O capitalismo funciona através de ciclos de expansão e retração. Vivemos, nos últimos cinco anos, uma expansão que, agora, chega a seu final. E, a depender “deles”, a humanidade terá que pagar, com anos de mais miséria e desemprego, a continuidade do capitalismo.

Para entender a crise temos que analisar o funcionamento do capitalismo e como se cria o valor e o lucro. O capitalista tem seu lucro após o ciclo de produção e venda da mercadoria. Primeiro, ele precisa de um investimento, ou capital. Marx dividia esse capital em “constante” e “variável”. “Capital constante” é o investimento em máquinas e matérias-primas. O “capital variável” é o gasto com os salários dos trabalhadores.

A taxa de “mais-valia” é a relação entre o que foi investido nos salários e a totalidade do valor produzido. O lucro do capitalista vem, portanto, da parte do valor produzido pelos trabalhadores que não lhes foi pago por meio dos salários. É o trabalho não pago (mais-valia), embolsado pela burguesia.

A taxa de lucros é a relação entre a mais-valia e o capital total envolvido na produção. Em outras palavras, é o retorno do investimento realizado.

Para enfrentar a concorrência e aumentar sua lucratividade, o capitalista amplia o investimento em máquinas e matérias-primas, a fim de produzir mais e baratear seus produtos.

Num primeiro momento, isso pode elevar os lucros da empresa. Porém, isso também aumenta a proporção dos custos com equipamentos e matérias-primas (ou seja, com “capital constante”) sobre o capital empregado no pagamento dos salários. Com isso, a taxa de lucro tende a diminuir. Por isso Marx fala em “queda tendencial da taxa de lucro” no capitalismo.

Os capitalistas tentam reverter essa tendência com o desenvolvimento da tecnologia e o aumento da taxa de mais-valia através da exploração direta do trabalhador (com a diminuição dos salários e o aumento da jornada de trabalho).

Mesmo assim, a taxa de lucros termina caindo, e os capitalistas param de investir, determinando novas crises. As crises queimam capital com o fechamento de empresas e forçam a redução dos salários dos trabalhadores, até que se possibilitem novos investimentos com custos baixos, uma nova elevação da taxa de lucros e um novo período de investimento e crescimento.

A avaliação marxista das crises deve ter, portanto, uma atenção voltada para a evolução da taxa de lucros das grandes empresas imperialistas, em particular da economia dos EUA. Durante o “boom” econômico do pós- guerra, essa taxa girou ao redor de 15% a 20%. A crise que marcou o fim desse período derrubou essa taxa para algo entre 8% e 9%.

As décadas de 80 e 90 – com a globalização da economia e a restauração do capitalismo no Leste Europeu – permitiram ao imperialismo recuperar parcialmente a taxa de lucros, ainda que sem chegar aos níveis do “boom” do pós-guerra. Isso possibilitou elevar a taxa de lucros para 10% (na década de 80) e a 13%, no final dos anos 90.

A crise passada, de 2000-2001, baixou esta taxa para 6%. No crescimento dos últimos anos, ela se elevou novamente para cerca de 12%. Segundo o The Wall Street Journal, essa taxa caiu 8,4% no último quadrimestre de 2007. Trata-se da primeira queda da massa dos lucros desde a recessão passada.

Esse é o centro que determina o início da crise, e não os outros fatos destacados na imprensa, como a evolução das bolsas ou do mercado financeiro. Como veremos, no entanto, esses outros fatores podem agravar o processo.

A possibilidade de uma crise maior
A crise anterior, em 2000-2001, teve pesadas conseqüências para a América Latina. A Argentina, por exemplo, que era um símbolo do neoliberalismo, retrocedeu brutalmente, perdendo parte importante de sua indústria.
No entanto, a economia dos países imperialistas (que geraram a crise) sofreu pouco. A queda do PIB nos EUA foi só de 0,4%, e a recessão durou menos de um ano.

Para sair da crise, o imperialismo norte-americano aumentou fortemente os gastos armamentistas (financiando as invasões do Iraque e do Afeganistão), reduziu a taxa de juros a praticamente zero e cortou os impostos das grandes empresas. Assim, conseguiu sair rapidamente da crise, mas ao custo de ampliar as contradições que agora estão explodindo.

Foi neste processo que a especulação imobiliária foi facilitada (com financiamentos com juros baixíssimos). E é isto que, agora, está vindo abaixo. O corte de impostos e o aumento dos gastos militares aumentaram, em muito, os déficits da economia dos EUA, que hoje dependem de um fluxo de empréstimos de dois bilhões dólares por dia para manter a economia funcionando.

Como vimos, é a evolução da taxa de lucros que determina os ciclos da economia. Mas as crises não são iguais umas às outras. E o grau de parasitismo financeiro acumulado em nível mundial pode, agora, agravar enormemente a crise cíclica.

A gigantesca montanha de capital financeiro existente no mundo se originou de uma parte da mais-valia que os capitalistas preferiram aplicar na especulação e não na produção. Mas, a partir daí, existiu um descolamento crescente deste capital da produção real, gerando o “capital fictício”. Só a produção real gera valor, e os ganhos do capital fictício são um jogo de soma zero (se alguém ganha, outro tem que perder). Quanto mais cresce, maior será a queda. Só o mercado de derivativos (um das formas de especulação) era, em 2006, seis vezes maior que o PIB mundial.

A crise do mercado imobiliário norte-americano é ilustrativa. Novas casas eram vendidas com taxas de juros baixíssimas e os bancos usavam as hipotecas como títulos, vendidos nos mercados financeiros. O negócio, aparentemente rentável a todos, se assemelha às “pirâmides” conhecidas por nós. Os lucros fictícios alimentavam valorizações irreais nas bolsas de valores. Porém, o castelo de cartas começou a ruir quando os tomadores de empréstimos começaram a não pagar mais suas dívidas.

Agora os grandes bancos norte-americanos, europeus e japoneses estão em crise aberta e já perderam US$ 353 bilhões em valor de mercado (pela queda nos preços de suas ações). Além disso, os prejuízos destes grupos já chegam a US$ 120 bilhões e podem alcançar US$ 500 bilhões em 2008.

É possível que esses bancos não tenham capital para bancar essas perdas e existe a possibilidade de falências e crises bancárias sem precedentes no pós-guerra. George Soros, por exemplo, um conhecedor do assunto (por ser ele próprio um dos maiores especuladores do mundo) afirma que essa crise será a maior desde a segunda Guerra Mundial.

Quais são as perspectivas?
A dessa gravidade da crise já está definida de antemão? Não. Os governos imperialistas têm um arsenal de instrumentos para tentar diminuí-la ou repassá-la para os países dependentes. Mas essas ações têm um limite, exatamente pelo agravamento das contradições acumuladas ao sair da crise de 2000-2001.

Até agora, o efeito das medidas têm sido muito pequeno. O governo Bush lançou um pacote de US$ 145 bilhões para retomar o crescimento. No dia seguinte, as bolsas de todo o mundo caíram fortemente. O Banco Central dos EUA cortaram os juros em 0,75% e Bush chegou a um acordo com o congresso para impor medidas econômicas. As bolsas reagiram positivamente por dois dias, para retomar a queda logo depois.

Está claro, portanto, que a crise começou. Mas não há certezas sobre suas perspectivas. Mesmo assim, é importante considerar, desde já, a possibilidade de que ela tenha uma gravidade bem maior que a de 2000-2001.

O crescimento econômico dos últimos seis anos foi um importantíssimo fator político de estabilidade para governos como o de Lula (assim como da ditadura chinesa). Agora tudo isso está questionado.

Não existe uma relação automática entre crises econômicas e ascensos revolucionários. Vários fatores interferem na evolução das classes sociais em luta, como a dimensão das mobilizações, o peso das direções, etc.

Mas é inegável que a crise anterior (2000-2001) esteve na base de grandes comoções na América Latina, como as insurreições que derrubaram governos na Argentina, Equador e Bolívia, assim como na vitória eleitoral dos governos de “centro-esquerda” (como Lula e Evo Moralez). Agora, as crises políticas cairão no colo desses governos e da democracia burguesa.

A evolução da luta de classes também interfere na dinâmica econômica. A resistência iraquiana, por exemplo, colocou claros limites à exploração do petróleo pretendida pelo governo Bush. A não concretização da Alca também afetou a pretendida ampliação dos lucros das empresas norte-americanas.

É possível que, mais do que a uma nova crise cíclica, estejamos assistindo ao início de um novo período de grandes comoções sociais e políticas em todo o mundo.

  • Veja o gráfico animado e entenda a crise no coração do império
    Post author Diego cruz e Eduardo Almeida, da redação
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