Mobilização dos bancários poderia ter arrancado muito mais
Agência Brasil

No último dia 27 de setembro, quinta-feira, foi escrita mais uma página vergonhosa na história do movimento sindical brasileiro. A greve dos bancários, deflagrada no dia 18, foi totalmente desmantelada pela CONTRAF (Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro, entidade orgânica à Central Única dos Trabalhadores), que abandonou a luta pelas reivindicações dos bancários para, mais uma vez, se colocar na defesa do Governo Dilma.

Uma proposta ridícula diante de tantos lucros
Já no mês de setembro, após várias rodadas de negociação, os banqueiros e o Governo Dilma apresentaram uma proposta de 6% de reajuste, que na prática apenas iria repor a inflação do período. Com isso, os bancários foram à greve com a certeza de que era possível conquistar muito mais, pois se trata do setor da economia mais lucrativo do Brasil, batendo recordes – tanto nos bancos privados como nos estatais – ano após ano.

Após uma semana de greve, os banqueiros foram forçados a aumentar e ceder, e apresentaram uma proposta de reajuste de 7,5%. Essa proposta foi resultado da forte adesão da categoria à greve (principalmente nos bancos públicos), mas ainda estava muito aquém tanto das reivindicações da categoria, como das condições financeiras dos bancos.

Nos últimos 16 anos (de FHC, passando por Lula e até chegar ao Governo Dilma) os lucros dos cinco maiores bancos do país (Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Itaú-Unibanco, Santander e Bradesco) atingiram um percentual de 1.575%. Isto significa que somente os maiores bancos brasileiros tiveram uma lucratividade média de 112% ao ano. Por outro lado, os percentuais dos salários dos bancários no mesmo período são bem diferentes. Os trabalhadores dos bancos privados acumulam desde a época do Plano Real até hoje uma perda salarial de aproximadamente 26%. Nos bancos públicos, a perda é ainda maior: os bancários do Banco do Brasil sofrem com uma defasagem de 86% e os da Caixa Econômica Federal aproximadamente 98, sem falar nos demais bancos (BNB, BASA, BANPARÁ, etc.).

A greve, que estava com uma forte adesão (mais de 9 mil agências em uma semana de paralisação) e ainda estava no início, tinha, portanto, força para arrancar muito mais.

Dilma não governa para os bancários
Apesar da alta adesão dos bancários à greve, a categoria teve que se enfrentar com a intransigência do Governo Dilma, que desde o início se negou a atender as reivindicações dos trabalhadores.

O discurso de Dilma foi sempre no mesmo tom: não era possível conceder aumentos acima da inflação, pois isso comprometeria as contas do governo. Mas as medidas adotadas por Dilma nos últimos meses são suficientes para desmentir tudo isto. Bastaram as ameaças da crise econômica internacional voltarem a rondar o Brasil para Dilma lançar um plano de incentivos aos grandes empresários que, dentre outras coisas, privatiza os portos, aeroportos e rodovias brasileiras e ainda prevê financiamento público do BNDES para as empresas envolvidas nas operações.

Mas esse pacote de concessões – que de tão pró-patronal foi chamado de “kit felicidade” por, Eike Batista, um dos maiores empresários do país – não foi a única medida a demonstrar que o Governo Dilma poderia contemplar as reivindicações dos trabalhadores dos bancos públicos. Durante a greve, o Banco do Brasil – que é de propriedade acionária estatal – montou uma megaestrutura de contingências (prédios comerciais alugados com tecnologia e logística para fazer funcionar as operações do banco realizadas por fura-greves) que custavam em média 200 mil reais cada. Isto mostra que o Governo Dilma, se quisesse, poderia atender as reivindicações dos bancários, desde que seu critério fosse governar para os trabalhadores, e não para os maiores empresários do Brasil.

Ao contrário disto, o governo do PT não apenas se negou a atender as reivindicações dos trabalhadores, como procurou a todo o momento desmantelar a greve, com a ajuda do sindicalismo governista da CUT.

A subordinação da CUT aos interesses dos banqueiros e do governo
Como se não bastasse a necessidade de enfrentar o setor mais poderoso da economia e o governo federal, os bancários em greve ainda tiveram que – mais uma vez – lutar contra um sindicalismo totalmente subordinado aos interesses patronais.

Desde os fóruns preparatórios, a CONTRAF/CUT, definiu uma pauta de reivindicações que foi encabeçada por um índice de reajuste salarial de 10,25%, que não representa sequer a metade das perdas sofridas pelos trabalhadores dos bancos privados. Ou seja, enquanto os banqueiros lucram bilhões, a própria entidade sindical que representa a categoria nas negociações se nega a explorar o crescimento dos lucros da patronal com uma pauta que possa avançar de verdade na reposição das perdas que a categoria sofreu ao longo dos últimos 18 anos.

Mas isto tem um motivo. Para que o governo do PT não seja colocado na berlinda a cada greve dos bancários, foi instituída uma Mesa Única que conta somente com a presença dos banqueiros e o que sai dessa negociação seria teoricamente estendido também aos trabalhadores dos bancos públicos. No entanto, como as negociações de reajuste salarial são definidas numa mesa com a FENABAN, o governo se nega a negociar diretamente com os trabalhadores, sob a justificativa de que respeita a Convenção Coletiva Nacional da categoria. A CONTRAF/CUT, ao defender fervorosamente esse modelo de negociação nos dias de hoje, tem ajudado bastante o Governo Dilma, assim como ajudou a Lula: os bancários dos bancos públicos praticamente não avançaram em nada nas suas reivindicações específicas e a categoria até hoje nunca repôs as suas perdas.

Na greve deste ano, a CUT passou dos limites. Em função da intransigência dos banqueiros e de Dilma, as propostas apresentadas aos trabalhadores foram muito rebaixadas. Além do reajuste de 7,5% ser muito baixo se comparado aos lucros do sistema financeiro, os trabalhadores dos bancos privados não conquistaram a estabilidade no emprego e os dos bancos públicos não avançaram quase nada em suas reivindicações específicas. Ao contrário, a direção dos bancos estatais e o Governo Dilma, não satisfeitos com a proposta de reajuste sobre o piso salarial da categoria (8,5%), simplesmente se negaram a acompanhar a íntegra da proposta da FENABAN e reajustaram o piso salarial dos bancários do Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal em apenas 7,5% (o mesmo índice de reajuste proposto pelos banqueiros sobre todas as verbas), mostrando a farsa que é a história da Mesa Única.

A postura da CUT diante desse golpe foi vergonhosa: orientou a aceitação do acordo e o fim da greve com compensação de dias parados, mesmo diante de itens que na prática retiram direitos – como é o caso da proposta do Banco do Brasil sobre a jornada de 6 horas, condicionada a uma suspensão de ações judiciais movidas contra o banco, muitas delas em fase bastante avançada.

O posicionamento da CONTRAF/CUT frente a um golpe da patronal e do governo no curso de um processo de luta dos trabalhadores demonstra como o sindicalismo cutista está cada vez mais subordinado à lógica e aos interesses do governo e dos banqueiros.

A greve mostrou que com mobilização é possível vencer
Apesar do acordo insuficiente, do controle quase absoluto que a CUT tem sobre a maioria dos sindicatos de bancários do país (cerca de 90% das entidades sindicais têm direções cutistas à frente) e da audácia das manobras com as quais seus sindicatos enterraram o movimento, alguns episódios desta greve mostraram que com mobilização os trabalhadores podem superar todos esses obstáculos.

Em Belém, os trabalhadores do BANPARÁ (Banco do Estado do Pará) aprovaram no encontro específico da categoria um índice de reajuste de 15%, contrariando o sindicato (dirigido pela CSD/CUT), que inclusive protocolou junto ao banco uma pauta com reajuste de 10,35% (o mesmo apresentado para a FENABAN). E mesmo começando a greve antes do calendário nacional definido pela CONTRAF/CUT, os trabalhadores conseguiram o mesmo acordo fechado nacionalmente, mas com anistia total dos dias parados.

Os bancários da Caixa Econômica Federal também deram uma demonstração de força. Na noite do dia 26 de setembro, quando a CONTRAF/CUT já tinha orientado a aceitação da proposta e o fim da greve, os trabalhadores derrotaram as direções sindicais na maior parte dos sindicatos do país, aprovando a continuidade da greve. Lamentavelmente, no dia seguinte, os sindicatos da CUT chamaram assembléias “relâmpagos” e, numa operação unitária com a direção da Caixa, lotaram as assembléias de gestores, acabando de vez com o movimento.

Apesar dessa ação vergonhosa da CUT, ficou a lição de que quando os trabalhadores agem coletivamente, é possível vencer os banqueiros, o governo e inclusive os agentes do movimento que se colocam a serviço dos patrões. Isto precisa ser resgatado nas próximas mobilizações e só desse modo os trabalhadores podem impedir as traições dos sindicatos da CUT.

Para vencer os patrões e as traições da CUT, é preciso organização
Além da dureza que é comum a qualquer enfrentamento com os banqueiros e com um governo que conhece de perto as táticas do movimento sindical, as traições das direções sindicais ajudam a desenvolver mais desconfiança, descrédito e desmobilização dos trabalhadores. É por essa razão que muitos bancários aderem às paralisações, mas resistem em participar das assembléias e das atividades da greve: os trabalhadores perdem a confiança quando são traídos pela própria entidade que devia representá-los.

Contudo, a única forma de enfrentar esse problema é com a organização coletiva. A primeira resposta dos bancários deve ser a total solidariedade aos trabalhadores que se mantiveram em greve após o dia 26. O Governo Dilma, através das direções do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal, está ameaçando esses trabalhadores com desconto. A outra resposta, não menos importante, deve ser um “não” a qualquer compensação de horas decorrentes de paralisação da greve.

Sabendo que a CUT não está ao lado dos trabalhadores nessas lutas é que surgiu o Movimento Nacional de Oposição Bancária (MNOB), que hoje é filiado à CSP-Conlutas. Desde então, o MNOB vem fazendo um chamado a todos os trabalhadores que não têm acordo com os absurdos protagonizados pela CONTRAF/CUT, para construir e fortalecer uma alternativa diante da traição e da falência política da atual direção do movimento.

Após mais esta greve, o MNOB/CSP-Conlutas convida os bancários de todo o país para fortalecer as próximas lutas, contra os ataques dos banqueiros, do governo e dos seus agentes dentro do movimento sindical.