Mesa do congresso da UNE
UNE/divulgação

Realizado entre os dias 13 e 17 de julho, em Goiânia, o 52º Congresso da UNE escreveu mais um capítulo na história de decadência e submissão da tradicional entidade estudantil. Uma vez mais, o saldo deixado por esse congresso vai estar marcado pelo governismo, a ausência das lutas e a falta de independência política e financeira.

E enquanto esse filme se repete, nas universidades mais importantes do país, é espantoso como o congresso da UNE já não provoca nenhum entusiasmo na base. Outrora catalisadora dos sonhos e da rebeldia da juventude brasileira, a entidade é hoje um aparato fragilizado em sua relação com os estudantes.

Governismo escancarado
Pela quinta vez seguida, o congresso foi um festival de aplausos ao governo. Dilma e o ministro da educação, Fernando Haddad, seguirão com a UNE em seus bolsos e bem domesticada. Mas nem por isso o congresso deixou de render homenagens ao antecessor do atual governo.

Tido como convidado mais ilustre do congresso, Lula resumiu em uma frase o governismo da UNE nos últimos anos: “sou grato à UNE pela lealdade na adversidade” . De fato, os serviços prestados pela entidade ao governo federal têm sido enormes, contando, por exemplo, com o apoio ao REUNI, ao ProUni e o FIES e globalmente à política educacional em curso nos últimos 9 anos.

Também presente no evento, o ministro Haddad tratou de defender a UNE daqueles que a acusam de ser chapa-branca, como nós do PSTU e, atualmente, milhares de estudantes país afora. “Algumas pessoas imaginam que é possível comprar a consciência do movimento estudantil (sic) com alguns trocados. (…) Estudante não se vende por dinheiro nenhum, muito menos por migalha” .

Que os estudantes não se venderam, isso se continua vendo nas ruas, nas praças, escolas e universidades do Brasil. Já com a UNE, a história é outra. E o ministro sabe disso. E sabe também que não são exatamente “migalhas” o que o governo dispensa à UNE…

Independência financeira é bobagem para a UNE
O congresso foi financiado por nada menos que 5 ministérios do governo e 3 estatais. O governo do estado de Goiás e a prefeitura de Goiânia também entraram com sua cota. Mencione-se, ainda, a Confederação Nacional do Transporte (CNT). Tudo isso é público e a UNE não esconde: governos, ministérios, empresas estatais e até sindicatos patronais financiam o congresso.

Ás vésperas do congresso, a imprensa burguesa, naturalmente, tratou de usar esse fato para tentar desmoralizar o conjunto do movimento estudantil. Acuado, Augusto Chagas, que encerrava seu mandato na presidência da UNE, se defendia com fragilidade: “O patrocinador é o dinheiro público, é o dinheiro da União. Nós achamos que o congresso da UNE tem função pública. Ele serve ao Brasil” .

No sentido empregado por Augusto, “Brasil” é uma abstração em cujo interior cabem trabalhadores e patrões, o ensino público e o ensino privado, o governo e os estudantes. Mas se quisesse mesmo ser franco, Augusto reconheceria que a UNE tem recebido milhões em verbas públicas e privadas há anos, mas não sem conceder acenos e bajulações aos donos desse dinheiro.

Recentemente, o site da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES), sindicato patronal do oligopólio das faculdades privadas, divulgou a realização de uma reunião entre tal associação e o próprio Augusto. Na pauta esteve o pedido de apoio financeiro ao 52º CONUNE. Na matéria, o ex-presidente da UNE declara: “Nós sabemos do papel que o ensino particular tem desempenhado historicamente na estruturação da educação brasileira” , relatando supostas batalhas que os estudantes teriam travado ao lado desses empresários.

É, na melhor das hipóteses, ingênuo crer que o financiamento e a conduta política de uma entidade jamais terão relação direta. Pior ainda seria supor ser mera coincidência a lealdade política ao governo federal e as polpuda verbas concedidas à UNE. Tudo isso é parte de explicar porque o congresso da UNE já não é capaz de refletir as principais lutas do movimento social brasileiro.

Lutas passaram longe
A programação do 52º CONUNE divulgada pela entidade é um retrato da acomodação e de sua ausência nas lutas em curso pelo país. Em um cenário de greves e mobilizações importantes, como a dos professores em diversos estados, dos funcionários das universidades federais e dos bombeiros do Rio, nenhum desses trabalhadores em luta foi convidado a falar ao congresso – somente o governo.

O cenário internacional em que a juventude marca presença na arena política, encabeçando mobilizações nos países arábes, na Europa e no Chile, também não merece – aos olhos da UNE – nenhuma centralidade em seu congresso.

Ocorre que a maior parte dessas lutas, direta ou indiretamente, se choca com governos, como Dilma e Cabral, ou secretários e reitores aliados da entidade. E em um sentido mais profundo, não são mais a rebeldia e a luta aberta que sustentam a UNE. O CONUNE não reflete as lutas, porque as lutas vão em sentido oposto ao que vai a UNE.

Qual a tarefa dos estudantes?
Por tudo isso, esse congresso não tem nada a oferecer ao movimento estudantil combativo. E isso se revelará no segundo semestre no debate de que tarefa os estudantes têm a assumir. Enquanto o governo prepara um ataque para os próximos 10 anos, com o novo Plano Nacional de Educação, a UNE vai apoiar esse projeto e “lutar” para que ele preveja o investimento de 10% do PIB para a educação.

Acontece que se o movimento social sempre exigiu um patamar superior de investimento na educação, o fez porque isso é condição para implementar um programa de universalização do ensino público. O novo PNE, no entanto, traça metas e estratégias que dão continuidade à política de pauperização do ensino público e promoção do ensino privado, inclusive com verbas públicas para esse fim.

Ao apoiar o PNE, portanto, a “luta” da UNE por 10% do PIB para educação, de conteúdo, pede mais verbas públicas para serem entregues ao ensino privado. De qualquer maneira, este semestre vai mostrar se a UNE quer mesmo lutar pelos 10% do PIB, porque até aqui a entidade está fora da Jornada de Lutas de agosto e das articulações do plebiscito nacional – ambas iniciativas de luta por aquela bandeira.

Ao menos que ache que o 52º CONUNE tem alguma coisa a oferecer ao movimento estudantil e que esse congresso fortaleceu a luta dos estudantes, a oposição de esquerda da UNE deveria romper, de uma vez por todas, com essa entidade. De todo jeito, esses companheiros devem agora se unir à ANEL na luta contra o PNE do governo e pelos 10% do PIB para a educação. E é fora da decadente União Nacional dos Estudantes que poderão organizar a luta, em unidade com todos os estudantes que não se prestam ao papel de capachos do governo federal.