No estado do Rio, a mais alta cúpula da segurança pública dos sucessivos governos foi diretamente acusada dos diversos tipos de crimes. De formação de quadrilha a assassinato.

Este é o Estado onde o ex-chefe da Polícia Civil dos governos Garotinho e Rosinha, Álvaro Lins, responde a uma série de processos criminais, tendo inclusive amargado cadeia no presídio de segurança máxima Bangu 8.

Nos últimos dias um terremoto atinge mais uma vez a cúpula. Desta vez na Polícia Militar. A partir do assassinato da Juíza Patricia Aciolly, onde, segundo a imprensa, todos os indícios apontam para as fileiras da Policia Militar, os chefões da PM parecem um castelo de cartas: caem.

O comandante da PM pediu exoneração. Os coronéis que chefiavam as UPP´s (Unidades de Polícia Pacificadora) foram substituídos e novas mudanças são anunciadas enquanto fechávamos esse texto.

Megaeventos
Há no estado do Rio uma ofensiva dos ricos e poderosos de tomarem para si fatias maiores do espaço urbano. Não se pode pensar a realização de eventos como a Copa do mundo, Olimpíadas, ou mesmo a prevista visita do novo Papa, deslocados dessa lógica.

Esta é a mesma lógica que faz recrudescer o gatilho fácil. Somos o estado onde já se teve a gratificação faroeste. Um prêmio dado a policiais por mortes. São os famosos ‘autos de resistência´. Grande parte dos quais escamoteiam a execução pura e simples.

A tentativa de impor uma brutal contenção social, expulsando comunidades inteiras, sob as mais diferentes alegações, é parte desse projeto para redesenhar o espaço urbano. É parte de transformar o que foi a especulação imobiliária anos atrás em lucros reais. Dessa vez, financiados com dinheiro público nas mega obras dos mega eventos.

Há precedentes históricos. A burguesia carioca, junto aos latifundiários, bradava no início do século passado que era necessário expulsar as classes perigosas do centro da cidade. Para essa elite não havia dúvidas, as classes perigosas eram especialmente os trabalhadores, o povo pobre e, em especial, o povo negro.

Uma indústria na ilegalidade
Depois de décadas de abandono e sucateamento do parque industrial da cidade e do Estado, uma parcela dessa burguesia percebeu que é possível obter lucros astronômicos combinando uma perna em atuação legal e outra na ilegalidade.

Projeta-se a exploração de linhas de vans ilegais em um setor da cidade gerando um lucro diário da ordem de R$ 200 mil. Sem falar no controle da distribuição e venda de botijões de gás, gatonet, e taxas de segurança.

Isto não pode ser feito sem um aparato armado que garanta a segurança do negócio. Tal segurança é feita por empresas na legalidade, por meninos do tráfico, mas também por uma parcela da própria polícia, em especial a PM, que ultrapassa a barreira da legalidade.

Essa é a polícia que, sob as ordens de Cabral, prendeu 409 bombeiros. Mas esta é também a polícia sobre a qual não faltam acusações. Vão desde o assassinato da juíza, passam pelo recebimento de propina nas áreas invadidas e ocupadas por UPP´s, passam pelo extermínio de parcela da população – em especial a população pobre e negra (o caso do menino Juan é emblemático), chegando até a formação de milícias, que não passam de quadrilhas organizadas para extorquir o povo pobre.

O tráfico de drogas e de armas é outra faceta de uma indústria atuando na ilegalidade.

Não estão na cidade ou no Estado os complexos industriais produtores de armas e munições na escala em que são utilizados no Rio de Janeiro. Tampouco as plantações e os laboratórios para a preparação da cocaína, do crack, maconha, e agora o terrível OX.

O volume comercializado, a dimensão do capital envolvido, apontam para o necessário financiamento dessa indústria de risco. Não é nas comunidades, nos morros, nos bairros populares que os financiadores deveriam ser procurados. Para isso o que deve ser feito é seguir o caminho desse dinheiro manchado com o sangue de nosso povo pobre. Manchado com o sangue de nossa juventude, especialmente nossa juventude negra.

Porém não será com uma polícia construída e mantida para defender a propriedade privada que isso se dará. Esta polícia transforma-se – e os fatos o demonstram – em beneficiária direta desse mal disfarçado jogo de atuar na legalidade com os pés na ilegalidade.

Polícia para quem precisa. Mas que polícia?
As UPP´s são a menina dos olhos do governador Sergio Cabral. Este é governador dos 13 presos políticos do Consulado dos Estados Unidos. Dos tiros contra professores, da prisão de bombeiros. Este é o homem que declarou que as mulheres das favelas são fábricas de produzir marginais.

Sob seu comando tanques ocuparam as comunidades. Sob sua direção comunidades inteiras vivem sob o controle das UPP´s. Entretanto não há indício de nenhuma investigação buscando identificar os financiadores da indústria da morte.

Por um lado UPP´s, por outro a ocupação direta da chamada Força Nacional. Soldados, em grande parte utilizados na ocupação do Haiti, controlam militarmente regiões como o Complexo do Alemão. A população, em particular as mulheres, são vítimas das mais variadas arbitrariedades e abusos.

Infelizmente, o Deputado Marcelo Freixo (PSOL), um crítico costumeiro da política de UPP´s, frente à resistência que começa a se expressar entre os moradores do Complexo do Alemão contra a ocupação da Força Nacional, passa reivindicar a instalação de UPP´s, para ‘conseguir a paz´.

Precisamos de uma polícia de outro tipo. A realidade demonstra que a existência de uma polícia militarizada transita perigosamente entre a legalidade e a ilegalidade.

É urgente a extinção da Policia Militar. A investigação de todos os seus membros e a construção de uma única policia, desmilitarizada, controlada pelos trabalhadores e a população. Uma polícia com seus chefes eleitos diretamente. Com direito a construção de sindicatos e direito de greve.

Precisamos inverter a ordem. As investigações precisam recair sobre os financiadores, e sobre os que lucram rios de dinheiro com a indústria da morte. Isto não pode ser feito por uma polícia a serviço da propriedade privada, por uma polícia que atua para os ricos e poderosos e que se beneficia da própria ilegalidade.

Esta ordem só começará a ser invertida quando ricos e poderosos começarem a freqüentar as cadeias do outro lado das grades.