Leia artigo de Zé Maria, publicado no portal da ConlutasA imprensa nacional divulgou nesta sexta-feira (19) declarações do presidente Lula em que ele afirma que as empresas não têm nenhuma razão para demitir seus empregados. De acordo com o presidente, estas empresas deveriam gastar um pouco do lucro que tiveram para arcar com o salário dos funcionários, já que ganharam muito dinheiro em período recente.

Bem, isto é rigorosamente a mesma coisa que a Conlutas tem afirmado desde que começaram as ameaças de demissão. As empresas e os bancos, e não os trabalhadores, devem pagar pela crise. E isto é perfeitamente possível, justamente porque as empresas e os bancos ganharam muito dinheiro no último período.

Vejamos o caso específico da Vale: a empresa foi comprada do Estado 11 anos atrás, pelos seus donos atuais, por cerca de 3,3 bilhões de reais. Hoje seu patrimônio está cotado nas bolsas em algo em torno a 130 bilhões de reais (40 vezes mais!), lucrou, nestes 11 anos, cerca de 80 bilhões de reais, dos quais perto de 25 bilhões apenas em 2008. O próprio presidente da empresa tratou de “esclarecer o mercado” dias atrás, de que ela estaria em situação tranqüila, com caixa de 15 bilhões de dólares. Analisando o relatório anual que a Vale entrega na Bolsa de Nova Iorque, vemos que 15 bilhões de dólares é dinheiro suficiente para pagar o salário de todos os empregados da companhia por 10 anos! A demissão então, só se explica mesmo pela ganância desenfreada de lucros característica dos capitalistas.

Esta é a mesma razão pela qual não há que se falar de flexibilização ou eliminação de direitos dos trabalhadores. Isto seria outra forma de fazer com que eles pagassem a conta da crise e não as empresas. Quando uma empresa reduz o salário do trabalhador está transferindo para ele o sacrifício que cabe a ela enfrentar. O mesmo acontece quando se flexibiliza ou elimina um direito. E o pior é que a prática das empresas, em momentos como esse é de reduzir salários, eliminar direitos e, depois, demitir mesmo assim os trabalhadores.

Está certo, então, o presidente da República? Ele está Errado. O presidente da República é a maior autoridade do país. Não tem o direito de ficar comentando os problemas como se não tivesse nada com isso. E não estamos frente à ameaças de demissão, simplesmente. Já há demissões aos milhares no setor metalúrgico, siderúrgico, de mineração. Dos 102 Alto-Fornos que existem nas siderúrgicas em Minas Gerais, apenas 25 estão operando. Todos os outros estão parados e os trabalhadores já foram demitidos ou estão em férias coletivas e podem ser demitidos nos próximos dias. O setor de auto-peças está demitindo generalizadamente em todas as regiões do país. Isto para dar apenas dois exemplos. São dezenas de milhares as demissões já consumadas no país. E é assustadora a perspectiva para o início do ano.

E aí, presidente? O papel do senhor é apenas falar que os empresários não têm razão para demitir? Nas suas declarações o senhor afirma que não deixará de “cuidar dos trabalhadores”. Pois bem, proposta concreta: que tal uma Medida Provisória (igual aquela que o senhor assinou recentemente destinando 160 bilhões de reais para ajudar os banqueiros), mas desta vez garantindo Estabilidade no Emprego para todos os trabalhadores?. Ou outra, uma MP que reduza a jornada de trabalho para 36 horas semanais, sem redução salarial e sem redução de direitos? Porque não reestatizar a Vale, sem indenizar seus atuais controladores, devido à ruína que a empresa promete impor à vida de dezenas de milhares de trabalhadores brasileiros e às cidades mineradoras, apesar de tudo que a empresa lucrou nos últimos anos? Porque não fazer o mesmo com a Embraer?

Bem, presidente, nas suas declarações o senhor, com toda razão, acusa o governo dos Estados Unidos a tomar apenas medidas para ajudar os bancos, diante da atual crise. O problema é que o senhor está fazendo mais ou menos a mesma coisa. A diferença talvez seja a de que, alem de ajudar os bancos, o senhor tem ajudado algumas indústrias que estão entre as maiores multinacionais do mundo, como as montadoras de veículos que, aliás, ameaçam demitir em massa seus empregados já no início do ano. E então, como ficamos?

O presidente da República está com a palavra. Mas, precisa passar dela às ações concretas, senão estaremos diante de pura demagogia e enganação.

Zé Maria de Almeida é diretor da Federação Democrática dos Metalúrgicos de Minas Gerais e membro da Coordenação Nacional da Conlutas. Texto da Secretaria Executiva Nacional da Conlutas