PSTU-SP

Joana Campos*, de São Paulo (SP)

Há quase um mês, a empresa na qual trabalho adotou regime de home office total para todas as equipes em função da quarentena por conta do coronavírus. Desde então, não tenho conseguido dormir com o choque de realidade sobre o futuro que vem caindo sobre minha cabeça com tudo isso. Eu já esperava que a humanidade vivesse catástrofes ambientais, de saúde, econômicas nos próximos tempos, mas viver isso tem sido ainda mais assustador.

Minha sobrecarga de trabalho não é de hoje. Costumo trabalhar de 10 a 12 horas diárias, mais duas horas de deslocamento em transporte público. Trabalho prestando suporte a clientes, na área de recursos humanos de uma multinacional, fazendo uma série de atendimentos por dia, sendo que cada um desses atendimentos exige um trabalho burocrático prévio e posterior, além de precisar ter uma preparação mínima antes, com estudo, leituras e análises de matérias, o que vem sendo deixado para segundo plano cada vez mais, descaracterizando e desqualificando minha atuação.

Com a crise da Covid-19, a empresa em que atuo instituiu o trabalho em casa para toda a equipe e, neste novo formato, meu tempo para o restante da vida, que já era escasso, agora quase não existe e sei que não conseguirei recuperá-lo mais. Minha carga horária de trabalho, que já era excessiva, aumentou em torno de duas horas por dia. Isso por si só é muito ruim, afeta minha saúde física e mental de forma direta, mas ainda tem mais ataques. Desde a primeira semana de trabalho virtual, a empresa vem utilizando táticas sutis de coação e ameaças.

Com a crise gerada pelo coronavírus, muitas empresas vêm promovendo férias coletivas, fazendo demissões, parando operações e deixando um cenário de pavor ainda maior para os trabalhadores. Com isso, os gestores da minha empresa fazem reuniões constantes com o discurso de que não vão demitir, mas que precisamos estar unidos enquanto equipe e nos esforçarmos ainda mais para conseguirmos continuar com nossos empregos. Eles passaram a promover mais ações de marketing nos últimos dias à caça de novos trabalhos, dizendo que é preciso que toda a equipe contribua nestas campanhas, numa postura oportunista sem tamanho.

Meu trabalho e de meus colegas teve um aumento enorme. Sou acionada a todo momento pelos meios de comunicação da empresa e WhatsApp, à noite, finais de semana, sem parada. Estou usando toda a estrutura da minha casa: água, luz, internet. É comum, durante a semana, eu não conseguir fazer uma refeição ou até mesmo ir ao banheiro. Trabalho muito mais e, mesmo com tudo isso, vou começar a receber menos nos próximos tempos, pois boa parte de minha remuneração depende de uma variável que não será mais atingida em função dos impactos do coronavírus nesta economia porca que serve a poucos e explora a muitos.

Tem situações piores: minhas colegas mulheres que são casadas e mães têm se mostrado dia após dia mais exaustas, pois além de terem que fazer tudo acontecer de maneira perfeita no trabalho, ainda precisam lavar, passar, cozinhar e cuidar dos filhos, pois seus maridos também estão trabalhando em casa, mas não cumprem as responsabilidades domésticas, não cuidam dos filhos e colocam seus trabalhos como mais importantes que o trabalho das mulheres. Essa situação também ocorre com as mulheres que atendo. Algumas precisaram até mesmo desmarcar nossa reunião, pois não conseguiriam com toda a família em casa e com tantas tarefas a fazer.

Daqui para a frente, neste sistema, tudo só vai piorar. Vamos trabalhar ainda mais. Teremos de nos sujeitar a todo tipo de pressão de ameaças disfarçadas ou escrachadas, de discursos motivadores de “unidos venceremos”, bem como todas as flexibilizações e ataques a direitos que já nem temos mais. Teremos nossas remunerações cada vez mais reduzidas. Essa é uma parte do cenário de trabalhadores da área de serviços, pejotizados e precarizados.

No sistema em que vivemos não há qualquer esperança de melhora para a classe trabalhadora. O que nos espera é só mais exploração e opressão. Nunca vivemos uma crise de tamanha proporção, é global, é internacional. A Covid-19 está aí para explicitar ainda mais o quanto o capitalismo destrói a humanidade, a natureza, a vida. Por dentro do capitalismo, é certo que não há solução e que teremos outras tragédias ainda mais profundas.

Só há uma saída para nossas vidas, para a vida de todas as trabalhadoras e trabalhadores: construir uma sociedade socialista. O socialismo é a possibilidade que se opõe ao capitalismo de forma efetiva. Para implantá-lo, é preciso que todos os setores oprimidos da classe trabalhadora se unam à classe operária para tomarmos o poder de forma consciente e organizada.

E não somos a maioria? Sim, somos muitos, somos o poder. É urgente a nossa união para exercermos nosso poder político, controlarmos todos os meios de produção, tomarmos as decisões em prol de toda classe e, assim, fazermos a revolução socialista.

*o nome é fictício para preservar a identidade da trabalhadora