Várias organizações que se reivindicam de esquerda resolveram defender o voto no Sim. Partidos como o PT e o PCdoB, que tiveram seus dirigentes presos e mortos pelo Estado burguês, mas que agora estão no governo, defendem o Sim. A maioria dos parlamentares do P-SOL também entrou nessa onda, assim como a direção do MST.

Emir Sader, em recente artigo, diz que a reforma agrária é “uma conquista fundamental para o Brasil” e “requer o desarmamento, e não o armamento dos conflitos”. Ataca o PSTU porque nós dissemos que foi o povo armado na Venezuela que enfrentou o golpe militar que derrubou Chávez. Para ele, “as Forças Armadas venezuelanas garantem os direitos conquistados pelo povo daquele país”. Segundo Sader, “A esquerda é republicana, é pela resolução pacífica e justa dos conflitos – individuais e coletivos –, é pela extensão do Estado de direito”.

Essa é a esquerda parlamentar, que acredita que a reforma agrária virá pelo Estado de direito, pelo Congresso, com o apoio das Forças Armadas e da polícia. A verdade é que não existe reforma agrária no Brasil exatamente por causa do “Estado de direito”. Foram as ocupações de terras, com mais de 8.529 conflitos nos últimos dez anos, que garantiram as poucas conquistas da reforma agrária, e não o governo Lula ou o Congresso. Na Venezuela, foi o povo de armas na mão montando as barricadas em Caracas que fez as Forças Armadas saírem do muro e se levantarem contra o golpe, pois, no primeiro momento, os militares prenderam Chávez, a mando da embaixada dos EUA.

Salvador Allende desarmou, por exigência do alto comando militar, os cordões industriais de operários, nos meses que antecederam o golpe em 1973. Com isso, o exército chileno derrotou a maioria da população e os trabalhadores morreram resistindo praticamente sem armas. A esquerda parlamentar esquece que, em 1964, no Brasil, houve um golpe dado pelos militares e ninguém poderá garantir que novos golpes são inevitáveis.

Não existe o “sim de esquerda”. Existem setores que tentam disfarçar sua aliança com o governo e o Congresso usando argumentos “de esquerda”. Segundo eles, quem está com o Não estaria com a direita. Seria muito interessante então que eles justificassem o apoio majoritário do PSDB e da Rede Globo ao Sim. Aliás, a Globo está se preparando para montar uma empresa de segurança privada em parceria com a Glock (indústria de armas e segurança austríaca), no caso da vitória do Sim.

O simples “sim” ou um “não” em um referendo, por ser uma luta democrática, não delimita o perfil de classe. É o sentido geral da discussão que dá o caráter da resposta política. No recente plebiscito da União Européia na França, o voto Não causou uma profunda derrota ao imperialismo. Na sua defesa, além da esquerda, encontravam-se também setores de direita, em uma unidade de ação.

Temos que enxergar além da superficialidade, do debate sobre venda e compra de armas em loja. O que se discute é se o Estado deve manter o monopólio da armas, mesmo que se apresente como Estado de direito, ou se o povo tem o direito de se armar para defender seus direitos, inclusive o de se rebelar.

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