Repressãopolicial durante manifestação no Rio
Foto: Erick Dau

O governo de Dilma Rouseff (PT), os grandes grupos empresariais e os aparatos de repressão estão desenvolvendo uma política para acabar com a situação aberta no Brasil a partir das manifestações de junho: criminalizar os movimentos sociais para intimidar, amedrontar e fazer recuar a população jovem e os trabalhadores que ocuparam as ruas e entenderam que somente as mobilizações mudarão o país.

Uma reunião entre o ministro da Justiça, Eduardo Cardozo, e os secretários de segurança de São Paulo e do Rio de Janeiro, em 30 de outubro, lançou as bases para estas investigações que estão ocorrendo em todo o Brasil. Além das polícias civis, estão envolvidas a Polícia Federal e a Agência Brasileira de Informação (Abin). Utilizando-se dos atos isolados de depredações realizados por setores do movimento, buscam justificar uma escalada de criminalização e perseguição sob um discurso de defesa da democracia e do direito a manifestação pacífica.

As manifestações que ocorreram no Brasil a partir de junho tiveram cerca de duas mil pessoas detidas. Somente no Rio de Janeiro, foram em torno de 700. Em São Paulo, foram 374. Muitas destas prisões foram acompanhadas de mandados de busca e apreensão, invasões de domicílios ilegais, prisões preventivas, infiltrações em organizações políticas e movimentos sociais, provas plantadas contra os manifestantes e flagrantes forjados. Ações injustificáveis mesmo do ponto de vista puramente legal. Agora estão sendo seguidas da construção de inquéritos com erros grosseiros, criminalizações infundadas, quebra de sigilos telefônicos e bancários e a imposição de segredo de justiça que dificultam a defesa dos acusados e intimidam os detidos.

Criminalização em todo país
O governador do Rio de Janeiro (RJ), Sérgio Cabral (PMDB), repudiado e rechaçado pelos manifestantes, em várias manifestações, não conteve sua ira e descontou todo o seu ódio contra a população que protestava. A escalada de violência teve um de seus pontos altos em 15 de outubro, quando, depois de uma mobilização de quase 100 mil pessoas em solidariedade à greve dos professores municipais, os manifestantes foram duramente atacados pela Polícia Militar nas escadarias da Câmara Municipal, onde pouco mais de uma centena de ativistas se concentravam. Além do uso indiscriminado das tradicionais bombas de gás, spray de pimenta e cassetetes, foi também identificada a utilização de armas de fogo. Pelo menos uma pessoa foi baleada. Prenderam mais de 200 pessoas, alguns que simplesmente passavam pela rua.

Recentemente, a Justiça do Rio condenou a cinco anos de prisão um morador de rua, preso em 21 de junho, após a manifestação que reuniu 500 mil pessoas na AvenidaPresidente Vargas, pois ele estaria com duas garrafas com produtos químicos. Um deles era, supostamente, etanol, e o outro, água sanitária. Seria cômico se não fosse realmente muito trágico.

Seguindo o colega carioca,o governador de São Paulo (SP), Geraldo Alckmin (PSDB), criou sua própria força de exceção. Em 8 de outubro, a Secretaria da Segurança Pública e o Ministério Público estaduais criaram uma “força-tarefa para combater atos de vandalismos durante manifestações”. Entre seus objetivos está o plano de reunir, em um único inquérito policial, todos os casos que envolvem ativistas do movimento e militantes de esquerda que participaram de manifestações, investigando um vasto material, que vai desde vídeos e fotos dos protestos até redes sociais.

Já são 116 indiciados no estado. Cerca de 80 de 153 jovens ativistas foram chamados a depor no DEIC sobre as manifestações públicas de agosto, na condição de suspeitos por crimes de depredação, agressão, desacato, formação de quadrilha e dano. Eles podem até ser enquadradas na Lei de Organização Criminosa.

O governo da Frente Popular gaúcho, de maneira mais seletiva, ataca diretamente militantes do PSTU, do PSOL e da Federação Anarquista Gaúcha. Enquanto declara que a investigação de ativistas ligados ao Bloco de Luta pelo Transporte Público é dissociada da perseguição política, tenta identificar esta organização como criminosa e enquadrar seus ativistas em crimes como dano, lesão corporal, posse de artefato explosivo, desobediência, furto qualificado, bando armado e formação de quadrilha, simplesmente por terem participado das manifestações.

Em Natal (RN), a tentativa de criminalização passa pelos ativistas do Movimento Passe Livre que ocuparam o pátio da Câmara de Vereadores durante a votação do projeto de passe-livre e, diretamente, contra a vereadora do PSTU, Amanda Gurgel, e o vereador Sandro Pimentel (PSOL). Como não há provas para estabelecer sua participação ativa, tentam construir a denúncia a partir da declaração de membros da guarda legislativa, que disseram que houve não somente apoio político, mas apoio financeiro para alimentação e pagamento do carro de som.

Uma legislação de exceção
Buscando garantir o arcabouço legal para todo este processo de criminalização, o governo Dilma sancionou, em agosto de 2013, a Lei 12.850 sobre Organização Criminosa que está sendo usada para enquadrar os manifestantes e ativistas. O objetivo é enquadrar as organizações do movimento como organizações criminosas, tentando demonstrar que houve reuniões que precederam as manifestações e que nestas foram planejados danos e depredações. A lei vai punir quem “promover, constituir, financiar ou integrar”.

Também aumenta a pena dos organizadores se das manifestações participarem adolescentes; e dos funcionários público, inclusive impedindo-os de exercer cargo publico por anos “subsequentes ao cumprimento da pena”. De maneira impressionante, autoriza a “infiltração, por policiais, em atividade de investigação”, coisa que nem mesmo a ditadura autorizou. Estabelece a “ação controlada”, que poderá levar a flagrantes forjados, e o “acesso a registros de ligações telefônicas e telemáticas, dados cadastrais constantes de bancos de dados públicos ou privados e a informações eleitorais ou comerciais”.

Em mais um capítulo desta empreitada, no dia 27 de novembro, foi aprovada na Comissão Mista de Consolidação da Legislação Federal e Regulamentação de Dispositivos Constitucionais o projeto de lei que tipifica e penaliza os atos de terrorismo. Este define como ato de terrorismo “provocar ou infundir terror ou pânico generalizado mediante ofensa ou tentativa de ofensa à vida, à integridade física ou à saúde ou à privação da liberdade de pessoa”. Definição que, de tão aberta, pode enquadrar qualquer coisa, até mesmo uma passeata em dia de Copa do Mundo, com pena de reclusão de 15 a 30 trinta anos.

O PSTU no centro do ataque
Mais de 50 militantes e filiados do PSTU estão sendo criminalizados. Vinte e seis deles, em Campinas, pela ocupação da Câmara, já foram indiciados; no Rio Grande do Sul, foram dois; em São Paulo, quinze; no Rio de Janeiro, três; em Minas Gerais, um; e dois no Rio Grande do Norte.

Entre eles, há dirigentes públicos do partido e das entidades do movimento, como a vereadora Amanda Gurgel, em Natal; o metalúrgico e membro do diretório municipal do PSTU em Campinas, Jose Dias Freitas; Matheus Gomes, o Gordo, e Gillian, membros do DCE UFRGS, no Rio Grande do Sul; dirigentes do CACH da Unicamp como Ligia Carrasco Silva; Letícia Alcântara, do DCE da USP e da executiva estadual da ANEL, e Clara Saraiva, da Comissão Executiva Nacional da ANEL.

Denunciar e mobilizar contra a criminalização
Mais do que retomar o controle das ruas, essa ação coordenada entre o governo federal e as polícias dos estados aponta para um recrudescimento da repressão aos movimentos sociais, com vistas a fechar o cerco contra eventuais manifestações em 2014, durante a realização da Copa do Mundo. Está na ordem do dia a conscientização do que esta ocorrendo e, a partir daí, a realização de atos e manifestações contra a criminalização dos movimentos sociais.

É preciso exigir o arquivamento de todos os inquéritos policiais que criminalizam ativistas, a revogação de toda a legislação construída para reprimir o movimento, o fim imediato das forças tarefas construídas com este fim, a reversão de todos os indiciamentos e a desmilitarização da Policia Militar.

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