilizada por CUT e UNE. Isso significa que a manobra dessas entidades foi parcialmente derrotada, pois a maioria das entidades se propõe a trabalhar com as quatro questões. Mas essa pressão vai seguir na base. A preparação do plebiscito deverá refletir uma luta política entre aqueles que buscam cobrir a política do governo Lula e os que querem combater essa política neoliberal e a reforma da Previdência.

O “argumento” da CUT e dos que apóiam a manobra é a falsa defesa da “unidade”. Somos firmes defensores da união, mas aquela dos trabalhadores para lutar. O que a CUT defende é a unidade com o governo Lula, que está aplicando o plano do grande capital. Ou seja, o que CUT e UNE defendem não é a união dos trabalhadores, mas a unidade com a burguesia. Na prática, isso significa aceitar sem luta a derrota e o plano de reforma da Previdência.

Isso desmascara a intenção da CUT, que vinha divulgando posições contrárias à reforma da Previdência. O plano deles é evitar o desgaste se colocando contra, mas ao mesmo tempo barrando todas as lutas concretas contra a reforma. É o mesmo papel dos burocratas nos sindicatos, que estão a serviço dos patrões e falam a favor de aumentos salariais, mas impedem qualquer greve.

É importante disputar as bases da CUT e do PCdoB em cada estado ou região e discutir em cada sindicato a necessidade da campanha contra a reforma da Previdência. É preciso dizer que não há mudança na política econômica sem enfrentar o problema da dívida pública e falar da importância da pergunta sobre tarifa de energia e, portanto, da necessidade das quatro perguntas no plebiscito.
Post author Diego Cruz e Eduardo Almeida, da redação
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