Há pouco mais de uma semana, os governos dos países imperialistas tentaram um superpacote de salvamento do capitalismo. Em uma ação inédita na história, anunciaram o gasto de cerca de US$2,5 trilhões, para capitalizar ou nacionalizar empresas financeiras falidas em todo o mundo. Juntando com os pacotes feitos antes e depois, os gastos neste ano chegam a quatro bilhões de dólares. Os efeitos, no entanto, foram os mesmos dos pacotes anteriores: a crise seguiu se aprofundando.

Essa não é uma crise financeira, mas uma crise de superprodução clássica do capitalismo. Os governos estão fazendo reformas no telhado, mas são os alicerces da casa que estão se movendo.

Como em todos os ciclos da economia capitalista, a queda na taxa de lucros fez com que as grandes empresas diminuíssem os investimentos, desencadeando-se a crise. Por isso, a crise mundial está se estendendo e aprofundando em todo o mundo, apesar dos pacotes.

O centro que determina a evolução da economia internacional, a indústria dos EUA, caiu 2,8 % em setembro, na pior queda em 34 anos. Os índices apontam claramente a redução na produção dos principais países imperialistas.

Existe hoje uma superprodução na economia e o capitalismo não tem outra maneira de resolvê-la se não através de uma crise com falências de empresas, desemprego e miséria.

Uma montanha de capital fictício está derretendo
Mas as crises cíclicas não são iguais entre si. Esta é uma crise que está sendo agravada por uma brutal crise financeira. Não se trata apenas de uma crise financeira, mas de uma crise de superprodução agravada por um verdadeiro “crack” (quebra) financeiro.

Está derretendo nesse momento uma montanha de capital fictício, como Marx chamava os títulos envolvidos na especulação financeira sem respaldo na produção real.

Durante os últimos vinte, trinta anos da globalização, o parasitismo do capital se ampliou enormemente, com o desenvolvimento fantástico do capital financeiro. As empresas especularam com ações, moedas e todo tipo de títulos.

Uma ação de uma empresa significava simplesmente a expectativa de participação nos lucros dessa empresa, e tinha um preço nas bolsas em função do desempenho da mesma. Através da especulação nas bolsas, no entanto, a mesma ação teve um enorme aumento de preço. Tudo era transformado em títulos e negociado com esquemas de alavancagem em que a especulação podia ampliar os lucros pela simples suposição de que o esquema cresceria sempre. As carteiras de dívidas hipotecárias dos bancos, por exemplo, foram transformadas em títulos e negociadas por preços ainda maiores, até que veio a crise e a casa começou a cair.

Uma gigantesca pirâmide de capital fictício tinha se formado. Não existem cálculos precisos, mas se fala em algo entre US$300 e US$500 trilhões, ou seja, algo em torno de seis a dez vezes o PIB mundial (cerca de US$50 trilhões). É essa montanha que agora está se derretendo por não ter correspondência na produção real.

Para continuar com a imagem da casa usada no início desse artigo, mesmo os US$4 trilhões torrados pelos governos imperialistas tampouco são suficientes para tapar um buraco dessas dimensões no telhado.

É por isso que ações de empresas se desvalorizam rapidamente, como as do banco Morgan Stanley que caíram de US$70 (há menos de um ano) para US$8,55 (uma queda de 87 %) na Bolsa de Nova York. Ou a ação da Sun Sistems, que caiu de US$25 para US$5,21 no mesmo período (quase 80 %), ou da GM de US$43 a US$5,81, (mais de 80%).

Essa crise financeira agora limita o crédito para a produção e para o consumo (parte fundamental do funcionamento da economia capitalista), ampliando a recessão que já tinha se iniciado.

Já está claro que estamos no início da maior crise do capital desde 1929. E existe a possibilidade de que se transforme em uma depressão semelhante ou ainda pior do que ela.

Falências de grandes empresas e países
O capitalismo resolve suas crises destruindo capitais, fechando empresas e desempregando bilhões de pessoas. Em geral os primeiros a serem atingidos são as empresas mais fracas, se ampliando o grau de concentração e centralização do capital. Mas também podem levar à falência grandes empresas.

Estamos apenas no início e algumas grandes multinacionais já estão à beira da falência, como a GM, a maior produtora de automóveis do planeta. Evidentemente, pode ser que escape, pelos mesmos motivos pelos quais foram salvos grandes bancos, ou seja, pela injeção de dinheiro público.

Mas isso não afeta apenas as empresas, atinge também países inteiros. Na crise passada, de 2000-2001, vimos como quebrou a Argentina, que viu sua economia sofrer um retrocesso só comparável à devastação produzida por uma guerra.

Essa crise, que se apresenta como muito superior á passada, já começou a quebrar países. A Islândia, um pequeno país utilizado como paraíso fiscal na Europa já veio abaixo. Sua Bolsa caiu 76%, os capitais fugiram rapidamente, seus três principais bancos tiveram que ser nacionalizados. Aparentemente, outros países já estão à beira da quebra, como a Hungria, a Ucrânia, a Indonésia e o Paquistão. Não se exclui a possibilidade que mesmo países da dimensão da Rússia estejam à beira da explosão.

Traduzindo os números do pacote
Muitos trabalhadores honestos em todo mundo torcem para que esses planos dêem certo. Afinal, estão preocupados com seus empregos e torcem para que a crise não venha. É assim que funciona o capitalismo: busca iludir os trabalhadores, confundindo os interesses da grande burguesia com os da sociedade como um todo.

Na verdade, esse pacote gigantesco busca salvar os banqueiros e altos executivos das empresas financeiras, com os Estados assumindo os prejuízos do “crack” financeiro com dinheiro público, depois de décadas de superlucros embolsados pelos grandes burgueses. Para se ter uma pálida idéia do significado dessa suposta ajuda, seis dias depois do socorro à AIG (maior seguradora do mundo, em que o governo do EUA investiu US$85 bilhões), a empresa torrou cerca de um milhão de reais numa festa para sete de seus dez principais executivos em um dos mais luxuosos hotéis da Califórnia.

O pacote tem um significado profundo: não vai evitar a crise, nem mesmo diminuir sua profundidade, mas vai evitar que setores fundamentais da grande burguesia não entrem em falência e sigam vivendo em alto luxo. Para isso vai usar dinheiro público que vai ser tirado dos salários dos trabalhadores, dos orçamentos de saúde e educação etc.

Dinheiro para os bancos poderia resolver problemas sociais
Um trabalhador tem dificuldade para imaginar o significado de US$1 milhão, e mais ainda de US$1 bilhão ou US$1 trilhão. Para se ter uma idéia, pode-se fazer uma rápida comparação. O Projeto do Milênio foi elaborado em 2002 pela ONU com dez objetivos reformistas como reduzir a pobreza e a mortalidade infantil e garantir o acesso à água e esgoto em todo o mundo.

O projeto se choca obviamente com a realidade do capitalismo: para garanti-lo seriam necessários de US$121 bilhões em 2006 a US$189 bilhões em 2015, mas só se conseguem US$28 bilhões ao ano. Juntando os custos de todo o projeto, de seu início até 2015, seriam necessários US$1,2 trilhão. Só o último superpacote dos governos imperialistas torrou mais do que duas vezes esse total em dinheiro entregue aos banqueiros.

Podemos usar outras comparações. A ONU calcula que exista hoje um bilhão de pessoas que vivem abaixo do nível de pobreza no mundo, ganhando menos de um dólar por dia. O dinheiro entregue até agora aos banqueiros (US$4 trilhões) significa um salário mensal de cerca de R$700 a cada um desses pobres durante um ano. Ou, ainda, o equivalente a R$1.300 de cada homem, mulher e criança da população mundial (6,5 bilhões de pessoas). Ou seja, se sua família tem cinco pessoas, saiba que ela acaba de ser roubada em US$3.500, que foram entregues aos banqueiros milionários.

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